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Julgamento em plenário

Por que o STF decidiu tirar as ações penais da Lava Jato da Segunda Turma?

Plenário do STF vai voltar a julgar ações penais e inquéritos, como os da Lava Jato, uma prerrogativa que até então era das duas turmas da Corte.
Plenário do STF vai voltar a julgar ações penais e inquéritos, como os da Lava Jato, uma prerrogativa que até então era das duas turmas da Corte. (Foto: Fellipe Sampaio/SCO/STF)

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O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu nesta quarta-feira (7) devolver ao plenário a atribuição de julgar ações penais e inquéritos que envolvam réus com foro privilegiado. A proposta foi apresentada pelo presidente da Corte, ministro Luiz Fux, e aprovada por unanimidade pelos demais magistrados. Apesar de o motivo oficial para a mudança ter sido o desafogo da pauta após a restrição da prerrogativa de foro de políticos, a alteração pode ser interpretada como uma vitória para a Lava Jato, que vinha sofrendo duras derrotas na Segunda Turma do STF, responsável por julgar os casos da operação.

Procuradores da Lava Jato no Paraná, porém, evitam comemorar a mudança por achar cedo demais. Apesar de parecer positiva em um primeiro momento, a decisão do Supremo, na avaliação de integrantes do grupo, engessa a ação penal e permite pedidos de vista intermináveis, sem prazo para retorno do julgamento. “Melhor esperar um pouco antes de comemorar”, disse um integrante da força-tarefa à Gazeta do Povo.

Fux é um dos ministros mais alinhados com a Lava Jato no STF e a mudança que o presidente do STF conseguiu emplacar nesta quarta-feira (7) é a primeira boa notícia para a força-tarefa em meses, mesmo que seja vista com ressalvas pelo grupo de Curitiba. O presidente do Supremo é o único que não participa de nenhuma das turmas e só vota em casos julgados no plenário. Com os julgamentos da Lava Jato no plenário, a operação mantém o voto de um aliado.

A operação vinha sofrendo sucessivas derrotas na Segunda Turma do STF, que até então era responsável por julgar os casos. O ministro Celso de Mello, que se aposenta na semana que vem, era um voto importante em praticamente todos os julgamentos porque ora votava a favor da Lava Jato, ora a favor dos réus. Na ausência dele, por causa de uma licença médica, muitos julgamentos terminaram empatados, o que, segundo o regimento interno, favorece os réus. 

Com a aposentadoria de Celso de Mello, quem assume o lugar dele na turma é o novo ministro indicado pelo presidente Jair Bolsonaro. Na semana passada, Bolsonaro tornou pública a escolha do desembargador Kassio Nunes Marques para a vaga, que será sabatinado no Senado — formalidade necessária antes da nomeação.

Kassio Nunes Marques é visto como um magistrado “garantista”, alinhado com as teses defendidas por Gilmar Mendes e Ricardo Lewandowski, membros da Segunda Turma e ferrenhos críticos da Lava Jato. Juntos, os três conseguiriam impor derrotas significativas nos julgamentos referentes à operação.

Mudança na regra altera correlação de forças no STF sobre a Lava Jato

A decisão de mandar para o plenário o julgamento de ações penais e inquéritos altera a correlação de forças no STF e pode beneficiar a Lava Jato. Os julgamentos de recebimento de denúncias e de políticos réus na operação tende a terminar com placares mais acirrados, com diferença de um ou dois votos.

Com a decisão no plenário, a Lava Jato ganha o reforço dos votos dos ministros da Primeira Turma, como Luís Roberto Barroso e Alexandre de Moraes, que tendem a ser mais duros com os réus. Em alguns casos, a ministra Rosa Weber também pode se alinhar aos dois. Há, ainda, os votos de Edson Fachin, relator da operação, da ministra Cármen Lúcia e do presidente Luiz Fux, que são defensores das teses da operação.

Já a ala “garantista”, que tende a ser mais crítica à Lava Jato, é composta pelos ministros Dias Toffoli, Ricardo Lewandowski, Gilmar Mendes e Marco Aurélio Mello. Essa ala deve ser reforçada com a chegada de Kassio Nunes Marques ao Supremo.

Restrição do foro privilegiado desafogou plenário do STF

O motivo exposto por Fux para promover a mudança, porém, não foi a Lava Jato, e sim a restrição ao foro privilegiado de políticos, que teria desafogado o plenário do STF.

Desde 2014, os julgamentos de ações penais eram responsabilidade das duas turmas do STF — cada uma com cinco ministros. Isso ocorreu depois do julgamento do mensalão, que envolveu 37 réus e levou 69 sessões do STF, entre agosto de 2012 e dezembro de 2013, para ser julgado. Para evitar trancar a pauta do plenário, as ações penais passaram a ser julgadas pelas turmas.

Ao propor que os casos voltem a ser analisados pelos 11 ministros, Fux argumentou que atualmente "a situação é diferente” porque já não há mais congestionamento de processos no plenário.

O número de casos penais no Supremo caiu desde 2018, quando o STF decidiu limitar a prerrogativa de foro para atos cometidos por políticos durante o mandato e em razão dele. Com isso, muitos casos foram remetidos à primeira instância.

O ministro Celso de Mello, que se aposenta na semana que vem, concordou com a mudança. “A razão básica foi o movimento excessivo de feitos. Exemplo mais recente, a ação penal 470. Levamos quase seis meses com sessões virtualmente diárias, discutindo, julgando, e comprometendo o exercício pelo tribunal de seu poder jurisdicional. Hoje, no entanto, houve redução drástica. A mim, me parece que o retorno ao plenário restabelece uma situação tradicional. Tem também a marca da racionalidade, porque agora são as turmas que estão se inviabilizando”, afirmou o decano do STF.

Mudança pode acabar com diferença de interpretações entre as Turmas

Celso de Mello também chamou a atenção para o diferente posicionamento das turmas do STF. A Primeira Turma, formada pelos ministros Alexandre de Moraes, Rosa Weber, Luís Roberto Barroso, Marco Aurélio e agora Dias Toffoli (que ocupou o lugar que era de Fux), costuma ser responsável por decisões mais duras com os réus.

Já a Segunda Turma, composta por Edson Fachin, Gilmar Mendes, Ricardo Lewandowski, Cármen Lúcia e Celso de Mello, tem imposto derrotas significativas à Lava Jato, principalmente durante a ausência do decano, que esteve em licença médica nas últimas semanas e está para se aposentar. 

Segundo Celso de Mello, “a proposta [de Fux] tem outra grande virtude que é a de evitar o dissídio jurisprudencial [decisões diferentes] entre as turmas em matéria tão sensível como é a matéria penal, que envolve a questão da liberdade individual. Porque hoje notamos que há divergências interpretativas em matéria penal e matéria processual penal entre duas turmas que compõem o STF".

Para Andrew Fernandes Farias, advogado criminalista e sócio do Bayma e Fernandes Advogados Associados, a mudança é positiva por garantir segurança jurídica aos réus. “É uma medida muito bem-vinda, porque ela preza pela segurança jurídica e pela estabilidade. O efeito principal dessa alteração regimental é que as ações penais originárias e os inquéritos daqueles que possuem foro por prerrogativa de função na Suprema Corte serão processados e julgados pelo plenário e não mais pelas turmas”. Segundo ele, isso “evita o rompimento com a isonomia”.

Segunda Turma ainda terá papel importante para a Lava Jato

Apesar da mudança no Regimento Interno da Corte, a Segunda Turma continua tendo um papel importante para os casos da Lava Jato. Isso porque apenas inquéritos e ações penais vão passar pelo crivo do plenário. Os 11 ministros vão decidir se abrem ou não ação penal contra denunciados e serão responsáveis pelos julgamentos dos réus.

Mas as turmas ainda ficam com a atribuição de julgar habeas corpus, por exemplo. O que pode significar que prisões decretadas pela Lava Jato podem durar pouco, por causa da composição do colegiado e já que haverá um desafogo na pauta do colegiado.

“Regra geral, aqueles processos que chegarem ao Supremo Tribunal Federal via recurso, por exemplo o extraordinário, que saiam da primeira ou da segunda instância e cheguem ao STF, regra geral, vão continuar sendo julgados pelas turmas”, explica Farias.

A Segunda Turma também vai ter um papel importante na definição do futuro político do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Os ministros devem julgar um habeas corpus no qual o petista pede a suspeição do ex-juiz federal Sergio Moro para julgá-lo.

“A suspeição do ex-juiz Sergio Moro não será julgada no plenário, por não se tratar de ação penal originária no STF, que trata de processo contra pessoas detentoras de prerrogativa de função. Portanto, o julgamento deve ocorrer na 2º Turma, caso não seja afetada ao plenário pelo relator, o que não parece ser o caso”, explica Thiago Turbay, advogado criminalista sócio do Boaventura Turbay Advogados.

A defesa de Lula argumenta que Moro foi parcial e agiu politicamente contra Lula e pede a anulação da sentença proferida pelo ex-juiz no caso do tríplex no Guarujá. Os advogados também querem que os ministros estendam a decisão para anular a sentença do caso do sítio em Atibaia, que foi proferida pela juíza Gabriela Hardt, mas cujo processo foi conduzido por Moro.

Se os ministros atenderem ao pedido da defesa e as sentenças forem anuladas, Lula pode voltar a concorrer em eleições, já que deixaria de ser ficha suja. Cármen Lúcia e Edson Fachin já votaram contra a concessão do HC. O ministro Gilmar Mendes pediu vista (mais tempo para analisar o caso) e pode devolver o recurso para julgamento a qualquer momento. A tendência é que ele e Lewandowski votem a favor de Lula. Se o caso terminar empatado, as sentenças serão anuladas.

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