Eduardo Bolsonaro e o chanceler Ernesto Araújo.| Foto: Mandel Ngan/AFP
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O alinhamento automático da gestão Bolsonaro com os Estados Unidos levou membros do governo federal a disparar ataques diretos à China, até então um dos principais parceiros comerciais do Brasil. A União também minimizou acordos com países em desenvolvimento, como a Índia. Durante essa semana, porém, membros do próprio governo admitem que a “fatura chegou” e justamente em relação às vacinas contra a Covid-19.

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A dificuldade na importação de vacinas da Universidade de Oxford com a farmacêutica Astrazeneca e dos insumos para a produção da Coronavac é apontada como o ápice dos imbróglios provocados pela diplomacia brasileira nesta primeira metade do mandato do governo Jair Bolsonaro.

Apesar disso, tanto os governos chineses quanto indianos já sinalizaram que vão ajudar o Brasil a obter mais doses de vacinas contra a Covid-19. O embaixador chinês, Yang Wanming, disse nesta quarta-feira (20) que o país asiático irá intensificar esforços para que os problemas burocráticos relacionados à não entrega de insumos sejam equacionados. A expectativa agora é que nas próximas duas semanas chegue ao país pelo menos 11 mil litros de IFA (ingrediente farmacêutico ativo) da CoronaVac.

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Já o governo indiano também sinalizou que pode liberar, até a próxima semana, um lote com dois milhões de doses da vacina de Oxford.

A mudança de postura é atribuída, nos bastidores, a reabertura do canal de negociação com a China e Índia por meio da ala militar do governo, do setor empresarial, do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ) e da chamada ala pragmática do governo, por meio da ministra da Agricultura, Tereza Cristina. Além disso, o Planalto teve o cuidado de envolver o mínimo possível o Ministério das Relações Exteriores (MRE) nestas tratativas, principalmente em relação à China.

A ala militar do governo e deputados do Centrão são uníssonos em destacar que o ministro Ernesto Araújo se tornou um problema, não uma solução. Ainda mais agora em que haverá uma natural readequação das relações geopolíticas entre os Estados Unidos e a China na administração Joe Biden. Por conta disso, membros da ala militar vem defendendo a demissão de Araújo.

Na visão dos militares, a demissão de Araújo poderia ser vista pelos chineses como um sinal positivo para a retomada de uma relação pacífica entre os dois países. Em uma situação análoga ao que ocorreu com Abraham Weintraub, cuja demissão foi vista por ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) como uma sinalização positiva do governo para atenuar os conflitos com a Suprema Corte.

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O problema, porém, é que o chanceler brasileiro é bem-avaliado pela ala ideológica do governo e, principalmente, pelo filho do presidente Jair Bolsonaro, o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP). Por esse motivo, Bolsonaro ainda resiste em exonerar o chanceler brasileiro.

Apesar das tratativas por terceiros, o governo federal alegou que é o único interlocutor no caso. "Ressalta-se que o Governo Federal é o único interlocutor oficial com o governo chinês", afirma, em nota distribuída nesta quarta-feira (20).

A União ainda diz que "vem tratando com seriedade todas as questões referentes ao fornecimento de insumos farmacêuticos para produção de vacinas (IFA)", e que o Itamaraty, por meio da embaixada em Pequim, vem mantendo negociações com o governo chinês. Nesta quarta, foi realizada uma conferência telefônica com o embaixador Yang Wanming, com a participação dos ministros Eduardo Pazuello (Saúde), Tereza Cristina (Agricultura) e Fábio Faria (Comunicação).

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Conflitos com a China e Índia comprometeram fornecimento de vacinas

As provocações tanto de Araújo quanto de Eduardo Bolsonaro foram fundamentais para que o Brasil passasse a ter dificuldades na importação de insumos da China e vacinas da Índia, segundo fontes do Palácio do Planalto.

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Ao longo de dois anos, Eduardo Bolsonaro ratificou as teses do ex-presidente dos Estados Unidos Donald Trump e insinuou que o coronavírus foi uma invenção chinesa para desbancar o país norte-americano na economia mundial; acusou o Partido Comunista Chinês de espionagem e endossou o ex-ministro Weintraub ao alegar que os chineses comem “tudo o que o sol ilumina”.

“Há um ressentimento grande por parte dos chineses por conta desse tipo de comportamento. Em alguma hora os chineses dariam a resposta”, destacou uma fonte ligada à baixada chinesa. Além disso, por medida de segurança, a embaixada da China viu-se obrigada a instalar grades de ferro para evitar conflitos com apoiadores do presidente. Essa foi a primeira vez que o órgão adotou medida neste sentido.

No caso da Índia, o ressentimento advém do posicionamento brasileiro na Organização Mundial do Comércio (OMC) relacionado à quebra de patentes para vacinas contra a Covid-19. Em outubro, Índia e África do Sul defenderam na OMC uma proposta para que fosse permitido aos países em desenvolvimento suspender patentes, de forma temporária, de produtos vinculados ao combate à pandemia do novo coronavírus.  O Brasil ficou do lado dos Estados Unidos e Europa contra a quebra da patente.

Como resposta, a Índia colocou o Brasil no final da fila para a entrega de 2 milhões de imunizantes. Mas, ao longo dessa quarta-feira, a Índia reviu sua posição e a expectativa é que o primeiro carregamento de vacinas de Oxford seja liberado nos próximos dias.

Mudança na política internacional

Estes dois episódios mostram que o pragmatismo nas relações internacionais tende a ser uma praxe do governo federal a partir de agora, principalmente após a posse de Biden. Um dos principais aliados de Bolsonaro, o deputado federal Marco Feliciano (Republicanos-SP) defendeu publicamente essa postura.

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Para ele, “jogo novo requer estratégia nova”. “Nós, conservadores, temos a característica de sermos essencialmente realistas. E, queiramos ou não, com a posse de Biden hoje à frente da maior potência mundial, o jogo todo muda. Jogo novo requer estratégia nova. A antiga não serve mais!”, defendeu Feliciano.

Para ele, “quanto mais tempo demoramos para mudar nosso posicionamento no plano internacional, pior será”. “A hora é de total pragmatismo nas relações internacionais. Já dizia o imperador Vespasiano que dinheiro não tem cheiro. E a China tem interesses geopolíticos de primeira ordem no Brasil. Somos a 8ª economia do mundo e a garantia da segurança alimentar chinesa. Está na hora de, com tranquilidade e soberania, realinharmos tudo isso com os chineses”, analisou o parlamentar.

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