Jair Bolsonaro sempre negou relação com o caso Marielle Franco| Foto: Joédson Alves/EFE
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Desde o assassinato da vereadora Marielle Franco e de seu motorista Anderson Gomes, em março de 2018, setores da esquerda tentaram envolver o ex-presidente Jair Bolsonaro no crime. No entanto, o relatório final do inquérito da Polícia Federal (PF) sobre o caso não ratifica nenhuma dessas suspeitas. Essas ilações sequer são mencionadas no documento, de 479 páginas, que abrange a investigação inicial da Polícia Civil sobre o caso e as diligências da própria PF, iniciadas no ano passado, que buscaram desvendar quem mandou matar a vereadora.

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Em março deste ano, a PF concluiu o inquérito e prendeu como supostos mandantes do homicídio o conselheiro de Tribunal de Contas do Rio de Janeiro Domingos Brazão e seu irmão, o deputado federal Chiquinho Brazão (União-RJ). Também foi preso o ex-chefe da Polícia Civil do Rio Rivaldo Barbosa, mas sua defesa afirma que não há provas de sua ligação com os irmãos Brazão no assassinato de Marielle. O advogado Alexandre Dumas, que defende Rivaldo Barbosa, diz que está havendo um linchamento precipitado do delegado.

Com base nas delações premiadas do ex-policial Ronnie Lessa e do motorista Élcio Queiroz, denunciados como executores do crime, as investigações da PF apontaram que os Brazão eram os maiores interessados em retaliar Marielle, em razão de disputa por terrenos ilegais no Rio de Janeiro.

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Além de contratarem o crime, eles ainda teriam tentado desviar o foco das investigações da Polícia Civil para incriminar outras pessoas, supostamente comprando o direcionamento do inquérito junto a Rivaldo Barbosa, que comandava a corporação na época.

As primeiras acusações da esquerda contra Bolsonaro baseavam-se na suspeita de que o assassinato de Marielle tinha envolvimento de milícias.

Há tempos, políticos do PT e do Psol do Rio associavam o ex-presidente a esses grupos paramilitares, formados majoritariamente por policiais e bombeiros que, décadas atrás, começaram a exercer atividades de segurança privada e clandestina em regiões da cidade afligidas pela violência imposta às comunidades por facções do narcotráfico. Com o tempo, esses grupos passaram a extorquir moradores para a vigilância dos bairros, e depois a taxar o fornecimento de serviços de gás, telefone e internet. Nos últimos anos, passaram a promover invasões e grilagem de terrenos para vender lotes, onde também exerceriam domínio.

Tal é o contexto apresentado pela PF no relatório, que em nenhum momento cita o suposto envolvimento de Bolsonaro com as milícias. Toda a investigação aponta para os irmãos Brazão, que, segundo o inquérito, comandariam as primeiras milícias que dominaram bairros da Zona Oeste do Rio, como Jacarepaguá, Tanque, Gardênia Azul, Rio das Pedras e Osvaldo Cruz.

Para a PF, eles teriam encomendado a morte de Marielle junto a um miliciano de sua confiança, Edmilson Macalé (assassinado em 2021) que, por sua vez, teria chamado para executar o crime o ex-policial, miliciano e matador de aluguel Ronnie Lessa. Ele foi preso em 2019 junto com Élcio Queiroz, apontado como condutor do veículo que seguiu o carro de Marielle e de onde partiram os tiros. Ambos fecharam acordo de colaboração com a PF no ano passado, quando a corporação assumiu o caso, para entregar quem seriam os mandantes.

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Enquanto Élcio Queiroz concentrou-se em detalhar a execução do crime, Ronnie Lessa contou das reuniões que teria tido com Domingos Brazão em 2017 para receber a tarefa. Nesses encontros, o conselheiro teria dito que, por ordem do delegado Rivaldo Barbosa, que chefiava a Divisão de Homicídios, a emboscada não deveria ocorrer nos trajetos que Marielle fazia para chegar ou sair da Câmara dos Vereadores, mas no caminho de seu apartamento, no Rio Comprido.

A ideia era tentar desvincular o crime de alguma motivação política, o que poderia atrair a investigação para a esfera federal e, com isso, retirar do próprio Rivaldo Barbosa o controle das apurações, segundo alega a PF. A grande repercussão do caso, porém, acabou forçando as investigações para que chegassem a Lessa e Queiroz, mas sem avançar para descobrir quem seriam os mandantes.

Mas a PF não explica o motivo de a polícia ter identificado e prendido Lessa e Queiroz. Em teoria, se o então chefe da polícia Rivaldo Barbosa estava corrompido mesmo, então não faria sentido que ele deixasse a investigação evoluir até a prisão dos executores da vereadora.

Com base na delação deles, a investigação da PF concluiu que a motivação foi política, pois Marielle se opunha a projetos de Chiquinho Brazão para regularizar áreas de ocupação ilegal e destiná-las para moradias de classe média e alta e estabelecimentos comerciais, e não para beneficiar a população de baixa renda que lá residia, como queria a vereadora.

“Os elementos apresentados pelo discurso do colaborador podem ser sintetizados em duas questões primordiais: a suposta animosidade dos Brazão com integrantes do Psol [...] e a atuação de Marielle Franco junto a moradores de comunidades dominadas por milícias, notadamente no tocante à exploração da terra e aos loteamentos ilegais”, diz a PF.

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Esquerda usou visita de Élcio Queiroz a condomínio de Bolsonaro para acusar ex-presidente

Além da suposição de que Bolsonaro teria ligação com milícias, parte da esquerda passou a suspeitar do ex-presidente quando, em 2019, a Polícia Civil do Rio de Janeiro afirmou que, no dia do crime, em 14 de março de 2018, Élcio Queiroz visitou o condomínio Vivendas da Barra, onde vivia Ronnie Lessa e também Bolsonaro, antes de ser eleito presidente.

Ao consultar o caderno da portaria, que registrava as entradas de visitantes, havia a anotação de que naquele dia, à tarde, Élcio Queiroz teria pedido que o porteiro chamasse na casa de número 58, de Bolsonaro, para que fosse autorizado a entrar. Nesse dia, Bolsonaro estava na Câmara dos Deputados, em Brasília, conforme registros oficiais de presença e votação na casa.

Em outubro de 2019, quando Bolsonaro já era presidente, o caso foi noticiado em rede nacional. No mesmo dia, ele fez uma live, direto da Arábia Saudita, onde fazia uma visita. Acusou o então governador do Rio, Wilson Witzel, de vazar essa parte do inquérito.

“Deixar muito claro que algo muito errado está neste processo. Eu gostaria de falar muito neste processo, conversar com esses delegados. Colocar em pratos limpos o que está acontecendo em meu nome. Por que querem me destruir? Por que essa sede pelo poder, senhor Witzel?, protestou o ex-presidente.

Esse episódio da portaria também não é levado em consideração no relatório final da PF sobre o caso. Numa entrevista concedida em 2022 ao site The Intercept Brasil, o delegado Giniton Lages, que primeiro chefiou as investigações do crime, disse que o porteiro errou ao registrar que Élcio Queiroz pediu autorização para entrar na casa de Bolsonaro – as investigações mostraram que ele sempre pedia autorização na casa de Ronnie Lessa, e para lá se dirigiu no dia do crime, para encontrá-lo.

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“Buscamos todos os nomes próximos a Lessa que entraram no condomínio com a autorização dele. A essa altura, nós já víamos Élcio como alguém próximo do alvo – e ele nos chamou mais a atenção do que os outros. O analista não percebeu o que a equipe seguinte viu: a anotação de entrada no dia do crime com o número da casa 58, onde morava a família Bolsonaro. Depois eles constataram que o áudio não bateu e, por isso, teria sido um erro material do porteiro”, afirmou o delegado.

Na investigação da PF, Giniton Lages é suspeito de, junto com Rivaldo Barbosa, tentar direcionar as investigações para não implicar os Brazão como mandantes. A principal suspeita contra ele é de que não teria captado todas as imagens de câmeras de segurança dos imóveis vizinhos ao local do crime, nos dias seguintes. Na entrevista de 2022, ele disse que houve um erro de procedimento técnico na captura das gravações. Ainda assim, disse que o fato não trouxe prejuízo para identificar o carro dos assassinos e chegar a Ronnie Lessa e Élcio Queiroz.

O inquérito da PF aponta falhas no trabalho de Giniton usando parâmetros coletados em uma reportagem da imprensa. A PF cita uma reportagem sobre uma outra investigação não relacionada, onde a polícia foi capaz de rastrear um criminoso em um trajeto de 40 quilômetros e cobra Giniton por não ter tido a mesma eficiência.

"Linchamento precipitado", diz defesa de Rivaldo Barbosa sobre conclusão da PF

A defesa de Rivaldo Barbosa nega que ele tenha atuado para proteger os irmãos Brazão, acusação que, segundo ele, é baseada apenas na delação de Ronnie Lessa.

“Eu acredito que isso é apenas um artifício que foi criado para envolver o ‘doutor’ Rivaldo no homicídio. Esse relatório é uma imputação preliminar que precisa ser depurada, através da instrução criminal. É um linchamento precipitado, por conta de meia dúzia de palavras postas no relatório da Polícia Federal", disse Alexandre Dumas, advogado de Rivaldo Barbosa, à GloboNews.

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Infográficos Gazeta do Povo[Clique para ampliar]