O decreto presidencial que estabelece as regras para o Indulto de Natal a presos neste primeiro ano do governo Lula 3 traz a marca das políticas esquerdistas da gestão do Partido dos Trabalhadores. O indulto foi sancionado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) nesta sexta-feira (22), porém, veta o benefício aos condenados pelos atos de vandalismo às sedes dos Três Poderes, em Brasília, no 8 de janeiro.
Uma das regras estipuladas pelo Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária (CNPCP), órgão consultivo ligado ao Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP) e responsável por elaborar o indulto, foi de que presos por crimes contra o Estado Democrático de Direito não podem receber o benefício.
O indulto também veta que seja concedido o perdão para quem cumpre pena por crimes ambientais, contra a administração pública, o sistema financeiro nacional, de licitação, de violência contra a mulher, de preconceito de raça, de redução de pessoas a condições análogas à escravidão, de tortura, terrorismo, genocídio e aqueles que constam no Estatuto da Criança e o Adolescente.
O texto também proíbe que sejam beneficiadas pessoas condenadas pelo crime de tráfico de drogas, ou que sejam "integrantes de facções criminosas que nelas desempenhem ou tenham desempenhado função de liderança ou participado de forma relevante em organização criminal".
Falta de consenso
O CNPCP é composto por 13 integrantes titulares, dos quais cinco foram nomeados no governo do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). Durante as deliberações, a proibição de indultos para crimes contra o Estado Democrático foi alvo de discordâncias entre integrantes. Além disso, aqueles nomeados na gestão passada eram a favor da inclusão do indulto para policiais no texto, o que acabou não ocorrendo.
Ao longo do ano, o Conselho realizou audiências públicas nas quais ouviu defensores públicos, juristas, religiosos dedicados ao sistema prisional e membros do Ministério Público para elaborar o texto. Neste ano, houve até consulta ao Supremo Tribunal Federal (STF), a fim de garantir que o colegiado não suspenda o decreto, como fez com o indulto assinado por Bolsonaro em 2022.
Em janeiro de 2023, a ministra Rosa Weber suspendeu parte do indulto que beneficiava agentes de segurança condenados por crimes cometidos há 30 anos e que não eram considerados hediondos na data de sua prática. Nessa categoria se enquadravam os policiais envolvidos no massacre do Carandiru, em 1992. A Procuradoria-Geral da República (PGR) foi o órgão responsável pelo envio do pedido de revisão do decreto ao STF.
Até o ano passado, os indultos promulgados pelo ex-presidente contemplavam o perdão de pena a agentes de segurança condenados por crimes culposos, aqueles cometidos sem intenção. Eram contemplados policiais federais, civis, militares, bombeiros e militares que, durante o exercício da função ou em decorrência dela, tivessem cometido esse tipo de infração.
Ampliação do indulto
Apesar das restrições às concessões do perdão da pena, o rol de questões humanitárias que permitem que os detentos recebam o indulto foi ampliado. Além dos presos com doenças graves e idosos, indígenas e aqueles que cuidam de pessoas com deficiência também estarão aptos a receber o indulto.
O decreto ainda concede perdão de pena coletivo para detentos condenados a até oito anos de prisão e que tenham cumprido um terço da pena, se forem reincidentes, e um quarto se não houver reincidência. Já para os condenados a penas entre oito e doze anos, o indulto só pode ser concedido para presos não reincidentes que tiverem cumprido um terço da pena, ou metade dela, caso sejam reincidentes e desde que o crime não tenha sido praticado com violência.
Ainda para condenados a penas entre oito e doze anos, caso o crime não tenha sido cometido com grave ameaça, o tempo de cumprimento de pena para conseguir o indulto diminui para um quarto, quando não reincidentes, ou um terço, se reincidentes. Presos acima dos 60 anos terão condições mais brandas para conseguir o perdão da pena.
O texto beneficia também "mulheres condenadas a pena privativa de liberdade superior a oito anos, por crime praticado sem violência ou grave ameaça a pessoa, que tenham filho ou filha menor de dezoito anos ou, de qualquer idade, com doença crônica grave ou deficiência e que, até 25 de dezembro de 2023, tenham cumprido um quarto da pena, se não reincidentes, ou um terço da pena, se reincidentes"; e também "mulheres condenadas a pena privativa de liberdade não superior a oito anos, por crime praticado sem violência ou grave ameaça a pessoa, que tenham filho ou filha menor de dezoito anos ou, de qualquer idade, com doença crônica grave ou com deficiência e que tenham cumprido, até 25 de dezembro de 2023, um quinto da pena, se não reincidentes, ou um quarto da pena, se reincidentes".
Diferenças entre indulto de Natal e "saidão" de fim de ano
O indulto de Natal é o perdão ou até a extinção da pena que é concedido para alguns detentos que atendam aos requisitos estabelecidos por um decreto do presidente da República. A determinação é orientada pelas diretrizes definidas pelo CNPCP, que precisam ser avaliadas pelo Ministério da Justiça e Segurança Pública e pela Casa Civil.
Não há data específica para a promulgação do decreto, mas tradicionalmente, ele é publicado no Diário Oficial da União na véspera de Natal, no dia 24 de dezembro, ou perto dessa data, como ocorreu neste ano. A promulgação do indulto não é obrigatória. Em 2018, por exemplo, o então presidente Michel Temer não o publicou.
Para a aplicação do ato, os juízes responsáveis pela execução das penas precisam analisar se os detentos cumprem com os requisitos do decreto. Essa decisão pode levar até alguns meses após a promulgação do indulto.
Em geral, o indulto costuma beneficiar as pessoas detidas por crimes considerados menores ou que tenham bom comportamento, que tenham algum tipo de deficiência e mulheres que tenham filhos.
Por vezes, há confusão com a saída temporária ou o "saidão", que é a suspensão temporária das restrições de liberdade concedida a presos que já cumprem o regime semiaberto, para que possam passar datas comemorativas com as famílias. Não raro, há casos de detentos que não retornam à prisão depois do "saidão". Se forem recapturados, eles voltam a cumprir as penas em regime fechado. A saída temporária não necessita de decreto presidencial.
Senado pode votar por fim da saída temporária
Em agosto de 2022, a Câmara dos Deputados aprovou um projeto de lei que proíbe as saídas temporárias de presos. Desde então, o PL 2.253/2022 está para aprovação pelo Senado. Em novembro deste ano, ele foi pautado para discussão e votação na Comissão de Segurança Pública, mas a reunião foi cancelada. O atual relator da proposta é o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ).
Deputados cobraram posição dos senadores para a aprovação do projeto. O deputado federal Sargento Gonçalves (PL-RN) afirmou que é preciso endurecer a legislação contra o crime. "Essa questão dos "saidões" só incentiva o cometimento de crimes. Temos que acabar de uma vez por todas com esse absurdo", afirmou.
A deputada Silvia Waiãpi (PL-AP) destacou que os "saidões" acabam gerando insegurança para a população, já que alguns detentos beneficiados voltam a cometer crimes no período fora da prisão. "Temos que por fim a esse benefício que leva pânico e terror para dentro da sociedade. Mais uma vez, nós, cidadãos de bem, ficaremos à mercê da criminalidade, da bandidagem. Estamos invertendo os valores. É um desserviço para os brasileiros".
Em 2020, foi sancionada uma lei que proíbe o benefício para detentos que cometeram crimes hediondos. No entanto, a medida não é retroativa, o que permite que autores de crimes que chocaram o país obtenham a saída temporária.
Dentre os contemplados com a saída provisória, por exemplo, estavam Alexandre Nardoni, condenado a mais de 30 anos pela morte da filha, Isabella Nardoni; Gil Rugai, condenado a 33 anos pelo assassinato do próprio pai e de sua madrasta, e Cristian Cravinhos, que participou do assassinato dos pais de Suzane Von Richthofen.
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