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Nova lei

Juiz de garantias vai ser alvo de batalha no STF. Entenda o que está em jogo

Lei de abuso de autoridade é contestada no STF
STF vai ter que se pronunciar sobre lei de abuso de autoridade, que entra em vigor nesta sexta-feira (Foto: Agência Brasil)

Sancionada pelo presidente Jair Bolsonaro junto com o pacote anticrime, a criação da figura do juiz de garantias ainda vai gerar discussão antes de entrar efetivamente em vigor no Brasil. A previsão foi incluída nas propostas enviadas ao Congresso pelo ministro da Justiça, Sergio Moro, e pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Alexandre de Moraes, e gerou críticas de parlamentares alinhados à Lava Jato, magistrados e membros do Ministério Público até chegar ao STF, que vai ter que se posicionar sobre a proposta aprovada.

A figura do juiz de garantias foi incluída no pacote anticrime ainda na fase de análise das propostas por um grupo de trabalho na Câmara dos Deputados. O texto, sancionado por Bolsonaro, determina que o juiz que instrui o processo, autorizando quebras de sigilo e medidas cautelares, por exemplo, não será o mesmo que vai julgar as ações contra os denunciados.

STF vai ter que se pronunciar

Pelo menos três Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADI) já foram protocoladas no STF contra a criação do juiz de garantias. As três ações têm pedidos de liminar, ou seja, uma decisão monocrática, provisória, até que o Plenário decida sobre o mérito. O relator é o ministro Luiz Fux.

A primeira ADI foi proposta pela Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe) e Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB). As duas entidades argumentam que a lei sancionada por Bolsonaro dispõe sobre normas dentro do campo processual que, segundo a Constituição, são competência da União.

"A criação de um novo órgão no Poder Judiciário, denominado juiz de garantias, não pode prescindir de lei que promova a alteração da lei de organização judiciária", argumentam. As entidades também ressaltam que a lei não previu uma regra de transição. "Não há como aceitar como razoável e proporcional o prazo de 30 dias de vacatio legis contido no artigo 20 da lei aqui impugnada", diz a peça inicial. As associações também alegam que o Poder Judiciário não tem estrutura suficiente para implementar o juiz de garantias, além da criação da nova figura violar o princípio do juiz natural.

O Podemos e o Cidadania também protocolaram uma ADI no STF questionando o juiz de garantias. Os partidos também pediram uma liminar para suspender a implementação até que o STF se posicione sobre o tema.

O argumento dos partidos é a falta de orçamento no Judiciário para promover as mudanças sancionadas por Bolsonaro. "A medida teria impacto praticamente imediato, afetando, portanto, a despesa do ano que está prestes a começar e para cujo exercício já existem orçamentos aprovados, tanto no âmbito da União quanto dos Estados, os quais, obviamente, não comportam de forma alguma despesa nesse montante", alegam os partidos.

Na ADI, as legendas também argumentam que o juiz de garantias vai prejudicar o combate a crimes de colarinho branco, como corrupção. "O juiz responsável pela instrução não acompanhará o desenvolvimento das investigações, ficando totalmente alheio aos acontecimentos empreendidos pela autoridade policial e pelo Ministério Público, o que poderá ocasionar um julgamento mais tardio, tendo em vista que o magistrado precisará de mais tempo para firmar sua convicção", argumentam o Podemos e o Cidadania.

O PSL, antigo partido de Bolsonaro, também entrou com uma ação no STF para questionar a criação do juiz de garantias, sancionada pelo presidente.

O que o STF deve decidir

Pelo menos seis ministros do STF já disseram publicamente, em entrevistas ao jornal O Estado de S. Paulo, ver o juiz de garantias com bons olhos. Os ministros Ricardo Lewandowski, Gilmar Mendes, Marco Aurélio Mello, Celso de Mello e Alexandre de Moraes - autor de parte do pacote anticrime sancionado por Bolsonaro - disseram ser favoráveis à criação da nova figura.

O presidente do STF, Dias Toffoli, criou no Conselho Nacional de Justiça (CNJ) um grupo de trabalho para discutir o tema e propor, até o dia 15 de janeiro, uma norma para aplicação do juiz de garantias em todo o país. Na visão de Toffoli, a nova norma só vai valer para casos futuros e em casos de primeira instância.

“Já há experiências exitosas que garantem maior imparcialidade do magistrado que vai julgar a causa sem estar contaminado pela coleta das provas. Essa é a característica do juiz de garantias”, disse o presidente do STF em entrevista ao Estadão.

Moro é contra o juiz de garantias

Autor de parte das propostas do pacote anticrime, o ministro da Justiça, Sergio Moro, lamentou a aprovação do juiz de garantias pelo Congresso e mostrou preocupação com a aplicação da lei sancionada.

“Leio na lei de criação do juiz de garantias que, nas comarcas com um juiz apenas (40 por cento do total), será feito um "rodízio de magistrados" para resolver a necessidade de outro juiz. Para mim é um mistério o que esse "rodízio" significa. Tenho dúvidas se alguém sabe a resposta”, disse o ministro, no Twitter.

Membro da força-tarefa da Lava Jato em Curitiba, o procurador Roberson Pozzobon também criticou a nova legislação sancionada por Bolsonaro. “Com uma canetada fixou-se prazo de 30 dias para instalar o juiz de garantias em todo o país, o que é irresponsável e manifestamente inviável”, disse Pozzobon.

Quem é a favor do juiz de garantias?

Autora da proposta, a deputada federal Margarete Coelho (PP-PI) defendeu a criação do juiz de garantias nas redes sociais. “Se o juiz de garantias não cria novas fases processuais e nem novas atribuições judiciais, não há que se falar em necessidade de contratação de novos juízes, apenas em redistribuição de funções que os TJs cuidarão”, argumentou a deputada. “É fato: apenas as pequenas Comarcas têm apenas um Juiz. Nelas, a quantidade de processos criminais que demandam intervenção do juiz (interceptações, prisões, quebras de sigilos...) é bem pequena. Nas grandes comarcas, a prática já mostra que centrais de inquéritos resolvem bem”, afirmou a parlamentar.

Ao contrário da Ajufe e da AMB, que criticaram a criação do juiz de garantias, a Associação Juízes para a Democracia (AJD) divulgou uma nota defendendo a nova previsão. "Atuando especificamente na fase de investigação preliminar, o juiz das garantias cuidará da legalidade e do respeito aos direitos e garantias fundamentais da pessoa investigada ou indiciada pela prática de crime, exaurindo sua competência após decisão sobre o recebimento ou não da denúncia, em absoluto respeito ao sistema acusatório e preservação da imparcialidade do magistrado que atuará na fase do contraditório", diz a nota.

Presidente rebateu críticas 

Durante uma live no Facebook, o presidente Jair Bolsonaro rebateu as críticas contra a sanção ao juiz de garantias no pacote anticrime. Um dos processos que pode ser afetado com a troca de juiz é o do senador Flávio Bolsonaro, filho do presidente, investigado pelo Ministério Público do Rio de Janeiro pela prática de rachadinha quando era deputado estadual.

"O que me surpreende é um batalhão de internautas constitucionalistas, juristas para debater o assunto. E falam que eu traí, que não votam mais e ligam a alguma coisa familiar. Sai fora da minha página, se não sair eu vou para o bloqueio. Vai ver no perfil, 70% de esquerda e 30% de gente nossa, que votou em mim e que está sendo levada pelo momento", disse durante a live. "Veja o padrão dos itens vetados. Para mim, seria mole vetar os crimes na internet, e estaria instituindo a censura no Brasil. E com todo respeito, 90% não sabem o que é juiz de garantia e ficam criticando", afirmou Bolsonaro.


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