Líderes partidários do Congresso dizem reservadamente que ainda é temerário falar em impeachment do presidente Jair Bolsonaro – apesar do crescimento dos movimentos que pedem a sua cassação por causa dos erros do Planalto na crise sanitária do coronavírus e da queda da popularidade do governo. Porém, ao contrário do cenário do fim de 2020, até mesmo aliados de Bolsonaro admitem que começa a ser construído um cenário favorável para que a Câmara dê andamento a pelo menos um dos pedidos de crime de responsabilidade contra Bolsonaro. E, para eles, tudo vai depender da economia.
Congressistas inclusive fixam um prazo para saber se um eventual processo de impeachment teria possibilidade real de avançar: 90 dias – ou seja, na segunda quinzena de abril. À Gazeta do Povo, essas lideranças disseram que qualquer movimento em favor de um afastamento presidencial dependerá basicamente de como a economia brasileira vai reagir até lá.
Há um receio claro, inclusive entre os aliados de Bolsonaro, de que o pacote de benefícios concedido no ano passado em virtude da pandemia do coronavírus possa afetar as contas públicas e, consequentemente, ter reflexos na popularidade do presidente.
Entretanto, os parlamentares ouvidos por Gazeta do Povo admitem que, mesmo no pior cenário para Bolsonaro, um processo de impeachment teria seguimento apenas no segundo trimestre deste ano (entre abril e junho).
A relação entre economia e popularidade na equação do impeachment
A economia é vista como o fator-chave para desencadear um processo de impeachment porque ela tem potencial de derrubar a popularidade de Bolsonaro a níveis que façam com que a pressão popular pelo afastamento do presidente cresça.
Tanto congressistas de direita quanto os de esquerda dizem que nenhum processo de impeachment terá seguimento enquanto os níveis de popularidade do presidente estiverem na casa dos 30%. Pesquisa divulgada na segunda-feira (19) pela XP/Ipespe apontou que a avaliação de Bolsonaro caiu, de 38% de ótimo e bom para 32%. Do outro lado, a avaliação ruim e péssima subiu de 35% para 40%.
Os índices de rejeição ainda são bem distantes dos verificados na época de Dilma Rousseff (PT), quando ela foi afastada da presidência da República. Em 2016, a aprovação de Dilma chegou a ser de apenas 10%.
A esperança entre os líderes da esquerda e o temor entre os aliados é que a popularidade de Bolsonaro caia nos próximos três meses se a economia não reagir. Um importante aliado do presidente admite que a perda de arrecadação provocada pela desoneração na folha de pagamento, aliada ao fato do governo não ter conseguido achar alternativas de arrecadação (como o imposto digital, a nova CPMF) pode obrigar o governo a adotar medidas heterodoxas como o corte de benefícios sociais, o que afetaria diretamente a popularidade.
Um importante líder do Congresso aliado do presidente resume, em caráter reservado, a situação: “Nas minhas redes sociais, já senti que o humor do eleitor mudou. A cobrança tem sido maior agora. Se a economia reagir, não haverá impeachment. Caso contrário, ainda mais se tivermos alta na inflação, é possível que tenhamos um cenário favorável [ao afastamento]”.
Além disso, parlamentares de direita e líderes aliados do presidente da República apontam que começam a ser cobrados por decisões tidas como equivocadas pelo eleitor mais conservador, como as nomeações de Augusto Aras para a Procuradoria-Geral da República (PGR) e de Nunes Marques para o Supremo Tribunal Federal (STF).
O fator Baleia Rossi no impeachment de Bolsonaro
Outro fator apontado como potencialmente decisivo em um eventual processo de impeachment de Bolsonaro é uma eventual eleição do líder do MDB, Baleia Rossi (SP), na disputa pelo comando da Câmara dos Deputados.
Baleia Rossi tem sido criticado pela esquerda por não ter se comprometido a dar seguimento a qualquer denúncia por crime de responsabilidade. Porém, ele tem dito aos parlamentares que dará respostas a todas as representações determinando o arquivamento ou não delas, ao contrário do que fez Rodrigo Maia (DEM-RJ).
Além disso, uma eventual vitória de Rossi é vista por parlamentares como uma derrota do Centrão e da base de apoio parlamentar do presidente. Isso poderia sinalizar que Bolsonaro não conta apoio suficiente no Congresso para se manter no poder – o que poderia iniciar um processo de debandada de parlamentares que hoje são aliados do Planalto.
Já o candidato do governo à presidência da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), sinalizou que irá rejeitar todas as denúncias contra Bolsonaro.
No momento, Bolsonaro é alvo de 61 pedidos de impeachment por diversos motivos. Os mais recentes alegam que o presidente da República cometeu crime de responsabilidade pela forma como ele tem conduzido a pandemia do coronavírus.
Nas denúncias mais recentes, o presidente da República é acusado de ter negligenciado alertas sobre o caos na saúde em Amazonas e de ter dado preferência a tratamentos sem unanimidade científica em detrimento de um programa nacional de vacinação.
Movimento em favor da cassação cresce na internet
Por causa especialmente da situação no Amazonas, tem crescido na internet movimentos em favor do impeachment do presidente da República, capitaneados principalmente por partidos de esquerda.
Nesta semana, o advogado Antônio Carlos de Almeida Castro, o Kakay, apresentou uma carta ao presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), sugerindo o andamento dos pedidos de impeachment do presidente da República. “Entramos numa fase de terror, de desgoverno, num precipício dantesco”, disse o advogado. “O Congresso tem que funcionar imediatamente. A todo vapor. E você deve apresentar o pedido de impeachment. As trágicas circunstâncias impõem”, complementou.
Nas redes sociais, houve um crescimento pelo interesse do termo “impeachment de Bolsonaro” e o próprio Rodrigo Maia já sondou senadores para ter um termômetro sobre a viabilidade de um afastamento do presidente.
Além disso, Bolsonaro perdeu popularidade nas redes sociais após a aprovação do uso emergencial da coronavac e da vacina de Oxford, conforme dados da consultoria Quaest. A métrica avalia o desempenho de políticos brasileiros nas plataformas Facebook, Instagram, Twitter, YouTube, Wikipedia e Google. A coronavac – única vacina disponível no Brasil até agora – foi uma aposta do governador de São Paulo, João Doria (PSDB); e Bolsonaro por várias vezes a desacreditou.
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