Encontre matérias e conteúdos da Gazeta do Povo
Eleição na Câmara

O “carômetro” de Arthur Lira: os bastidores de como o PSL deixou de apoiar Baleia Rossi

Como Arthur Lira tirou o PSL de Baleia Rossi e levou sigla a apoiá-lo
Filipe Barros (PSL-PR) cumprimenta Arthur Lira (PP-AL) no lançamento de sua candidatura à presidência da Câmara. (Foto: Laycer Tomaz/Câmara dos Deputados)

Ouça este conteúdo

A maioria dos deputados do PSL diz que o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), não os conhece. E esse foi o diferencial de Arthur Lira (PP-AL) – saber quem é quem na bancada do partido e o que cada um quer – que o fez tirar a legenda do bloco de apoio a Baleia Rossi (MDB-SP), aliado de Maia. Para conquistar a aliança com o PSL na disputa pelo comando da Casa, Lira contou com uma ajuda fundamental: o "carômetro" – uma espécie de "cola", um documento com a foto de cada deputado do partido, os nomes, os perfis deles e a agenda que eles defendem.

Com o “carômetro” em mãos, Lira passou a conhecer melhor um por um os deputados do PSL. Assim, ele iniciou ainda em dezembro uma articulação que pode ser peça-chave para uma possível vitória na eleição de 1.º de fevereiro.

“Se botar o Rodrigo [Maia] na frente de 100 deputados, ele não sabe o nome dos 100 deputados. O Arthur sabe. E, mais do que isso, sabe qual é a sua pauta, qual é a minha pauta”, diz o deputado Filipe Barros (PSL-PR), que ajudou Lira a conquistar o PSL.

Dos 53 deputados do PSL, 36 assinaram a lista que confirmou o desembarque do partido do bloco de Baleia Rossi. O PSL, que rachou em duas alas – uma ligada ao presidente Jair Bolsonaro e outra ao presidente da sigla, Luciano Bivar – oficialmente fazia parte do grupo de apoio do candidato do MDB.

Para entrar oficialmente em um bloco, metade dos deputados de uma legenda devem ser favoráveis. No caso do PSL, que tem 53 deputados – dos quais 17 estão suspensos das atividades partidárias, a chamada ala “bolsonarista” –, a maioria para apoiar um candidato tinha de ser de 35 parlamentares, e não 27.

Eduardo Bolsonaro e Barros, os contatos-chave

Barros é um dos deputados suspensos do PSL. De seu gabinete, ele explicou à Gazeta do Povo os bastidores que levaram à saída do partido bloco de Baleia Rossi.

As conversas com Lira começaram em dezembro, às vésperas do Natal. O candidato do PP procurou o deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) para iniciar as articulações. Ao filho do presidente Jair Bolsonaro – que já o apoiava –, Lira pediu ajuda para "mapear" todos os 53 deputados do PSL e saber com quais parlamentares ele poderia contar.

De Eduardo, Lira ouviu que Filipe Barros poderia entregar a ele o "mapeamento". “O Arthur me ligou e chamou ao gabinete da liderança do PP. Lá, a secretária dele imprimiu um ‘carômetro’, com todos os deputados do PSL. E fomos traçando uma biografia de um por um para ele próprio saber como abordá-los”, explica o deputado paranaense. “O Arthur conhecia os nomes, mas não conhecia a fundo quais pautas cada um defende. E isso faz toda a diferença.”

Com o “carômetro”, o candidato do Planalto à presidência da Câmara passou a conhecer, por exemplo, se um deputado do PSL era mais “municipalista” (ou seja, se faz um trabalho de base junto com prefeitos e vereadores) ou um parlamentar mais de “palanque” (que prefere usar a tribuna e ter assento em comissões).

Àquela época, em dezembro, Lira ouviu de Barros que ele teria 25 votos do PSL – dos quais os 17 parlamentares suspensos. Era um número insuficiente para rachar o bloco de Baleia Rossi.

O auxílio de Filipe Barros deu a Lira as informações necessárias para procurar os deputados, incluindo os que estavam com Baleia Rossi. O líder do Centrão procurou pessoalmente quem estava em Brasília. E fez reuniões em seu gabinete. Os que estavam em suas bases eleitorais, Lira falou por telefone.

Da deputada Bia Kicis (PSL-DF), por exemplo, ouviu o desejo de destravar a tramitação da PEC que prevê a volta do voto impresso para auditar a votação eletrônica nas eleições. Da deputada Aline Sleutjes (PSL-PR), ouviu que ela é uma “municipalista” ligada ao agronegócio e, portanto, pode ganhar a relatoria de um projeto de lei do setor – o que, para Aline Sleutjes, poderia ser mais importante do que ganhar algum cargo numa comissão.

Lira antecipou articulação e fechou embarque do PSL antes do previsto

As conversas entre Arthur Lira e Filipe Barros ao fim de dezembro foram tratadas com sigilo. O risco de vazar algo para a imprensa e dar tempo à Executiva Nacional do PSL tomar as medidas para impedir o desembarque era o maior temor. Para evitar surpresas, Barros sugeriu deixar para fazer as articulações na segunda quinzena de janeiro. Lira, contudo, assumiu os riscos e antecipou o movimento.

Ainda nos primeiros dias de janeiro, Lira comunicou Filipe Barros que havia pedido para o deputado Vitor Hugo (PSL-GO), ex-líder do governo na Câmara, fazer uma lista virtual, não física, e protocolá-la no sistema da Câmara para coletar as assinaturas para o desembarque do partido do bloco de Baleia Rossi. “Ele disse que precisaria da adesão do PSL ‘agora’, e não na segunda quinzena [de janeiro]”, explica Barros.

De férias, Barros participou das articulações. Ligou para os deputados do PSL mais próximos a ele avisando que Vitor Hugo, que estava em Brasília, entraria em contato para montar a lista o quanto antes. “Deu 10 minutos e o Vitor [Hugo] me ligou: ‘Filipe, acabei de fazer o requerimento’. Respondi: ‘irmão, não estou em Brasília, fala o que precisa que eu ajudo”, conta o deputado paranaense.

Uma das principais urgências de Vitor Hugo era obter a assinatura virtual de Eduardo Bolsonaro, que estava de férias nos Estados Unidos. As dificuldades em contatá-lo levaram Barros a entrar procurar a assessoria de Eduardo, que, por sua vez, conseguiu a rubrica virtual. Dali, Vitor Hugo deu seguimento às articulações. E, em 7 de janeiro, eles tinham 32 assinaturas.

Como Lira mexeu os “pauzinhos” na cúpula da Câmara para conquistar o PSL

A coleta de assinaturas foi importante, mas foi apenas um dos passos que desencadeou a saída do PSL do bloco de Baleia Rossi.

Com as 32 rubricas favoráveis, Lira colocou o deputado Luís Tibé (Avante-MG), coordenador-geral de sua campanha e titular da Procuradoria Parlamentar da Câmara, para fazer um parecer em defesa da validação das assinaturas de deputados suspensos. Em sua argumentação, Tibé defendeu que não se pode tirar prerrogativas parlamentares estipuladas na própria Constituição por uma decisão interna corporis de um partido político.

Quando os 17 deputados do PSL foram suspensos pela Executiva Nacional, em março de 2020, o governo não tinha iniciado sua composição de forças na Câmara com o Centrão, liderado por Arthur Lira, algo que aconteceria apenas em abril. Minados internamente e sem apoio político, os deputados “bolsonaristas” nem sequer chegaram a contestar a suspensão. “Acho até que a gente poderia ter contestado, mas já foi. Naquele momento, entendemos que não seria prudente fazermos isso, porque cairia no STF [Supremo Tribunal Federal]”, justifica Filipe Barros.

Agora, em 2021, apoiados pela estrutura política de Lira, os “bolsonaristas” do PSL ganharam apoio para contestar a suspensão. O parecer de Tibé sustenta que uma suspensão partidária não tem validade para prerrogativas parlamentares, apenas exclusivamente dentro do partido, como impedir que os deputados punidos não tenham voto em uma convenção da legenda, por exemplo.

Com a lista e o parecer da procuradoria, Vitor Hugo ingressou com um pedido na Mesa Diretora da Câmara pleiteando que os votos dos deputados suspensos fossem válidos para formalização de blocos partidários. O processo foi analisado na segunda-feira (18), mas o presidente nacional do PSL, Luciano Bivar (PE), que é 2.º vice-presidente da Câmara e tem assento na Mesa, pediu vista do processo.

Lira voltou ao “carômetro” para virar o jogo

Àquela altura, todos os esforços para tirar o PSL do bloco de Baleia Rossi pareciam perdidos. Afinal, um pedido de vista da Mesa – que foi concedido por Rodrigo Maia – dura duas sessões ordinárias. Ou seja, só seria analisado depois das eleições, já que a Câmara está atualmente no recesso parlamentar.

Mas Lira não desistiu de aplicar uma derrota à Maia e Rossi. Ele voltou ao seu “carômetro”, reanalisou os perfis, calculou de onde poderia virar os votos restantes, fez novas ligações e, enfim, obteve mais quatro rubricas – necessárias para vencer a batalha.

Quem assinou nessa última fase a adesão ao bloco de Lira foram os deputados Charles Evangelista (PSL-MG), Luiz Lima (PSL-RJ), Nicoletti (PSL-RR) e Delegado Pablo (PSL-AM).

Com as 36 rubricas, Lira e Vitor Hugo, enfim, deram entrada a um novo pedido na Mesa Diretora, fazendo com que o processo anterior perdesse objeto. Afinal, com a maioria, a legenda conseguiria sair do bloco de Baleia Rossi, quer a Mesa considerasse as assinaturas válidas ou não.

Na terça-feira (19), a Mesa Diretora da Câmara acatou, por maioria, a lista do PSL. Foram três votos favoráveis e dois contrários. A articulação de Lira na Mesa foi chancelada por três aliados: Marcos Pereira (Republicanos-SP), 1.º vice-presidente da Casa; Soraya Santos (PL-RJ), 1.ª Secretária; e Expedito Netto (PSD-RO), o 3.º Secretário.

“Na segunda-feira à noite, quando o Arthur estava em Curitiba, ele me disse: ‘Vamos ter surpresa, Filipe’. Ele já tinha conseguido os quatro votos. Na terça-feira, na hora do almoço, ele falou: ‘Deu certo'.”, relata Filipe Barros.

Mais cargos, além de votos: o que motivou a busca pelo PSL

A busca incessante de Arthur Lira para levar o PSL ao seu bloco tem um motivo mais profundo do que apenas tirar votos de Baleia Rossi.

O trabalho de trazer a legenda se deve ao fato de que, quanto maior o bloco partidário, mais assentos na Mesa Diretora o partido pode ter. Ou seja, Lira eventualmente até poderia vencer a eleição sem contar formalmente com o PSL, mas tendo os votos dos dissidentes. Ainda assim, poderia não ter tantos aliados na Mesa quanto vai ter com o partido formalmente incorporado em seu bloco.

Hoje, com 242 deputados em um bloco com 11 partidos, mais do que Baleia Rossi, Lira terá poder para pleitear mais assentos na Mesa que o emedebista. Contudo, todos os cargos são eleitos por voto e candidaturas avulsas são válidas, o que, sem acordo, não garante a vitória do maior bloco. De toda forma, o líder do Centrão está confiante de que vai conquistar a maioria das cadeiras.

Um bloco maior não apenas favorece a disputa por assentos na Mesa Diretora. Também confere mais cargos para o presidente eleito repartir entre os partidos aliados. Dentre esses cargos destacam-se a Procuradoria e a Corregedoria Parlamentar, o Conselho de Ética, a Diretoria-Geral e as secretarias de Relações Internacionais, da Mulher, de Comunicação Social, de Transparência, de Mídias Digitais, da Juventude, e a Secretaria-Geral da Mesa.

Além disso, há também as comissões permanentes. Embora suas ocupações sejam estipuladas com base na proporção de deputados de cada partido no início do mandato, Lira poderá acomodar aliados nas presidências dos colegiados caso vença as eleições. Quem escolhe os presidentes das comissões é o presidente da Casa.

Os espaços a serem ocupados em caso de vitória de Lira ainda serão acertados em acordo com os líderes e presidentes dos partidos que o apoiam. Ele já disse que o deputado Marcelo Ramos (PL-AM) será seu indicado à 1.º vice-presidência. Mas as outras indicações ainda não estão fechadas. “Tudo vai ser costurado na última semana de janeiro”, diz Filipe Barros.

Use este espaço apenas para a comunicação de erros

Principais Manchetes

Receba nossas notícias NO CELULAR

WhatsappTelegram

WHATSAPP: As regras de privacidade dos grupos são definidas pelo WhatsApp. Ao entrar, seu número pode ser visto por outros integrantes do grupo.