A divulgação do vídeo da reunião ministerial do dia 22 de abril encerra mais um capítulo da investigação no Supremo Tribunal Federal (STF) sobre a denúncia do ex-ministro Sergio Moro de que o presidente Jair Bolsonaro teria tentado interferir na Polícia Federal. Mas o caso ainda está longe se ser encerrado e o presidente ainda pode ser chamado para depor no inquérito. Ao todo, dez pessoas já prestaram depoimento à PF.
O vídeo, divulgado nesta sexta-feira (22) pelo relator do inquérito no STF, ministro Celso de Mello, revelou palavrões, briga de ministros, anúncio de distribuição de cargos para o Centrão e ameaça do presidente de demissão "generalizada" a quem não adotasse a defesa das pautas do governo.
"As fitas estão aí, cada um interprete como [bem] entender", disse Bolsonaro em entrevista à rádio Jovem Pan, após a divulgação da gravação. O presidente indagou: "qual o ponto na fita que interfiro na PF? Moro deve estar revoltado, porque não tem nada, não tem nada", frisou.
A defesa do ex-juiz da Lava Jato disse que a divulgação da reunião ministerial do dia 22 de abril "possibilita às autoridades e à sociedade civil constatar a veracidade das afirmações do ex-ministro em seu pronunciamento de saída do governo e em seu depoimento à Polícia Federal, em 2 de maio".
"A verdade foi dita, exposta em vídeo, mensagens, depoimentos e comprovada com fatos posteriores, como a demissão do Diretor Geral da PF e a troca na superintendência do RJ", escreveu Moro nas redes sociais.
O vídeo foi periciado pela Polícia Federal, assistido na íntegra pelo relator no STF e passa a integrar o inquérito como elemento de prova.
Presidente pode ser chamado para depor?
O presidente Jair Bolsonaro pode ser chamado a depor se a Procuradoria-Geral da República (PGR) e o ministro Celso de Mello entenderem que isso é necessário. Segundo o advogado João Rafael Oliveira, professor de Direito Processual Penal, Bolsonaro tem a prerrogativa de indicar a melhor data para ser ouvido na investigação. Ele também pode se negar a prestar depoimento ou permanecer em silêncio, segundo o especialista.
Segundo o advogado Willer Tomaz, sócio do Willer Tomaz Advogados Associados, especialista em Direito Penal, há ainda a opção de responder a perguntas da PF por escrito. “Ele possui a prerrogativa de responder por escrito, segundo entendimento do Supremo Tribunal Federal [Inq 4483], sendo-lhe assegurado o direito ao silêncio, garantia fundamental de todo e qualquer acusado”, diz.
Nesta quinta-feira (21), o ministro Celso de Mello encaminhou ainda à PGR pedidos de partidos políticos e parlamentares para que o celular do presidente Bolsonaro e de seu filho Carlos Bolsonaro sejam apreendidos e periciados. O procedimento é de praxe, pois quando o STF recebe um pedido dessa natureza, tem de encaminhar à PGR, que é responsável por investigações referentes a presidentes da República, a fim de que a procuradoria se manifeste. Nenhuma decisão nesse sentido foi tomada ainda.
Novos elementos viraram objeto do inquérito
Recentemente, novos elementos viraram objeto do inquérito no STF. Em entrevista à Folha de S. Paulo, o empresário Paulo Marinho disse que o senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ), filho do presdiente, foi avisado com antecedência sobre a operação da Polícia Federal que implicaria seu então assessor Fabrício Queiroz. Segundo Marinho, a PF também decidiu deflagrar a operação envolvendo Queiroz após o segundo turno das eleições de 2018 para não prejudicar a campanha de Jair Bolsonaro.
Depois da entrevista, a PGR pediu que o empresário fosse ouvido no inquérito que investiga as denúncias do ex-ministro Sergio Moro. Ele prestou depoimento na quarta-feira (20) à Polícia Federal no Rio de Janeiro. A oitiva durou cerca de cinco horas. Um novo depoimento à PF está marcado para a semana que vem.
Quais são os próximos passos do inquérito
O inquérito no STF investiga oito possíveis crimes: falsidade ideológica, coação no curso do processo, advocacia administrativa, prevaricação, obstrução de justiça, corrupção passiva privilegiada, denunciação caluniosa e crime contra a honra. Os crimes podem ter sido cometidos por Bolsonaro ou por Moro, caso a denúncia do ex-ministro não fique comprovada.
Antes de decidir sobre a necessidade de colher o depoimento do presidente durante as investigações, a PGR enviou ofício solicitando que a delegada Christiane Correa Machado, que preside o inquérito na PF, também ouça Miguel Ângelo Braga Grillo, o coronel Braga, chefe de gabinete de Flávio. Braga teria sido enviado pelo então senador eleito para uma conversa com o delegado da PF em 2018, que revelou que a Operação Furna da Onça seria deflagrada.
Depois de concluir a investigação, a PF decide se indicia ou não o presidente e outros investigados no inquérito. Cabe à PGR então decidir se oferece ou não a denúncia, ou seja, um pedido de abertura de ação penal. Se o procurador-geral da República, Augusto Aras, denunciar o presidente, há um ritual a ser cumprido que envolve a autorização da Câmara dos Deputados e o afastamento de Bolsonaro.
Veja como funciona:
- Se a PGR oferecer denúncia contra o presidente, o STF envia a denúncia para a Câmara.
- O presidente da Câmara envia uma notificação ao Palácio do Planalto e envia a denúncia para a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ).
- Na CCJ, o presidente tem dez sessões do Plenário para apresentar uma defesa prévia.
- A CCJ tem o prazo de cinco dias para votar um relatório.
- O parecer é encaminhado ao Plenário e o presidente da Câmara tem que marcar a votação para a próxima sessão.
- São necessários os votos de dois terços dos deputados (342) para autorizar a abertura de uma ação penal contra o presidente.
- Se os deputados não autorizarem, a denúncia fica em stand by até o fim do mandato do presidente.
- Se a Câmara autorizar a ação penal, o STF vota em plenário se aceita ou não a denúncia da PGR;
- Se o STF aceitar a denúncia, Bolsonaro é afastado do cargo até o processo ser concluído, pelo prazo máximo de 6 meses. O vice-presidente, Hamilton Mourão (PRTB) assume a presidência do país.
- Se Bolsonaro for absolvido, volta a ocupar o cargo de presidente. Se for condenado, perde o cargo definitivamente e perde os direitos políticos.
Caso não sejam encontradas provas suficientes para indiciar ou denunciar Bolsonaro, Moro pode entrar na mira da PGR. O ex-ministro pode ser denunciado por denunciação caluniosa ou crime contra a honra, por exemplo.
Nesse caso, Moro responde a um processo na Justiça comum, em primeira instância, já que não tem foro privilegiado.
Qual é o objeto de investigação do inquérito
A PGR abriu a investigação para apurar as acusações de Moro. Ao anunciar seu pedido de demissão, o ex-ministro acusou o presidente de interferência política na Polícia Federal. “Presidente me disse mais de uma vez, expressamente, que ele queria ter uma pessoa do contato pessoal dele, que ele pudesse ligar, que ele pudesse colher informações, que ele pudesse colher relatórios de inteligência. Não é o papel da PF prestar esse tipo de informação”, disse Moro.
O ministro também acrescentou que Bolsonaro teria interesse em investigações em curso da PF. “O presidente tinha preocupação com inquéritos em curso no STF e a troca seria oportuna da PF por esse motivo. Também não é razão que justifique a substituição, é algo que gera grande preocupação”, afirmou o ministro.
Bolsonaro rebateu e classificou as acusações como infundadas. "Será que é interferir na Polícia Federal quase que exigir, implorar a Sergio Moro, que apure quem mandou matar Jair Bolsonaro? A PF de Sergio Moro mais se preocupou com Marielle [Franco] do que com seu chefe supremo", disse o presidente em um pronunciamento.
O presidente também admitiu querer um diretor-geral da PF que fosse próximo a ele, com quem pudesse manter contato frequente, independente do ministro da Justiça. Após a demissão de Moro e a exoneração de Maurício Valeixo, Bolsonaro indicou o diretor da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), Alexandre Ramagem, para chefiar a PF. Mas a nomeação foi suspensa pelo ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF).
O que já foi feito até agora
Moro foi o primeiro a prestar depoimento no inquérito, no início de maio. Ele foi ouvido durante cerca de oito horas pela Polícia Federal em Curitiba e confirmou que o presidente tentou, mais de uma vez, trocar o superintendente da PF no Rio de Janeiro.
A PF também já ouviu delegados da PF e ministros do governo, além da deputada federal Carla Zambelli (PSL-SP).
Até agora, já foram ouvidos:
- Maurício Valeixo, ex-diretor-geral da PF e cuja demissão culminou com a saída de Moro do governo.
- Alexandre Ramagem, que chegou a ser nomeado e teve a indicação barrada para o cargo.
- Ricardo Saadi, ex-chefe da PF no Rio de Janeiro.
- Carlos Henrique de Oliveira Sousa, ex-chefe da PF no Rio, convidado por Rolando Alexandre para a diretoria-executiva da PF.
- Alexandre da Silva Saraiva, chefe da PF no Amazonas também envolvido na primeira crise pública entre Moro e Bolsonaro.
- Rodrigo Teixeira, ex-chefe da PF em Minas Gerais.
- Augusto Heleno, ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI).
- Walter Braga Netto, ministro da Casa Civil.
- Luiz Eduardo Ramos, ministro da Secretaria de Governo.
- Carla Zambelli (PSL-SP), deputada federal.
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