O Supremo Tribunal Federal (STF) deu uma atenção muito maior nos últimos anos a questões de direito criminal. Foi uma reação à vasta produção de denúncias gerada pela Lava Jato. Ainda assim, os processos decorrentes da operação caminharam muito mais lentamente do que na primeira instância. E os casos analisados pelos ministros que mais chamaram atenção foram aqueles que questionavam a atuação da Lava Jato no STF; e não o julgamento em si dos acusados com foro privilegiado.
Agora, com o encerramento das forças-tarefas de Curitiba e do Rio de Janeiro, a janela de oportunidade para o STF julgar um grande volume de acusações contra políticos está se fechando.
Mesmo com o fim das duas forças-tarefas, determinado pela Procuradoria-Geral da República (PGR), ainda há muitos processos esperando julgamento do STF. Atualmente, há 31 inquéritos da Lava Jato sob a relatoria do ministro Edson Fachin, o responsável pela operação no Supremo. Além, disso há 257 processos relativos à operação.
Sete denúncias estão em fase de processamento. Três delas aguardam deliberação sobre aceitação ou rejeição; uma teve o julgamento suspenso por pedido de vista; e outras três estão em fase de notificação dos investigados.
Entre as 29 denúncias contra autoridades com foro privilegiado oferecidas pela PGR ao STF, 20 foram analisadas – 11 acabaram recebidas, oito rejeitadas e, em uma foi declarada extinta a punibilidade.
Segundo o balanço produzido por Edson Fachin, no Supremo já foram avaliados os casos de 102 acusados, com quatro condenações em 29 denúncias (veja mais números no quadro abaixo). Já a primeira instância produziu 278 condenações contra 533 acusados, envolvendo 130 denúncias.
Também chama atenção no STF o volume de investigações arquivadas, despachadas a outros ministros por falta de relação com as fraudes da Petrobras ou devolvidas à primeira instância. O Supremo chegou a ter em mãos 125 inquéritos resultantes da Lava Jato, em 2017.
Além disso, em muitos casos o julgamento demora até mesmo para começar: a denúncia contra o ex-presidente e senador Fernando Collor de Mello, por exemplo, demorou 735 dias para ser aceita. Em 2017, um dos inquéritos envolvendo o político foi arquivado por Fachin.
Quando STF condenou 1.º réu, Moro já havia sentenciado 132
Para chegar à primeira condenação na Lava Jato, o STF demorou exatos 1.183 dias – ou 39 meses. Esse foi o tempo que demorou entre o ex-procurador-geral da República Rodrigo Janot apresentar uma primeira lista de políticos suspeitos, em 3 de março de 2015, e o deputado Nelson Meurer (PP-PR) ser condenado a 13 anos e 9 meses em regime fechado – Meurer faleceu vítima de Covid-19 em julho do ano passado.
Neste mesmo período, o então juiz da 13.ª Vara Federal de Curitiba, Sergio Moro, havia condenado 132 pessoas. Ele precisou de 370 dias, do início da operação, para chegar às primeiras condenações – no caso, do doleiro Alberto Youssef e do ex-diretor de Abastecimento da Petrobras Paulo Roberto Costa. É um terço do tempo que o STF demorou para decretar a primeira condenação.
Por que os processos da Lava Jato no STF demoram tanto
De acordo com uma das edições do relatório Supremo em Números, divulgada em maio de 2019 e chamada “A realidade do Supremo criminal”, atualmente “o Supremo não se comporta como um só tribunal". “O STF é, ao mesmo tempo, uma Corte Constitucional, uma Corte Recursal e uma Corte Ordinária”, afirma o estudo.
Como Corte Constitucional, decidiu sobre questões como a proibição da criminalização da marcha da maconha, sobre a constitucionalidade da Lei Maria da Penha e da Lei de Lavagem de Capitais.
Como Corte Recursal, acolhe milhares de recursos extraordinários versando sobre questões penais, processuais penais e de execução penal, além de habeas corpus e mandados de segurança. “Alguns importantes precedentes em matéria penal foram fixados em habeas corpus e recursos em habeas corpus, impulsionados pela via larga de acesso que esses feitos parecem ter junto ao STF”, afirma o estudo, que avalia que a terceira faceta do STF, a atuação como Corte Ordinária, também se apoia principalmente nos julgamentos de habeas corpus.
Na avaliação dos pesquisadores da Fundação Getúlio Vargas (FGV), o julgamento do mensalão “contribuiu fortemente para se forjar no imaginário popular um Supremo de juízes criminais, discutindo publicamente matérias como dolo e pena”.
Com o início da Lava Jato, em 2014, o Supremo atuou como protagonista, segundo os autores do estudo: “De um lado, o envolvimento de autoridades com foro no Supremo deslocou em tempo real algumas das questões referentes à operação para o STF. Simultaneamente, pedidos de habeas corpus malsucedidos em segunda e terceira instância alcançaram rapidamente o STF e deslocaram para aquela corte algumas das discussões mais relevantes sobre os destinos da investigação”.
De fato, o número absoluto de processos penais aumentou drasticamente na última década, em especial a partir de 2015, quando a Lava Jato já se mostrava muito produtiva.
O total anual de novos processos por improbidade e criminais no STF estava em 5 mil em 2004 – era a maior marca desde a redemocratização. Desde então, ultrapassou os 10 mil em 2014 e chegou a 20 mil em 2017. Saiu de 14% da carga total em 2010 para 25% em 2017 – um ano em que 56,5% das decisões colegiadas foram proferidas em processos com assuntos penais. Deste total, os pedidos de habeas corpus respondem por 48% da pauta criminal do Supremo.
“A Lava Jato foi uma operação de grande importância, pelo número de acusados, de empresas e de partidos políticos citados, de recursos envolvidos, e o tribunal se viu na necessidade de dar maior atenção”, diz Ivar Alberto Hartmann – professor associado do Insper, ex-coordenador do Centro de Tecnologia e Sociedade da Escola de Direito da FGV do Rio e um dos autores do estudo Supremo em Números.
Ivar Alberto Hartmann afirma que a janela de oportunidade para o STF julgar os acusados pela Lava Jato. “Com o fim da [força-tarefa da] Lava Jato, (...) ao longo dos próximos dois anos, veremos uma diminuição da representatividade da pauta criminal em relação ao total de casos julgados pelo Supremo”.
A Lava Jato no STF e na 1.ª instância em números
Compare os números da primeira instância da Lava Jato com os do STF:
Mandados de busca e apreensão | 1450 | 221 |
Prisões preventivas | 132 | 12 |
Prisões temporárias | 163 | 2 |
Denúncias | 130 | 29 |
Acusados | 533 | 102 |
Condenações | 278 | 4 |
Fonte: Balanço produzido pela equipe do ministro Edson Fachin e divulgado em 05/02/2021.
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