Como foi possível que o ex-procurador-geral da República Rodrigo Janot tenha entrado no prédio do Supremo Tribunal Federal (STF), em Brasília, com uma arma de fogo com a intenção de matar o ministro Gilmar Mendes, seu desafeto?
Essa é a pergunta que todos estão fazendo após a chocante entrevista que o ex-PGR concedeu ao jornal O Estado de São Paulo, na quinta-feira (26). O imóvel-sede de um dos três poderes da República, projeto pelo arquiteto Oscar Niemeyer, tem uma equipe de segurança própria e protocolos rígidos. Nada disso parece ter sido suficiente, como se vê agora.
O Supremo proíbe a entrada de pessoas portando qualquer tipo de arma. O problema é que autoridades que ingressam nas instalações do tribunal – como ministros, parlamentares, governadores e procuradores-gerais da República – não passam por detectores de metais, já que utilizam um acesso restrito, diferente daquele usado pelo público comum.
Segundo a reportagem apurou, a equipe de segurança do STF está avaliando o episódio divulgado por Janot para ver se alguma medida precisa ser tomada. Um integrante do tribunal ouvido reservadamente acredita que a declaração de Janot foi “um ótimo teaser” para o lançamento do livro de memórias do ex-PGR. O “teaser” é uma espécie de “prévia”, um recurso de publicidade para despertar a curiosidade do público sobre um fato que só será conhecido em detalhes depois.
Janot disse que foi ao Supremo armado com uma pistola e encontrou Gilmar na antessala do cafezinho da Corte, antes da sessão. “Ele estava sozinho”, disse. “Mas foi a mão de Deus. Foi a mão de Deus”, repetiu o procurador ao justificar por que não concretizou a intenção de matar o ministro. “Cheguei a entrar no Supremo (com essa intenção)”, relatou. “Ele estava na sala, na entrada da sala de sessão. Eu vi, olhei, e aí veio uma ‘mão’ mesmo”.
A história narrada por Janot mostra que o ex-procurador-geral violou as regras internas de segurança do STF. Uma instrução normativa do tribunal, de 2013, estabelece que é proibida a entrada de “pessoas portando qualquer tipo de arma”, exceto inspetores, agentes de segurança do próprio tribunal, policiais civis, militares, federais e rodoviários federais, os servidores da área de segurança do Poder Judiciário, das polícias da Câmara dos Deputados, do Senado e da Câmara Legislativa e os militares das forças armadas em atividade de serviço no interior do tribunal.
Não é incomum ver seguranças armados acompanhando ministros do Supremo, em atividades dentro ou fora do tribunal. Para aumentar a segurança dos magistrados, o STF chegou inclusive a gastar R$ 2,8 milhões para a compra de 14 carros blindados.
Membros do MP podem andar armados
A Lei Orgânica Nacional do Ministério Público autoriza o porte de armas para membros do MP, independentemente de “qualquer ato formal de licença ou autorização”.
Em 2015, no entanto, a Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que para portar armas de fogo, é preciso que o membro do MP demonstre capacidade técnica para isso. O STJ entendeu que o porte de arma nesses casos não dispensa o registro, procedimento em que é exigida a comprovação da capacidade técnica. Mesmo aposentado, Janot conserva a prerrogativa do porte de arma.
Veto a armas não é uma exclusividade do Supremo
As restrições impostas à entrada de armas não são exclusividade do Supremo. O artigo 271 do regimento interno da Câmara dos Deputados proíbe o porte de arma de qualquer espécie nos edifícios da Casa – o parlamentar que descumprir a regra pode até ser cassado se cometer essa infração disciplinar.
O deputado Delegado Waldir (PSL–GO) já assustou colegas da Casa ao andar pelos corredores com um coldre na cintura (um acessório preso à cintura, para carregar armas de fogo), mas garante que não leva arma ao Congresso.
Em abril deste ano, uma confusão generalizada – com acusações de que Waldir estava armado – interrompeu uma reunião da Comissão de Constituição e Justiça que discutia a reforma da Previdência. O deputado Eduardo Bismarck (PDT–CE) pediu a verificação de imagens do sistema de segurança para confirmar se Waldir estava armado ou não no plenário da comissão.
No Senado Federal, o regimento interno permite a “qualquer pessoa assistir às sessões públicas, do lugar que lhe for reservado, desde que se encontre desarmada e se conserve em silêncio”. A Casa, aliás, foi palco de violência em 4 de dezembro de 1963, quando o senador Arnon de Mello, pai do atual senador Fernando Collor (PROS-AL), atirou contra o senador Silvestre Péricles. O segundo disparo atingiu o senador José Kairala, que morreu horas depois.
Em 2011, um homem apareceu armado com um revólver na portaria principal do Palácio do Planalto para deixar uma carta com a presidente Dilma Rousseff e reivindicar um cargo que lhe teria sido prometido pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Ele acabou se entregando à equipe de segurança, e o episódio terminou sem feridos.
Desafeto na própria Corte
Um outro desafeto de Gilmar Mendes, o ministro Marco Aurélio Mello, do STF, já tornou pública a sua “inimizade capital” com o ministro em entrevista concedida à Rádio Guaíba em setembro de 2017. “Em relação a mim ele passou de todos os limites inimagináveis. Caso estivéssemos no século 18, o embate acabaria em duelo e eu escolheria uma arma de fogo, não uma arma branca”, disparou Marco Aurélio na ocasião. Por sorte, estamos no século 21.
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