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Sucessão de Lira

Estratégia pró-judicialização de Lula pode reduzir sua influência na disputa da presidência da Câmara

Arthur Lira, atual presidente da Câmara dos Deputados
Arthur Lira, atual presidente da Câmara dos Deputados, deixará o comando da Casa em 2025 (Foto: Mário Agra / Câmara dos Deputados)

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O acordo entre governo, empresas e Congresso para reonerar a folha de pagamento de 17 setores da economia, atingindo setores econômicos que empregam mais de 9 milhões de pessoas, indica que a parceria entre STF e Planalto, além de gerar incômodo no Legislativo, pode afetar as articulações para a presidência da Câmara dos Deputados no ano que vem.

O principal indício desse cenário é o descontentamento de congressistas com a atitude do governo em judicializar questões que foram decididas pelo Legislativo. Com o julgamento sobre a desoneração no STF a um voto de atender o pedido do governo Lula, os parlamentares se viram obrigados a ceder um meio-termo para não sofrer uma derrota por medida judicial. O acordo prevê que a desoneração continuará neste ano e a partir de 2025 haverá um aumento progressivo, começando em 5%.

No entanto, a avaliação de quem transita pelo Salão Verde do Congresso é de que a postura do governo pode ter um preço no pleito pelo comando da Casa. Para analistas, o Planalto reduz a influência sobre a disputa e fortalece a posição de Arthur Lira (PP-AL), atual presidente, em apresentar um candidato que tenha menos ligação com o governo.

Antes de o caso parar na Justiça, já havia entre os parlamentares o entendimento de que um eventual candidato apoiado por Lula, mesmo que de forma implícita, poderia sofrer forte rejeição na disputa pela sucessão de Lira. Atualmente, os nomes mais cotados são dos deputados Marcos Pereira (Republicanos-SP), Elmar Nascimento (União-BA) e Antônio Brito (PSD-BA).

Tanto Elmar quanto Pereira são vistos como pré-candidatos mais distantes do Planalto, apesar de volta e meia cortejarem o governo para um apoio mais discreto. Por outro lado, Antônio Brito é visto como uma opção mais próxima aos governistas. O deputado baiano é ventilado como alguém que possui bom trânsito com governistas e oposição.

Para o presidente da Frente Parlamentar do Empreendedorismo (FPE), deputado Joaquim Passarinho (PL-RN), a judicialização feita pelo governo vai de encontro à autonomia do Legislativo. “Acho que o governo perde força. O que mais briga é pela autonomia do Legislativo e aí vemos o governo querendo cortar essa autonomia, judicializando tudo. Quem vai querer ficar ao lado do governo?”, disse o parlamentar.

Judicialização por parte do governo pode fortalecer candidato de Lira na Câmara

A opinião de Passarinho também é compartilhada por quem transita no Salão Verde do Congresso. A avaliação nos bastidores é de que a vitória do governo sobre a desoneração é uma “vitória de Pirro”, ou seja, obtida a um alto custo, e que Elmar Nascimento, atualmente cotado como o candidato de Lira, pode sair fortalecido.

No último dia 28 de abril, o presidente da Câmara defendeu “subir o sarrafo” sobre quem pode apresentar ações diretas de inconstitucionalidade ao STF, inclusive contra decisões do Congresso. “O que é que adianta um projeto com 400 votos no plenário da Câmara e um parlamentar entra com a ADI e um ministro [do STF] dá uma liminar?”, questionou Lira na abertura da 89ª ExpoZebu, em Uberaba (MG).

Para o cientista político Adriano Cerqueira, docente do Ibmec de Belo Horizonte, a judicialização feita pelo governo estressa ainda mais a relação entre os poderes e pode ter consequências na eleição da Mesa Diretora da Câmara em fevereiro de 2025.

“O governo está sinalizando uma disposição de enfrentamento. Isso só dificulta a relação com o Legislativo. Pode até ser uma estratégia de Lula em não ceder para Lira, mas, ao meu ver, não é uma estratégia que possa contribuir, já que dificulta que um candidato aliado ao Planalto possa chegar à presidência”, disse.

Já na avaliação do cientista político Juan Carlos Arruda, CEO do Ranking dos Políticos, a participação do Judiciário em assuntos do Legislativo, quando provocado pelo Executivo, representa um desafio para a estruturação dos Três Poderes.

“A tendência de judicializar questões a cada derrota do governo no Congresso cria um cenário de conflito com o Poder Legislativo. O próximo presidente da Câmara ou do Senado enfrentará esse desafio e sairá fortalecido aquele que apresentar uma solução para reduzir a judicialização por parte do Executivo”, disse Arruda.

Governo se apoia no STF para arrecadar e mudar entendimento do Congresso

O mau clima do Congresso foi percebido pelo Planalto, mas as declarações de integrantes do núcleo duro do governo indicam que a gestão petista se mostra mais confiante com a judicialização para reforçar a pauta arrecadatória, mesmo que isso dificulte o diálogo com os parlamentares.

Em entrevista coletiva na segunda-feira passada (29), o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, afirmou que não teme o clima causado pela judicialização no caso da desoneração da folha. "Não temo, porque tem dado muito resultado o nosso diálogo com o Congresso e com o Judiciário", afirmou Haddad em conversa com jornalistas.

A percepção de Haddad é comprovada pelas últimas decisões do STF em favor do governo. Em março de 2023, a Corte decidiu pela incidência da tributação de PIS e Cofins sobre as receitas financeiras das empresas. O entendimento foi de que a seguridade social é financiada não só pelo faturamento, mas também pela receita das empresas. Segundo estimativa do Ministério da Fazenda à época, a União arrecadaria R$ 115 bilhões com a decisão.

No entanto, a maior vitória fiscal do governo se deu em março deste ano. Por 7 votos a 4, a Corte derrubou o próprio entendimento sobre a “revisão da vida toda”. Em 2022, os ministros entenderam que, em alguns casos, os aposentados poderiam buscar uma opção de cálculo mais vantajosa para aposentadoria, que poderia ser uma regra de transição ou o regime implantado após a criação do fator previdenciário. Com a mudança do novo julgamento, em março de 2024, o governo economizou R$ 480 bilhões.

O andamento do marco temporal para as demarcações de terras indígenas também é visto como outra vitória para o Planalto. Em setembro, o STF havia derrotado o marco temporal, mas, em outubro, Câmara e Senado aprovaram a retomada da tese por meio da nova lei, parcialmente vetada pelo presidente Lula. Após a derrubada dos vetos pelo Congresso, em dezembro, PT, PC do B, PV, Psol e Rede Sustentabilidade recorreram ao STF pedindo a nulidade de vários trechos da legislação. Em um sinal para congressistas, porém, o ministro Gilmar Mendes, do STF, suspendeu temporariamente as ações que questionam a nova lei, abrindo um espaço para diálogo.

Parlamentares cobram resposta ao STF, mas Lira trava medidas

Além do descontentamento com o governo, deputados cobram do presidente da Câmara alguma reação contra o que eles entendem como ingerência do Judiciário em assuntos do Legislativo. Atualmente duas propostas se destacam: a PEC das decisões monocráticas e a CPI do Abuso de Autoridade.

No caso da PEC, a proposta vinda do Senado precisa ser liberada pelo presidente para que a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara possa analisá-la. O colegiado é presidido pela deputada Caroline de Toni (PL-SC). A leitura de parlamentares da oposição é de que a matéria deve continuar engavetada por Lira.

Já a CPI para apurar abusos de autoridade consta na fila de outras comissões de investigação previstas na Câmara. A oposição chegou a pressionar para que a comissão fosse instalada após o caso Twitter Files Brasil revelar para apurar abusos de autoridade por parte de membros do STF. No entanto, a percepção entre os congressistas é de que o colegiado não deve ser instalado por dois motivos: evitar atrito com o Judiciário e pouco engajamento dos deputados por conta das eleições municipais marcadas para outubro.

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