Uma emenda do senador Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE), relator da medida provisória da reforma administrativa, repercutiu negativamente no Ministério Público Federal (MPF) e na sessão da comissão mista especial que analisa a MP, nesta quarta-feira (8), no Congresso.
A emenda altera as atribuições dos auditores fiscais da Receita Federal, que passariam a ser proibidos de atuar crimes não fiscais – o que inclui, por exemplo, corrupção, lavagem de dinheiro e organização criminosa. Para a Procuradoria-Geral da República (PGR), a medida “reduz, e muito, a atuação da Receita Federal no combate à corrupção, com sérios prejuízos para o país”.
"Não faz o menor sentido um auditor, quando constata crimes que não envolvam lavagem de dinheiro, mantenha isso em segredo [...]. Está se criando uma série de entraves no que não é necessário", disse o procurador Roberson Pozzobon, da força-tarefa da Lava Jato no Paraná.
Com a emenda, o auditor que constatar qualquer tipo de irregularidade que não envolva questões fiscais só poderá fazer o compartilhamento de provas com outros órgãos mediante autorização judicial.
A MP foi assinada pelo presidente Jair Bolsonaro em janeiro e reorganizou as estruturas dos ministérios. Ela precisa ser aprovada por maioria simples no plenário da Câmara e do Senado até junho para não perder a sua validade.
Entre os parlamentares que participam da comissão, há opiniões divididas sobre o tema. O líder do PSL no Senado, Major Olímpio (SP), criticou a restrição dos trabalhos da Receita e chamou o item de "emenda Gilmar Mendes". O ministro do Supremo Tribunal Federal foi alvo de um procedimento do Fisco cujas informações sigilosas foram divulgadas. "Parece mais um jabuti colocado aqui que tira a competência da Receita Federal brasileira e é até retroativa", disse, afirmando que a mudança "fulmina" a punição a crimes como evasão de divisão e lavagem de dinheiro e que impactaria investigações já feitas e em curso.
A Câmara Criminal do MPF enviou nota técnica ao Senado nesta quarta, com entendimento contrário à emenda proposta por Bezerra Coelho. “A gente vai concordar com a opinião do Ministério Público e garantir que a Receita Federal tenha sua autonomia e que caso identifique irregularidades ela faça o comunicado”, garantiu o deputado federal Daniel Coelho (Cidadania-PE), um dos membros do colegiado.
“Eu subscrevo o relatório do senador Fernando Bezerra Coelho para que possamos aperfeiçoar e dar ritmo a administração federal”, diverge o presidente da comissão, deputado João Roma (PRB-BA). “É importante que cada entidade do poder público brasileiro exerça o seu papel, seu papel fim. E isso não impede de forma alguma o funcionamento, muito menos a apuração de qualquer medida que seja, uma vez que o que se preza aqui é a segurança jurídica e atender aos devidos processos administrativos e judiciários da forma mais perfeita”, disse, ao ser questionado sobre o tema.
Para o deputado federal Diego Garcia (Pode-PR), esse tema não deve ser discutido via medida provisória. “Eu penso que qualquer mudança desse tipo não deve ser feita neste momento. Esse é um tema que merece ser amplamente debatido e discutido no Congresso, não em uma medida provisória que está aí propondo inúmeras mudanças. Essa é uma medida polêmica que merece uma apreciação à parte”, disse.
Coaf e Funai
Além das alterações das funções da Receita Federal, a comissão especial discute se o Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), órgão de combate à lavagem de dinheiro, deve continuar sob guarda-chuva do Ministério da Justiça, ou retornar ao Ministério da Economia.
Outro ponto polêmico em discussão é o destino da Funai, que hoje está no Ministério dos Direitos Humanos. Há uma parcela dos parlamentares que defende que a Funai volte ao Ministério da Justiça. O órgão responsável pela demarcação de terras indígenas também está em discussão na votação da medida provisória.
A comissão especial vai se reunir na manhã desta quinta-feira (9) para tentar votar o relatório apresentado pelo senador Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE). Depois, precisa passar pelo plenário da Câmara e do Senado, obtendo maioria simples de votos para ser aprovada.
Votação ocorre nesta quinta-feira
A votação da medida provisória que reestrutura os ministérios foi adiada para esta quinta-feira (9). A sessão da comissão foi suspensa na tarde desta quarta por causa do início da chamada ordem do dia no plenário da Câmara, que reúne as proposições em pauta na Casa.
O relator Bezerra Coelho disse ter confiança que o texto será votado nesta quinta e rebateu as críticas sobre a mudança no escopo dos fiscais da Receita. "Não vai cair vai ser mantido, vamos dar todas as explicações e refutar todas as críticas que foram colocadas", disse.