O Brasil e o presidente Jair Bolsonaro tem muito a ganhar com a eleição do presidente do Equador, Guillermo Lasso. A vitória de um candidato direitista nas urnas equatorianas pode fortalecer não apenas as relações comerciais entre ambos os países, mas, também, a direita na América do Sul. Não à toa, Bolsonaro viajou a Quito, onde participou da solenidade de posse de Lasso.
A viagem fez parte também da estratégia do presidente da República de impulsionar a relação entre os países e o Prosul (Foro para o Progresso e Desenvolvimento do Sul). O fórum foi criado em março de 2019 para o desenvolvimento da América do Sul. O Prosul é visto como uma forma de países da região isolarem a Venezuela em contraponto à Unasul (União das Nações Sul-americanas).
Criada em 2008, quando a maioria dos países da região era governada por presidentes de centro e centro-esquerda, a Unasul foi fundada com o objetivo de aprofundar a integração regional, mas sem a influência dos Estados Unidos. Ainda em 2019, depois de tomar posse, Bolsonaro formalizou a saída do Brasil do grupo.
O que o Brasil ganha com a posse de Lasso
O Equador não é um parceiro comercial muito relevante para o Brasil. Em 2020, o país representou apenas 0,3% das nossas exportações, tendo ficado em 48º como o que mais comprou os produtos e serviços brasileiros. Já a participação nas importações brasileiras foi de 0,06%, sendo o 66º nesse quesito.
Apesar disso, interlocutores do governo afirmam à Gazeta do Povo que a eleição de Lasso pode contribuir com a ampliação das relações comerciais. "Sempre tem espaço para isso. E o presidente Guillermo tem uma política externa e um prisma eminentemente comercial", analisa um interlocutor do Palácio do Planalto.
O fato de o Brasil ser a principal economia da América Latina ajuda a despertar o interesse comercial de Lasso. "Ele tem uma visão quase empresarial de país e demonstra não querer se atar a compromissos com países que, segundo ele, não trariam vantagens", diz um assessor palaciano.
"Pelo que entendi, ele quer, se possível, buscar acordos com os Estados Unidos, a China, Coreia do Sul, o Brasil, a Índia, entre outros. Ele tem uma visão muito pragmática na relação comercial", acrescenta a fonte.
O que Bolsonaro ganha com a vitória de Lasso
Além da perspectiva de estreitar as relações comerciais, o governo entende que pode ganhar uma aliado geopolítico estratégico, até na área ambiental. "Temos interesses comuns sobre a Amazônia, afinal, o Equador tem sua fatia amazônica", justifica uma das fontes. Um dos maiores argumentos do Brasil sobre o tema é a defesa da soberania nacional brasileira sobre a floresta amazônica.
O governo acredita que será capaz de trabalhar de forma coordenada com o Equador na defesa pela democracia e livre comércio, sobretudo na Organização dos Estados Americanos (OEA). Para os governistas, há um campo muito grande para ações coordenadas entre os governos Lasso e Bolsonaro. "Vejo muito mais convergências do que eventuais divergências", pondera um interlocutor do Planalto.
Governistas também entendem que ter mais um presidente de direita na América do Sul ajuda a reequilibrar o "quadro" político no continente e, portanto, pode gerar bônus políticos para Bolsonaro. "Ter um país próximo na vizinhança que tem uma visão de mundo como a nossa é importante e positivo", diz um assessor.
Um dos aspectos em que a eleição de Lasso pode impactar positivamente sobre o governo federal é no discurso econômico. "Talvez a própria equipe econômica possa se utilizar da retórica do novo governo equatoriano para promover o livre comércio", defende o analista político Nicholas Borges, da BMJ Consultores, que atua com foco na América Latina.
O desejo de Lasso em tirar o viés ideológico da economia e promover não mais uma economia fechada, mas, sim, a abertura de mercado, é similar ao discurso da equipe econômica de Bolsonaro. É aí que o governo pode tirar frutos para as eleições de 2022, pondera Borges. "Bolsonaro ganharia mais apoio para promover a abertura do mercado através da renegociação e realização de novos acordos econômicos com os demais países", avalia.
O que o Prosul ganha com a eleição de Lasso
A eleição de Guillermo Lasso chega sete meses após a eleição do presidente da Bolívia, Luis Arce. Em outubro de 2020, a vitória do aliado do ex-presidente Evo Morales acendeu o sinal amarelo em relação ao avanço da esquerda no continente. Um ano antes, a Argentina havia elegido Alberto Fernández seu novo presidente.
É bem verdade que o avanço do progressismo na Argentina e na Bolívia veio intercalado com a vitória do então candidato de centro direita Luis Alberto Lacalle Pou no Uruguai, em novembro de 2019. Ainda assim, a eleição de Arce gerou incômodo ao governo Bolsonaro.
Muitos acreditaram que governos de direita acabariam se multiplicando na América do Sul com a vitória de Bolsonaro em 2018, e não foi isso o que aconteceu. Por isso, a vitória de Lasso é bem vista pelo presidente do Brasil sob o ponto de vista político-ideológico.
O analista político Nicholas Borges, da BMJ Consultores, acredita que até novembro deste ano Bolsonaro, Lasso e os presidentes do Chile, Sebastián Piñera, e da Colômbia, Iván Duque Márquez, se apoiem no Prosul com foco em manter a estabilidade da direita no continente.
A tendência é que o Prosul mantenha seu direcionamento acerca de medidas conjuntas em relação à pandemia, mas seja um fórum importante para o aspecto político-ideológico dos representantes. "Eles precisam desse consenso para não ter dissenso no âmbito interno e se apoiar como a América Latina se porta para estabelecer futuro mais estável para a direita em cada país", avalia Borges.
O que de fato o Prosul pode entregar
O Prosul pode ser um fórum relevante sobre o aspecto ideológico, mas pouco pode se esperar dele quanto a aspectos pragmáticos. Em 2020, com pouco mais de um ano desde a fundação, uma das poucas medidas efetivas tomadas foi o compartilhamento de informações de prevenção, facilitação do retorno de cidadãos de seus países e compras conjuntas de insumos médicos para enfrentar a Covid-19.
Na reunião de março de 2021, os membros do Prosul pediram a colaboração do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) com créditos acessíveis e taxas favoráveis em uma reunião de pouco efeito prático. Para o analista Nicholas Borges, o grupo tem ótimas intenções em relação à cooperação internacional, mas ainda é muito mais político do que pragmático.
"O Prosul tenta deixar para trás esse passado progressista [da Unasul] para dar novo ar. Tanto que, em questões econômicas, é um bloco político que tenta dinamizar a economia da América do Sul com uma visão multidimensional, um fortalecimento das questões de mercado livre, abertura econômica, mas ainda é pouco pragmático", analisa.
E mesmo o alcance político-partidário do Prosul pode ser esvaziado até 2022. Em novembro de 2021 ocorrem as eleições presidenciais do Chile. Atualmente, Piñera não aparece nem entre os três melhores colocados. O favorito é o pré-candidato comunista Daniel Jadue, que tem 20% das intenções de voto, segundo a pesquisa Plaza Pública.
Em 2022, não apenas os brasileiros irão às urnas, como também os colombianos. Bolsonaro aparece atrás nas mais diferentes pesquisas contra o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). O mesmo ocorre com Duque na Colômbia, que aparece atrás do líder das pesquisas Gustavo Petro, candidato de esquerda que fez parte da guerrilha.
Esvaziamento do Prosul pode fortalecer Mercosul
A perspectiva de que o Prosul pode ter seus efeitos político-ideológicos esvaziados a depender dos resultados das eleições no Brasil, no Chile e na Colômbia não incomoda o governo federal. A leitura feita por alguns dos interlocutores ouvidos é que o fórum não é um espaço ideológico, como a Unasul.
Os que desdenham do Prosul enquanto plataforma política entendem que o grupo é uma união informal que, na verdade, busca gerar benefícios para os países, e não promover discursos ideológicos e políticos. Inclusive, um dos assessores até entende que, sob esse aspecto, a visão do governo coincide com a de Guillermo Lasso.
"O Prosul não é sequer um agrupamento rígido com políticas antiamericanas, nacionalistas, pelo contrário. É uma convergência de interesses de países que têm visões de mundo próximas ao livre mercado, favorável à iniciativa privada, favoráveis a uma visão de mundo diferente de alguns outros países da região", sustenta a fonte.
Mesmo diante de uma possibilidade de o Prosul ser esvaziado, ainda acredita-se no governo que o fórum mantenha sua importância. Afinal, entende-se que não seja um grupo com regras específicas para fins de emissão de comunicados conjuntos.
De toda a forma, com enfraquecimento ou não do Prosul, uma leitura feita no governo é que o Brasil pode aproveitar as convergências com o Equador e procurar ampliar os acordos entre o Mercosul e o governo de Lasso. "Queremos transformar em algo mais aberto, arejado, competitivo, e isso vai na linha do Lasso", pondera um assessor do Planalto.
A festa da direita brasileira com a vitória de Trump: o que esperar a partir do resultado nos EUA
BC dá “puxão de orelha” no governo Lula e cobra compromisso com ajuste fiscal
Comparada ao grande porrete americano, caneta de Moraes é um graveto seco
Maduro abranda discurso contra os EUA e defende “novo começo” após vitória de Trump
Triângulo Mineiro investe na prospecção de talentos para impulsionar polo de inovação
Investimentos no Vale do Lítio estimulam economia da região mais pobre de Minas Gerais
Conheça o município paranaense que impulsiona a produção de mel no Brasil
Decisões de Toffoli sobre Odebrecht duram meses sem previsão de julgamento no STF