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Crime

O lago e o rio que são a maior porta de entrada do contrabando do Brasil

Imagem exibe soldado do Exército com carabina fazendo patrulha das margens do Rio Paraná em Foz do Iguaçu, nas proximidades da Ponte da Amizade, na fronteira com o Paraguai.
Patrulha das margens do Rio Paraná em Foz do Iguaçu, na fronteira com o Paraguai: aumento da fiscalização na aduana da Ponte da Amizade mudou estratégia de contrabandistas. (Foto: Christian Rizzi/Arquivo/Gazeta do Povo)

Em 2006, as autoridades brasileiras alcançaram uma importante vitória contra o contrabando em Foz do Iguaçu. A inauguração da Nova Aduana, em agosto daquele ano, representou um baque para os sacoleiros, que levavam mercadorias clandestinas, a pé e utilizando carros e ônibus através da Ponte Internacional da Amizade. Com 8,4 mil metros quadrados, a estrutura permitiu investigar com maior rigor os pedestres e os veículos. Tornou-se possível fiscalizar 5% das cerca de 50 mil pessoas e dos 15 mil veículos que atravessavam a ponte, que leva do Paraguai para o Brasil. A amostragem se mostrou suficiente para desestimular o crime.

Mas o contrabando reagiu rápido. Em poucas semanas, abandonou os ônibus e deixou de contratar pessoas para passar o dia indo e vindo pela ponte, com sacolas enormes de produtos contrabandeados sobre a cabeça. Desde então, a ação criminosa passou a ser distribuída por toda a extensão do rio Paraná e do lago de Itaipu. Resultado: um levantamento da Delegacia Especial de Polícia Marítima (Depom), da Polícia Federal (PF), indica que, a cada 500 metros das margens do lago, existe um ponto que permite que caminhões e caminhonetes estacionem perto da água.

Enxugando gelo

Considerando que o lago tem um total de 1.350 quilômetros de margens, a Depom estima existem aproximadamente 3 mil pontos de desembarque de armas, drogas e produtos contrabandeados, que atravessam a fronteira pelo lago, utilizando pequenas embarcações que se conectam aos veículos. “Quando o barco pequeno do contrabandista é abordado pela polícia, ele é virado, para que os agentes não possam ficar com a carga”, afirma Luciano Barros, presidente do Instituto de Desenvolvimento Econômico e Social de Fronteiras (Idesf). “Quando a carga é formada por cigarro ou eletrônicos, o contrabando se perde. Mas, quando são agrotóxicos ilegais, eles contaminam a água”.

Uma área, em especial, é estratégica, principalmente para o tráfico de drogas: ela fica entre a hidrelétrica de Itaipu e o Marco das Três Fronteiras, no ponto onde Brasil, Paraguai e Argentina se encontram. Ali, a barranca do Rio Paraná se estende por 21 quilômetros. A área é tomada por pontos de desembarque de produtos ilegais.

Todas essas clareiras, picadas e trilhas dão aos contrabandistas a capacidade de agir rápido, e em locais diferentes. Quando identificados pelos agentes policiais, esses pontos podem ser rapidamente abandonados – basta derrubar algumas árvores e abrir outro ponto de acesso ao lago. “Muitas vezes, os agentes com os quais conversamos relatam que a sensação é de enxugar gelo”, diz Luciano Barros. “A apreensão de cargas bate recorde, e tem impacto na variação do preço dos produtos revendidos no Brasil, mas não chega a ameaçar a atividade dos contrabandistas.”

De fato, a apreensão vem batendo recordes. Além disso, nas últimas duas décadas, diferentes órgãos de fiscalização, incluindo a Receita Federal e as polícias federal, militar e rodoviária, melhoraram a integração e passaram a realizar ações conjuntas. E o Exército realiza constantemente ações em larga escala.

Restrições orçamentárias

A ação mais recente foi uma nova edição da Operação Ágata, uma ação do exército que, desde 2011, atua em todos os pontos de fronteira do Brasil. Entre março e maio de 2019, o alvo foi a região Sul do país. Nessas ocasiões, o Exército leva para a região veículos blindados Guaranis, anfíbios, equipados com canhão e metralhadora e com autonomia de combustível de até 600 quilômetros. A operação contou com a parceria das polícias militar, civil, federal e rodoviária, além do corpo de bombeiros e agências fiscalizadoras estaduais e federais, como o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais (Ibama) e as receitas federal e estadual.

Ainda assim, para o monitoramento diário, o contingenciamento constante de recursos limita o número de profissionais dedicados à rotina de investigar o contrabando na região. A Polícia Federal não informa o total de pessoal dedicado à fiscalização da região, por questões estratégicas. É também o caso da Receita Federal, que explica, via assessoria de imprensa: “O número de servidores não é revelado por uma questão de estratégia institucional. Os servidores da Receita Federal que atuam diretamente na repressão ao contrabando e descaminho não estão localizados somente nas unidades de fronteira”.

A Receita Federal informa que, além das equipes nas unidades de fronteira como Foz do Iguaçu, Guaíra, Mundo Novo, Ponta Porã e Corumbá, possui equipes de repressão em lugares estratégicos por onde o contrabando pode ser escoado para o interior do país. O órgão também mantém dois helicópteros baseados em Curitiba, equipados com câmeras de longo alcance e visão noturna. Também se utiliza de veículos com tração quatro por quatro e lanchas nas unidades aduaneiras portuárias.

Mas o órgão aponta que a redução do orçamento atrapalha o trabalho: “A cada ano a falta de concursos públicos e as restrições orçamentárias impostas aos órgãos federais fazem com que as equipes venham ficando menores”.

Território desafiador

A geografia da região e a fronteira com dois países dificultam a fiscalização

  • 180 quilômetros de fronteira passam pelo rio Paraná
  • 1.350 quilômetros é a extensão total das margens do Lago de Itaipu
  • A cada 500 metros das margens existe um ponto onde é possível descarregar contrabando
  • 21 quilômetros tem a barranca do Rio Paraná em Foz do Iguaçu, um ponto estratégico para os criminosos
  • Mais de 30 diferentes quadrilhas atuam na região

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