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Lula
Documentos apontam que a própria legislação brasileira já sinaliza que Hamas é considerado grupo terrorista.| Foto: reprodução/Canal Gov

Dois documentos do Ministério da Justiça e da Polícia Federal classificaram o Hamas como “grupo terrorista” e contrariaram a posição do governo e do próprio presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que dizem seguir a orientação da Organização das Nações Unidas (ONU) ao dar esta designação.

Os documentos fazem parte do processo sobre a proibição do palestino Muslim Abuumar de entrar no Brasil em meados de junho por suspeita de ligação com o alto escalão do grupo, e foram juntados pela Advocacia-Geral da União (AGU) no último sábado (13) de acordo com apuração da CNN Brasil com reprodução de trechos. A Gazeta do Povo pediu mais informações e acesso aos documentos ao Ministério da Justiça e à Polícia Federal.

A pasta, no entanto, negou acesso e respondeu que “a análise sobre o caso aconteceu a partir de procedimento que correu sob sigilo na Polícia Federal, razão pela qual o Ministério da Justiça e Segurança Pública não comenta”.

Já a Polícia Federal informou à reportagem que “a legislação antiterrorista brasileira não exige a classificação prévia de grupos como terroristas para que sejam enquadrados como tal. Basta que um grupo pratique atos de violência ou ameaças com motivação xenofóbica, racista ou de intolerância religiosa, com o objetivo de causar pânico social, para que seja considerado organização terrorista pela lei”.

O Ministério das Relações Exteriores (Itamaraty) afirmou em nota à Gazeta do Povo que "repudia o terrorismo em todas as suas formas e manifestações", mas que segue a orientação da ONU na classificação de grupos considerados terroristas ou não. "O Brasil aplica as determinações feitas pelo Conselho de Segurança das Nações Unidas, órgão encarregado de velar pela paz e pela segurança internacionais, nos termos do Artigo 24 da Carta da ONU", pontuou.

A reportagem também procurou a Secretaria de Comunicação da Presidência da República (Secom) e aguarda retorno.

De acordo com a apuração, que reproduz trechos dos documentos, um deles é de autoria da Divisão de Estudos e Pareceres do Ministério da Justiça e aponta que a proibição de Abuumar foi “motivada pela existência do nome de um dos impetrantes na base de dados do Terrorist Screening Center (TSC), a qual a autoridade policial [Polícia Federal] possui acesso por força de acordo assinado com o FBI em 2016, e que demonstra o seu envolvimento com organização terrorista (grupo Hamas)”.

“Destaca-se que a Constituição Federal elenca o repúdio ao terrorismo entre os princípios que regem as relações internacionais”, completa o documento assinado no dia 8 de julho.

O relatório da Polícia Federal é de cinco dias antes e cita o não reconhecimento pelo Brasil do Hamas como “organização terrorista”, mas aponta que “a legislação pátria não utiliza lista de classificação para definir quais grupos são considerados terroristas”.

Semelhante ao que respondeu à Gazeta do Povo, o trecho reproduzido na apuração afirma que “o enfrentamento de organizações terroristas é pautado por um sistema que adota o conceito de lista aberta, um modelo flexível que permite a inclusão de novos grupos mediante evidências e informações de envolvimento com os tipos penais descritos na Lei nº 13.260, de 16 de março de 2016”.

“Destarte, a abordagem de lista aberta no Brasil significa que não há uma lista fixa e imutável de organizações terroristas, mas sim um processo contínuo de avaliação e atualização conforme novas informações e mudanças no cenário internacional”, completa a PF no relatório.

Desde os ataques do grupo Hamas a Israel, em outubro do ano passado, o governo brasileiro sempre enfatizou que não o trataria oficialmente como um terrorista, embora o presidente Lula tenha citado diversas vezes que a organização cometeu “ataques terroristas” – mas, sempre seguidas de críticas à reação israelense.

“Não é porque o hamas cometeu um ato terrorista contra Israel que Israel tem que matar milhões de inocentes”, disparou Lula em novembro do ano passado.

Na semana seguinte aos ataques, o ministro Mauro Vieira, das Relações Exteriores, afirmou que o Brasil não adotaria essa classificação ao Hamas enquanto a ONU não defini-la.

“O Conselho de Segurança não classificou o Hamas como um organismo terrorista até agora. Portanto o Brasil segue essa orientação. O mesmo serve para sanções. Nós não aplicamos sanções em outros paises que não sejam impostas pela ONU”, justificou na época.

A resistência do governo brasileiro em classificar o Hamas como grupo terrorista gerou reação no Legislativo e na sociedade. Os deputados passaram a pressionar Lula e a propor a criminalização de manifestações a favor do grupo e também ao Hezbollah, braço da organização no Líbano – país vizinho a Israel.

E até mesmo a popularidade de Lula foi abalada, com uma pesquisa de avaliação do governo indicando uma queda da aprovação e aumento da reprovação.

A mudança de designação, no entanto, parece estar longe de ocorrer. Em meados de fevereiro deste ano, o subsecretário-geral da ONU para Assuntos Humanitários e Coordenador de Ajuda de Emergência, Martin Griffiths, afirmou que o Hamas não é considerado um grupo terrorista para a organização, mas um “movimento político”.

“Só para esclarecer: o Hamas não está na lista de grupos designados como organizações terroristas pelo Conselho de Segurança das Nações Unidas, como vocês sabem, é um movimento político. [...] Isso não torna os atos de terror do dia 7 de outubro menos horríveis e repreensíveis”, completou.

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