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Guerra no Oriente Médio

Liderança no Conselho de Segurança da ONU não fará Brasil relevante na guerra entre Israel e Hamas

O Itamaraty, sob a gestão de Lula, não mencionou o Hamas em nenhum momento, tão pouco se referiu a ele como grupo terrorista (Foto: Ricardo Stuckert/Presidência da República)

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Ao assumir a presidência do Conselho de Segurança das Nações Unidas (ONU), em 1º de outubro, o Brasil passou a ser responsável por tentar mediar conflitos internacionais e propor soluções pacíficas para eventuais contendas. Na prática, o país tem o poder de pautar resoluções e convocar reuniões de emergência. Com a guerra entre o Estado de Israel e o grupo terrorista Hamas, porém, essa posição de liderança pode ser pouco eficiente para apaziguar os ânimos no Oriente Médio. Especialistas afirmam que o poder limitado - político, econômico e militar - e o fato de a diplomacia habitualmente evitar se comprometer com um dos lados são aspectos que fazem do Brasil pouco relevante em relação a uma eventual solução para o conflito.

Na avaliação do cientista político Antonio Henrique Lucena, professor da Universidade Católica de Pernambuco (Unicap), a influência do Brasil na condução do órgão, em meio à guerra entre Israel e Hamas, é limitada pelo poderio militar que o país representa frente a outras potências, como Estados Unidos, França e Inglaterra.

“O Brasil pode exercer, sim, um determinado grau de influência em prol da diplomacia. Mas, pela característica de ser uma potência média, o nosso país tem poucos recursos de poder e, principalmente, de instrumentos de política externa para impor algum determinado tipo de decisão”, disse o professor.

Lucena também explica que a posição da diplomacia brasileira em relação a conflitos também é decisiva na forma como o Brasil se comporta no conselho. “Historicamente, a política externa brasileira não é de acatar ou de impor sanções. Porque, pelo entendimento interno, seria colocar o país contra a parede. O Brasil tem interesses econômicos com os países árabes e também com Israel. Com os árabes, no campo da exportação de commodities. Já com Israel, na importação de tecnologia, principalmente tecnologia militar”, acrescentou.

Seguindo a mesma linha, o cientista político Elton Gomes, professor da Universidade Federal do Piauí (UFPI), também ressaltou que a falta de poder político e econômico do Brasil impede que o país tenha maior influência sobre as decisões do colegiado que preside.

“O Brasil procura se mostrar como um país viável no que se refere à liderança no cenário internacional. O país participou de várias missões de paz chanceladas pelas Nações Unidas justamente para poder mostrar alguma capacidade de intervenção e capacidade de atuação em conflitos internacionais. Mas a evolução do Brasil dentro do Conselho de Segurança da ONU não se concretizou [devido à] falta de poder concreto – político e econômico – e por conta dos interesses dos países que possuem assentos permanentes em não mudarem o status quo”, afirmou.

Além disso, para Gomes, o pragmatismo adotado pela política externa brasileira coloca o país em situações difíceis quando se trata de assumir um lado em qualquer disputa internacional.

“O Brasil tem uma diplomacia de comércio. O alfa e o ômega da diplomacia brasileira é o comércio exterior. Quem segue pelo pragmatismo das relações comerciais não pode se dar o luxo de ter aliados incondicionais e nem inimigos declarados. O Brasil seguiu esse parâmetro durante e depois da Guerra Fria”, explicou.

O Conselho de Segurança se reuniu a portas fechadas, neste domingo (8), em Nova York, para debater o assunto. No entanto, não houve consenso entre os embaixadores sobre as medidas a serem tomadas pela organização.

Criado em 1945, o órgão é composto por 15 membros, sendo cinco permanentes e dez rotativos. Atualmente, ocupam as vagas rotativas Brasil, Albânia, Equador, Emirados Árabes, Gabão, Gana, Japão, Malta, Moçambique e Suíça. O mandato desses países vai até dezembro.

É a segunda vez no atual biênio que o Brasil estará na presidência do órgão - a primeira ocorreu em julho de 2022. Desde a criação do conselho, esse é o 11º mandato brasileiro. Há décadas, o país luta para reformar a atual estrutura do conselho e adquirir um assento permanente.

Itamaraty de Lula não mencionou Hamas como grupo terrorista

A posição do Brasil no sábado (7) foi de condenar os bombardeios contra Israel. No entanto, o Itamaraty, sob a gestão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), não mencionou o Hamas em nenhum momento, tão pouco se referiu a ele como grupo terrorista, e se limitou a citar a Faixa de Gaza. "O governo brasileiro condena a série de bombardeios e ataques terrestres realizados hoje em Israel a partir da Faixa de Gaza", diz a nota.

Matéria da Gazeta do Povo mostrou que o Brasil está entre os países do mundo que não consideram o Hamas uma organização terrorista. Essa posição oficial, compartilhada com África do Sul, Rússia e Noruega, além da própria Organização das Nações Unidas (ONU), contrasta com a visão dos Estados Unidos e da União Europeia.

A explicação está na alegada neutralidade brasileira em conflitos internacionais, combinada com o atual engajamento diplomático pela busca da convivência de Israel com um Estado palestino independente, sem levar em conta a escalada de atos criminosos que pesam sobre essa questão. Ou seja, o Brasil é partidário da solução de dois Estados, um israelense e um palestino. Hoje não há Estado palestino formal.

Para o cientista político Thales Castro, docente na Universidade Católica de Pernambuco (Unicap), a postura do Brasil - somada ao fato de que o país preside o Conselho de Segurança - pode abalar as relações externas com outros países.

“A partir dos ataques sorrateiros e absolutamente covardes por parte do Hamas, o Brasil tem o poder de pautar resoluções e convocar reuniões de emergência. Esse é um poder importante. No entanto, não exerce o veto. O fato do Brasil não considerar o Hamas um grupo terrorista, é algo muito danoso para a relação com os demais países, como os Estados Unidos e os da União Europeia”, disse Castro.

A posição do Itamaraty contradiz a própria legislação do Brasil, que exige a presença simultânea de três requisitos para que um ato seja classificado como terrorismo: uma ação contra a vida, integridade física ou espaços públicos; motivação baseada em razões xenofóbicas ou discriminatórias relacionadas a raça, cor, etnia e religião; e, por último, o objetivo de causar terror social ou generalizado. Apesar dessa legislação, o Ministério das Relações Exteriores não menciona os aspectos terroristas do maior ataque que Israel enfrentou nos últimos 50 anos, e que levou à declaração de guerra formal por parte do governo israelense.

Sobre a Rússia, Castro explica que a aproximação do Brasil com o país governado por Vladimir Putin vai contra a defesa do direito internacional adotada na nossa política externa.

“O Brasil tem demonstrado muita inclinação ao eixo Sino-Russo. No caso da China, ela se encontra mais distante nesse cenário. Mas no caso da Rússia, em particular, traz muitos danos colaterais para o exercício que o Itamaraty tem, que é a defesa intransigente do direito internacional e defesa da diplomacia multilateral", afirmou.

Brasil e Irã: uma relação antiga

A postura do governo brasileiro em não denunciar o Hamas como entidade terrorista também tem laços na relação entre Brasil e Irã fomentada no segundo mandato de Lula. Em 2009, o então presidente do Irã, Mahmoud Ahmadinejad, visitou o Brasil com o intuito de furar o bloqueio comercial imposto pelos Estados Unidos devido ao programa nuclear iraniano.

A entrada do Irã no Brics, programada para 2024, também é outro fator utilizado pelo governo brasileiro para não condenar o Hamas, já que o grupo terrorista é financiado pelo governo iraniano.

“Como temos o BRICS ampliado, incluindo o Irã e outras nações, sem dúvidas isso impacta o Brasil. Nossa diplomacia foca muito nas suas relações comerciais e fica muito melindrada em condenar A, B, C ou D. Até porque também o Brasil pode sofrer algum tipo de retaliação nesse sentido”, afirmou Thales Castro.

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