O clima no Congresso Nacional na última quarta-feira (2) era de ansiedade. Deputados e senadores se reuniram para, entre outros deveres, avaliar vetos do presidente Jair Bolsonaro (PSL) a diferentes leis aprovadas pelo Parlamento. Havia expectativa principalmente em torno dos vetos à lei da minirreforma partidária. Entendia-se que, se o Congresso não deliberasse os vetos naquela noite, os termos da lei não mais poderiam ser alterados a ponto de valerem para a eleição de 2020.
Ou seja: tópicos como o retorno da propaganda partidária semestral, o pagamento de multas com recursos do fundo partidário e, principalmente, o aumento das verbas do fundo eleitoral estariam definitivamente descartados para o ano que vem.
Mas a sessão acabou sem a análise dos vetos à lei eleitoral e achou-se, então, que o assunto estava consolidado. Mas, pouco após o término dos trabalhos, a assessoria do presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), divulgou um entendimento de que apenas um dos vetos de Bolsonaro dizia respeito a regras especificamente eleitorais, o que abordava os prazos de inelegibilidade.
Nos dias seguintes, Alcolumbre reforçou o posicionamento. Disse que é preciso se fazer uma distinção entre dois campos: o eleitoral, que é onde se aplica a regra da anualidade (a que determina que mudanças devem ser implantadas no mínimo um ano antes da eleição) e o partidário. E que, na esfera partidária, as mudanças podem ainda ocorrer a tempo de valerem para o ano que vem. A sessão do Congresso convocada para esta terça-feira (8) deve ter a análise dos vetos e uma decisão, no âmbito do Legislativo, sobre o assunto. Para que os vetos caiam, precisam ser rejeitados pela maioria dos deputados federais e dos senadores.
A postura do presidente do Senado, porém, não foi recebida com aprovação unânime. Alguns parlamentares se queixaram da movimentação, considerada por eles uma manobra de Alcolumbre. Também entre juristas a questão não é consensual: a distinção de "partidário" e "eleitoral" pode não ser tão nítida como quer fazer valer, neste caso, o presidente do Senado. Em meio às indefinições, já se fala que a questão pode acabar no Judiciário e ser resolvida apenas no próximo ano.
Caminhos do "tapetão" para lei eleitoral
O advogado Alessandro Costa, professor de Direito Eleitoral da Universidade Católica de Brasília, explica que o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e o Supremo Tribunal Federal (STF) podem ser acionados para decidir sobre a validade das normas – caso haja a derrubada dos vetos – em 2020.
"É possível que o STF seja acionado para discutir se a lei, como um todo, é constitucional. Ou mesmo que alguém faça uma consulta ao TSE para pedir a interpretação do tribunal sobre uma eventual elevação nos recursos do fundo eleitoral. As celeumas são resolvidas, em última análise, pelo STF, mas é habitual antes ocorrer um posicionamento do TSE", apontou.
Costa tem entendimento semelhante ao de Alcolumbre: para o advogado, o único trecho dos vetos em que indiscutivelmente se aplica a anualidade é o dos prazos de inelegibilidade. "Em relação ao fundo eleitoral, por exemplo, precisamos levar em conta de que o Congresso já aprovou o teto de gastos para a eleição do ano que vem. É isso que diz respeito especificamente ao período eleitoral. Por isso que, a meu ver, a questão do fundo não se encaixa neste debate", declarou.
"Perderam e mudaram a regra do jogo"
O senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE) disse que o posicionamento de Alcolumbre sobre a possibilidade de as regras partidárias da lei eleitoral valerem em 2020 mesmo sem a votação dos vetos foi algo que pegou os demais parlamentares de surpresa. "Isso não foi falado a nós em nenhum momento", disse.
Segundo Vieira, a manifestação de Alcolumbre foi ainda mais surpreendente porque houve indicações, por parte da direção do Senado, de que a votação precisaria ser concluída, em virtude da anualidade.
O parlamentar criticou também a Câmara dos Deputados pela proposição do texto mais favorável aos partidos. "Nós [Senado] aprovamos apenas um substitutivo, sem aqueles termos mais complicados. Mas o Rodrigo Maia [presidente da Câmara] fez uma manobra e trouxe os temas controversos de volta. Aí eles se programaram para derrubar os vetos e, quando viram que não conseguiriam, anunciaram que não precisariam mais. A sensação que fica é que eles perderam e depois mudaram a regra do jogo", afirmou.
Alcolumbre disse que o entendimento de que apenas à questão da inelegibilidade se aplicaria a regra da anualidade foi pautada por "estudos da equipe técnica" do Congresso. A Gazeta do Povo solicitou à Presidência do Senado acesso a estes estudos, mas não obteve retorno.
"Veta Bolsonaro" versus "Engaveta Bolsonaro"
O debate em torno da minirreforma partidária fugiu das regras habituais também nas esferas de mobilização das redes sociais. Parte dos apoiadores de Bolsonaro, que geralmente demandam ao presidente vetos a projetos aprovados pelo Congresso, passaram a pedir que o chefe do Executivo não vetasse a legislação, e sim que deixasse de analisá-la com rapidez.
Isso justamente por conta das regras de anualidade. Como havia o entendimento de que todas as normas teriam que ser modificadas até os primeiros dias de outubro, os defensores do presidente temiam que os vetos fossem derrubados às pressas pelos parlamentares. Com este cenário, o slogan "veta Bolsonaro", que ganhou corpo à época das discussões da lei sobre abuso de autoridade, acabou dando espaço ao "engaveta Bolsonaro" – ou seja, um clamor para que Bolsonaro deixasse o projeto de lado.
A mobilização não surtiu efeito. O Palácio do Planalto recebeu a legislação no dia 24 de setembro e Bolsonaro emitiu os vetos no dia 27 do mesmo mês. Segundo levantamento do portal UOL, os vetos fugiram da regra da atual gestão. O presidente tem levado, em média, 15 dias para se pronunciar sobre as leis aprovadas pelo Legislativo.
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