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A encruzilhada de Bolsonaro: prazo para vetar lei do abuso de autoridade acaba em 3 dias

Bolsonaro pode se indispor tanto com o Congresso quanto com sua base eleitoral por causa da lei de abuso de autoridade.
Bolsonaro pode se indispor tanto com o Congresso quanto com sua base eleitoral por causa da lei de abuso de autoridade. (Foto: Evaristo Sa/AFP)

O prazo para que Jair Bolsonaro (PSL) decida sobre vetos à lei de abuso de autoridade termina nesta quinta-feira (5) e coloca o presidente em uma encruzilhada. Se vetar artigos demais, pode arrumar problemas na articulação com o Congresso. Se vetar de menos ou não vetar, vai se indispor com parte de sua base eleitoral e o ministro da Justiça, Sergio Moro, nome mais popular do governo.

O dilema foi bem explicado na semana passada pela deputada Joice Hasselmann (PSL-SP), líder do governo no Congresso, depois de uma reunião sobre o tema no Palácio do Planalto: “ao final da reunião, o presidente até disse: ‘Olha, estou ali, entre a cruz e a espada, porque, se eu vetar tudo, crio um problema com parte do Congresso e, obviamente, a população vai aplaudir. Se eu não vetar nada, crio um problema com a população’. Ele não adiantou o que vai vetar, mas nós sabemos que ele vai vetar alguns pontos ali”, disse a deputada.

Apesar de ter afirmado a jornalistas nesta segunda-feira (2) que pretende vetar nove dos 44 artigos do projeto, líderes do Congresso ainda tentam negociar a manutenção da maior parte do texto. O relator do projeto na Câmara, Ricardo Barros (PP-PR), disse que acredita que os colegas vão conseguir convencer Bolsonaro a vetar apenas um dos artigos, o que trata do uso de algemas.

“Nosso esforço é para que o presidente não vete além das algemas, que foi o acordado”, disse Barros. “No momento nosso esforço é convencê-lo a não vetar [outros artigos] e está indo muito bem, obrigado”, acrescentou.

Inicialmente, houve um acordo entre líderes do Congresso para aprovar o projeto da forma como veio do Senado, para evitar que o texto precisasse passar novamente pelo crivo dos senadores. Para isso, o acordo era que o presidente vetaria o ponto mais polêmico, que prevê punição para policiais que utilizarem algemas em presos sem necessidade. O PSL, partido do presidente, assinou o requerimento de urgência para votação da proposta, não pediu votação nominal e não obstruiu a votação.

“Como houve uma votação sem verificação na Câmara, uma votação por acordo de todos os líderes, não vejo muito espaço para essas divergências”, disse Barros. “Isso é o cumprimento do acordado, que a gente espera sempre que aconteça na política. A política é o fio do bigode. Então a gente vai procurar trabalhar nisso”, acrescentou o deputado.

Se pesar a mão no veto, Bolsonaro pode sofrer mais uma derrota no Congresso, onde a relação com o governo nunca foi das melhores. Na semana passada, o Congresso derrubou um veto do presidente na lei que atualiza o Código Eleitoral e estabelece penas mais duras para quem propaga fake news. O veto foi derrubado por 326 deputados e 48 senadores.

Pressão por e contra vetos na lei de abuso de autoridade

Depois que o projeto chegou à mesa de Bolsonaro, o presidente vem sofrendo pressão por parte de parlamentares – especialmente da bancada da bala –, policiais, juízes e membros do Ministério Público para vetar a maior parte dos artigos aprovados no Congresso. Ex-juiz da Lava Jato, Sergio Moro elaborou um parecer pedindo veto em nove artigos do texto.

O ministro e o presidente passaram por um momento tenso nas últimas semanas. A Polícia Federal, que é subordinada a Moro, esteve no centro da crise depois que Bolsonaro anunciou a exoneração do superintendente da PF no Rio de Janeiro, Ricardo Saadi e deu a entender que ele mesmo escolheria o sucessor. A cúpula da PF reagiu, e o presidente, insatisfeito, ameaçou demitir o diretor-geral Maurício Valeixo, nomeado por Moro.

O presidente também tem se afastado cada vez mais da pauta anticorrupção, a principal bandeira de Moro. Além das ingerências na PF, Bolsonaro promoveu mudanças no Coaf – órgão responsável por identificar atividades financeiras suspeitas –, que passou a ser vinculado ao Banco Central e a se chamar Unidade de Inteligência Financeira, e ameaça fazer mudanças na Receita Federal. As três instituições – PF, Coaf (agora UIF) e Receita – são importantes órgão de investigação e controle, que atuam no combate à corrupção.

Na semana passada, Moro e Bolsonaro parecem ter se reconciliado. Durante um evento no Palácio do Planalto, Bolsonaro fez questão de aparecer sorrindo ao lado do ministro e de tecer elogios a Moro. O presidente chegou a chamá-lo de patrimônio brasileiro durante um discurso.

O projeto de lei de abuso de autoridade é um tema caro ao ministro da Justiça. Quando era juiz, em 2017, Moro chegou a ir ao Congresso para tratar do projeto, que tramitava no Senado. Tanto Moro quanto os demais membros da Lava Jato são contra o projeto.

Motivações pessoais?

Na manhã desta segunda-feira (2), ao deixar o Palácio da Alvorada, Bolsonaro comentou sobre possíveis vetos ao projeto e disse que já foi vítima de abusos do MP. "O Ministério Público, em muitas oportunidades, abusa. Eu sou uma vítima. Respondi tantos processos no Supremo [Tribunal Federal] por abuso de autoridade, isso não pode acontecer. O MP – grande parte [dos procuradores] – são responsáveis, mas individualmente alguns abusam disso aí", disse o presidente.

Em outras ocasiões, Bolsonaro reclamou de perseguição do Ministério Público. Para o presidente, o MP persegue seu filho, o senador Flávio Bolsonaro, para atingir o governo. O filho do presidente é investigado no Rio de Janeiro pela suposta prática de "rachadinha" – quando os funcionários do gabinete devolvem parte do salário ao deputado – na Assembleia Legislativa do estado, onde era deputado estadual.

A investigação começou a partir de movimentações suspeitas encontradas pelo Coaf nas contas de um dos assessores do gabinete de Flávio. Recentemente, Bolsonaro retirou o órgão do Ministério da Economia e mandou para o Banco Central, além de trocar o comando do órgão.

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