Um dos grandes desafios do próximo presidente da Câmara dos Deputados é dar um destino para os pedidos de impeachment do presidente Jair Bolsonaro que hoje estão na mesa de Rodrigo Maia (DEM-RJ). O presidente da Câmara é quem tem a atribuição de abrir ou engavetar qualquer pedido de impeachment.
Líderes de partidos no Congresso e membros do Palácio do Planalto, contudo, apostam que dificilmente o próximo presidente da Câmara dará seguimento a qualquer pedido de cassação de Bolsonaro.
Apesar disso, no Congresso há a expectativa de uma data-limite para saber se algum processo de impeachment poderá sair do papel: o mês de abril. A avaliação é de que, até lá, o país deve ter uma dimensão mais concreta dos impactos do fim do auxílio emergencial e das ações confusas do governo federal por causa da vacinação contra o coronavírus.
Bolsonaro foi alvo de 51 pedidos de impeachment em 2020
Bolsonaro foi alvo de 51 pedidos de impeachment em 2020 – um recorde em um único ano. A maioria dos pedidos de afastamento do presidente da República foi motivada pela forma como ele conduziu as políticas sanitárias durante a pandemia do coronavírus. Em 2021, o PT já protocolou outro pedido de cassação de Bolsonaro.
Todos os pedidos de impeachment têm como base a Lei 1.079 de 1950, que regulamenta os chamados “crimes de responsabilidade”. Pela lei, são considerados crimes de responsabilidade atos do presidente da República que atentem contra a Constituição Federal, contra o livre exercício dos poderes, contra a probidade administrativa ou contra a segurança interna do país.
Somente a título de comparação, Dilma Rousseff (PT) foi alvo de 37 pedidos de impeachment em um mesmo ano. Mais precisamente, em 2015 (um dos quais, da advogada e hoje deputada estadual Janaína Paschoal que resultou na deposição da petista). O hoje senador Fernando Collor, que assim como Dilma sofreu impeachment, teve 24 pedidos de afastamento ao longo de 1992. Já o ex-presidente Michel Temer (MDB), foi alvo de 23 denúncias em 2017.
Incluindo-se também o primeiro ano de mandato, Bolsonaro já foi alvo de 57 processos de impeachment. Quatro deles, porém, já foram rejeitados e 53 ainda estão sob análise.
Durante seus 67 meses de mandato, Dilma foi denunciada por crime de responsabilidade 68 vezes. Lula, ao longo de seu mandato, foi alvo de 37 denúncias por crime de responsabilidade. Temer, foi denunciado 33 vezes; Fernando Henrique Cardoso (FHC), outras 27 vezes; e Collor, 24 vezes.
Possibilidade de seguimento de impeachment de Bolsonaro é mínima
Mesmo diante de tantos pedidos de cassação de Bolsonaro, porém, a avaliação de líderes do Congresso é que dificilmente o presidente será alvo de um processo de perda do mandato. E isso por vários motivos: primeiramente pela própria popularidade do presidente, depois pelo fato de ele ter conseguido se aliado ao Centrão e, por fim, pela manutenção da estabilidade institucional.
Nas negociações entre partidos de esquerda e o líder do MDB, Baleia Rossi (SP), para apoiar a sua candidatura à presidência da Casa, deputados de partidos como o PCdoB, PT, PSB pressionaram o emedebista a prometer dar seguimento a pelo menos um dos processos de impeachment que estão na mesa de Maia. Mas o máximo que conseguiram foi o compromisso de Baleia Rossi em analisar as denúncias, decidindo pelo seu arquivamento ou não.
Líderes partidários ouvidos pela Gazeta do Povo dizem que Bolsonaro nunca chegou a índices de popularidade inferiores a 25% e que isso dificulta qualquer seguimento de um processo de impeachment. Em dezembro, pesquisa Datafolha apontou que o presidente da República era avaliado como ótimo ou bom por pelo menos 37% da população brasileira. Nesta semana, o Instituto DataPoder divulgou uma pesquisa em que a aprovação ao governo Bolsonaro está em 44%, contra 52% que o desaprovam.
Em fevereiro de 2016, antes de ser afastada, Dilma tinha avaliação positiva de apenas 11,4%, conforme os dados do Datafolha. “Nenhum deputado em sã consciência vai defender um afastamento de presidente que tem apoio de um terço da população”, diz um líder do Congresso em caráter reservado.
O fato de Bolsonaro ter conseguido controlar o Centrão também é visto, principalmente pelo Palácio do Planalto, como fator que inviabiliza qualquer movimento de impeachment. Com o apoio de Arthur Lira (PP-AL), candidato à presidência da Câmara, Bolsonaro hoje conta com uma base parlamentar de pelo menos 200 deputados de partidos como o PSL, PTB, PL, PP e Republicanos: o suficiente para refutar pedidos de impeachment no plenário da Câmara.
Deputados, inclusive da oposição e membros do Palácio do Planalto, acreditam que nem mesmo uma eventual vitória de Baleia Rossi (MDB-SP) na disputa com Arthur Lira na disputa pela presidência da Câmara poderia favorecer a abertura de um processo de impeachment de Bolsonaro.
A visão dentro do Planalto é que Rossi tem uma postura de independência, não necessariamente de oposição, como ocorreu, por exemplo, com o ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha em relação à ex-presidente Dilma Rousseff. Foi Cunha quem abriu o processo de cassação da petista. Na época, o movimento de impeachment de Dilma também foi visto por deputados como uma espécie de vingança de Cunha pelo fato de Dilma não ter apoiado a sua candidatura a presidente da Casa no início de 2015.
Por fim, uma corrente de deputados partilha da tese de que um novo processo de impeachment poderia levar o país para uma nova crise institucional, difícil de ser superada.
O próprio presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), tem utilizado essa tese para se defender das acusações de que foi omisso quanto aos pedidos de impeachment de Bolsonaro. “Estamos com uma pandemia que voltou a crescer e essa deve ser nossa prioridade”, disse Maia em dezembro ao jornal Valor Econômico sobre os pedidos de impedimento contra o presidente da República.
Além disso, neste momento, apenas os partidos de oposição de fato fazem coro em favor do impeachment de Bolsonaro. Mas nem dentro do PT a ideia é consensual. Uma ala do partido, por exemplo, acredita que um processo de impedimento de Bolsonaro apoiado pelo PT pode ser interpretado como um movimento de vingança do partido por causa do que ocorreu com a ex-presidente Dilma Rousseff.
Além da oposição, Bolsonaro foi denunciado por ex-aliados
Além da oposição, Bolsonaro foi alvo de pedidos de impeachment, inclusive, de ex-aliados como a deputada federal Joice Hasselmann (PSL-SP) e Alexandre Frota (PSDB-SP).
Joice denunciou Bolsonaro por uma eventual tentativa de intervenção política na Polícia Federal, conforme denunciou o ex-ministro Sergio Moro. Segundo a parlamentar, houve “notória tentativa de intervenção de Bolsonaro na Polícia Federal, valendo-se das prerrogativas de Chefe de Estado, com o fim de obter informações sensíveis e privilegiadas de uma instituição cuja independência deve ser pilar do Estado Democrático de Direito, havendo, inclusive, a tentativa de interferir em investigações correntes”. Além de um processo de impeachment, o caso também é alvo de inquérito no Supremo Tribunal Federal (STF).
Já Alexandre Frota denunciou o presidente pelo fato de ele ter supostamente cometido seis crimes distintos, entre os quais atentar contra os poderes da União e contra a administração pública. “Não é possível mais que este homem fique comandando a nação brasileira”, disse Frota ao apresentar a denúncia.
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