O secretário de Previdência, Rogério Marinho, e o ministro da Economia, Paulo Guedes. (Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom/ABr)| Foto: Agência Brasil

A reforma da Previdência proposta pela equipe do presidente Jair Bolsonaro (PSL) traz alguns 'jabutis' e pegadinhas que pouco ou nada interferem no impacto econômico da medida. Mas, como admitido pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, na última semana, os jabutis existem e estão ali porque alguém colocou – o que já garante ao governo uma margem de manobra para desidratar a reforma sem mexer no que realmente importa.

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E alguns desses truques já estão na mira dos deputados que integram a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara, que deve votar o relatório sobre a PEC da Previdência nesta terça-feira (23).

A Gazeta do Povo listou nove jabutis que foram propostas pelo governo e podem desaparecer da reforma. Confira.

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Desconstitucionalizar vários pontos da Previdência

A Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que altera as regras da Previdência prevê a desconstitucionalização de diversos pontos – 61, de acordo com a contagem do Congresso em Foco. Isso significa que as mudanças que são alvo desse tipo de ação deixam de ser consideradas questões constitucionais e podem vir a ser alteradas por projetos de leis complementares. Na prática, seria mais fácil aprovar qualquer mudança no futuro. Uma PEC exige a aprovação de 3/5 dos parlamentares, enquanto projetos de leis só precisam da maioria simples.

Entre os tópicos que passariam por essa desconstitucionalização estão a cobertura de benefícios como os auxílios doença e reclusão, aposentadoria por invalidez, proteção à maternidade, garantia de renda mínima pela Previdência e até mesmo alterações nas alíquotas de contribuição para a aposentadoria, de tempo de contribuição e idade mínima e regras de reajuste do benefício.

O secretário especial de Previdência, Rogério Marinho, já sinalizou na última semana, em encontro com líderes do Centrão, que o governo está disposto a fazer concessões nesses pontos. Resta saber o que já pode cair na própria CCJ e o que passaria por nova avaliação na Comissão Especial - próxima parada do projeto, caso seja aprovado nesta primeira etapa.

Abono salarial com restrições

Uma tentativa de restringir o acesso ao abono salarial, e que teria um impacto de até R$ 150 bilhões em uma década, pode cair logo de cara. O governo propõe que o pagamento do abono salarial seja direcionado apenas para trabalhadores que recebem até um salário mínimo por mês, que representam cerca de 10% dos atuais beneficiários.

Hoje, o benefício é pago para os trabalhadores formais que recebem até dois salários mínimos mensais, estejam inscritos no PIS/Pasep há pelo menos cinco anos e tenham trabalhados pelo menos 30 dias no ano de referência.

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Essa mudança enfrenta resistência de deputados do Centrão e da oposição, que são contrários à restrição.

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Essa proposta ainda tem uma curiosidade. Na contramão de várias ações que visam desvincular tópicos previdenciários da Constituição, no caso do abono, a proposta do governo quer incluir uma alteração no corpo permanente da Carta.

É uma regra que foi estabelecida em 2014, ainda no governo de Dilma Rousseff (PT), que estabeleceu o abono pago proporcionalmente ao período trabalhado no ano de referência. Ou seja, se a pessoa trabalhou por cinco meses naquele ano, receberá um abono proporcional a esse período. Antes, qualquer trabalhador recebia um salário mínimo integral, independentemente de quanto tempo tivesse trabalhado.

Mudanças para o aposentado que continua trabalhando

Quem é aposentado e continua trabalhando pode ser afetado por duas mudanças propostas na reforma da Previdência. Ela não só prevê o fim da multa de 40% sobre o FGTS de quem já está aposentado e é demitido, como também retira a obrigatoriedade de recolhimento do fundo de garantia dos aposentados que voltam a ativa.

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Hoje, qualquer trabalhador que é demitido sem justa causa tem direito a sacar o saldo do FGTS e receber uma multa de 40% sobre esse saldo, paga pelo empregador. A reforma da Previdência altera a regra apenas para os aposentados, que deixariam de receber o valor da multa, mas poderiam sacar o saldo do que foi recolhido. A outra mudança proposta mudaria os contratos de trabalhos desses aposentados que voltam a trabalhar. Hoje, é obrigatório recolher a contribuição para o FGTS. Com a reforma, os futuros contratos não teriam esse desconto previsto.

Para a OAB-SP, essa mudança não pode ser realizada porque fere uma cláusula pétrea do direito do trabalhador. A entidade já se manifestou contra essa mudança por meio de uma nota técnica.

Bengala antecipada para o STF

O governo propôs uma desconstitucionalização que afetaria os servidores públicos, em especial o Supremo Tribunal Federal (STF). A alteração praticamente revogaria a PEC da Bengala, que aumentou a idade de aposentadoria compulsória de servidores públicos de 70 anos para 75 anos – isso permitiu que os ministros do STF e de outros tribunais superiores ficassem mais tempo na função, diminuindo a rotatividade nesses cargos.

A PEC da Bengala foi aprovada em 2015 graças a uma manobra da então oposição e Centrão para evitar que os governos do PT indicassem 10 dos 11 ministros do STF – e postergou a aposentadoria dos ministros Celso de Mello e Marco Aurélio Mello para 2020 e 2021.

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A proposta do governo é jogar essa definição da idade máxima para aposentadoria para uma lei complementar, o que tornaria mais simples qualquer modificação. Muitos governistas defendem esse ponto, usando a argumentação de que isso reduziria o ativismo judicial.

Também aumentaria o número de indicações que Jair Bolsonaro poderia fazer a Corte enquanto presidente: de duas nomeações, o pesselista poderia fazer quatro indicações ao longo de seu mandato, caso a mudança prospere. O assunto é delicado e já encontra resistência entre os parlamentares. O governo já teria indicado que aceita abrir mão desse ponto para que o projeto siga tramitando.

Benefício só com fonte de custeio

De olho no cumprimento da Lei de Responsabilidade Fiscal, o governo incluiu na reforma da Previdência uma regra que proíbe a criação ou majoração de benefícios da seguridade social por lei ou por decisão judicial caso não haja a indicação da fonte de custeio. Os deputados querem tirar esse ponto do texto.

Ações judiciais? Só em Brasília

O governo propôs que todas as ações judiciais sobre a Previdência fossem concentradas em Brasília. Isso significa que qualquer cidadão que iniciasse um processo por alguma questão referente à Previdência Social precisaria protocolar essa ação na Justiça Federal em Brasília.

Os deputados já demostraram ser contrários a essa alteração, e o próprio governo admite que concorda com a retirada desse jabuti do texto.

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Quem pode alterar a Previdência?

Um jabuti muito curioso deve ser limado pelos deputados. Há um trecho da proposta de reforma da Previdência que atribui ao Poder Executivo a exclusividade na proposição de qualquer alteração nas regras da aposentadoria.

Ou seja: se o Congresso – seja Câmara dos Deputados, seja Senado – quisesse, por iniciativa própria, fazer qualquer alteração nas aposentadorias, não poderia. Uma vedação e tanto para o poder Legislativo, como o próprio nome já indica. Os deputados já demonstraram a insatisfação com esse trecho, que deve cair ainda na CCJ.

Taxação de benefícios

O texto que altera as regras da Previdência propõe que as alíquotas de contribuição para o INSS possam incidir sobre rendimentos de qualquer natureza, e não apenas sobre o salário-base.

Embora não haja referência sobre os tipos de rendimento que seriam afetados, especialistas alertam que isso poderia incluir a taxação de benefícios como vale-refeição, adicional de férias e participação nos lucros, conforme reportagem do UOL. Neste caso, alertam os especialistas, a arrecadação do governo cresceria, mas o salário do trabalhador encolheria.

Eleição para PM e bombeiro

Reforma da Previdência tratando de questão eleitoral? Pois acontece na proposta pelo governo Bolsonaro. É que o texto enviado pelo governo apaga uma parte do artigo 42 da Constituição, que fala sobre a participação de policiais militares e bombeiros em eleições.

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A Folha de S. Paulo ouviu especialistas que explicam que, ao retirar essa parte do texto original, a interpretação é de que esses agentes de segurança podem se candidatar em qualquer hipótese, sem as restrições que existem atualmente – que determinam afastamento da atividade nos casos em que o funcionário está no serviço público há menos de dez anos ou, caso tenha mais de dez anos de serviço público e seja eleito, se torne inativo.

Ou seja: absolutamente nada a ver com a previdência das categorias.