Os presidentes da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), terão de lidar com as pressões de empresários e oposição contra a MP do Fim do Mundo.| Foto: Fotográfo/Agência Brasil
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A edição pelo governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) da medida provisória visando compensar mais de R$ 25 bilhões em receitas perdidas pela desoneração de 17 setores da economia e de milhares de municípios - a chamada "MP do Fim do Mundo" - desafia os presidentes do Legislativo, Arthur Lira (PP-AL), da Câmara, e Rodrigo Pacheco (PSD-MG), do Senado, a tomarem posição clara.

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Mas seja a simples rejeição da MP 1227/2024 ou a busca de alternativa negociada com o ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT), a postura a ser adotada já tem como pano de fundo o Supremo Tribunal Federal (STF), acionado a arbitrar sobre o tema que provocou forte reação.

A MP editada na última terça-feira (4), e que entrou em vigor imediatamente, limita o uso de créditos do PIS/Cofins para abatimento de outros tributos e proíbe o ressarcimento em dinheiro do crédito presumido.

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Os créditos de PIS/Cofins são um benefício fiscal concedido para fomentar algumas atividades econômicas e mitigar o efeito cumulativo dos impostos. Ou seja, quando uma empresa compra um insumo para produzir um produto ou prestar um serviço, ela paga um imposto. Como ela vai usar para fazer outro produto, sobre o qual recairá novo imposto, a empresa pode receber o imposto do insumo como um crédito de PIS/Cofins.

Atualmente, esses créditos podem ser usados para abater o saldo devedor de outros tributos, como os da Previdência. A medida provisória acaba com esse sistema e também impede que a empresa receba o crédito em dinheiro. Assim, na prática, há um aumento de impostos.

O Ministério da Fazenda estima que essa iniciativa aumente a arrecadação em R$ 29,2 bilhões anuais, mais do que compensando os efeitos não previstos na Lei Orçamentária de 2024 após a prorrogação da desoneração da folha de pagamentos e à redução da alíquota previdenciária para municípios, resultando em renúncia fiscal de R$ 26,3 bilhões este ano.

Pressionados pela oposição e pelo setor produtivo, Lira e Pacheco terão que decidir logo se enfrentarão o governo ou buscarão um acordo.

O Progressistas (PP), partido de Lira, acionou o STF contra a medida provisória nesta segunda-feira (10). A legenda argumentou que a MP é inconstitucional e pediu à Corte que conceda uma liminar para suspender a validade do texto. A Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 7671) apresentada pelo PP foi distribuída para a relatoria do ministro Gilmar Mendes.

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A novidade da MP gerou apreensão e debates entre empresários e especialistas tributários. A Confederação Nacional da Indústria (CNI) contestou o teor da MP junto ao STF, que tem decidido a favor do governo, como na recente previsão de volta da cobrança previdenciária na folha de salários.

A Corte já considerou a decisão do Congresso de manter a desoneração inconstitucional, justamente por não ter indicado receitas para compensá-la no Orçamento. Até agora, Lira e Pacheco apenas fizeram consultas a líderes partidários. Como presidente do Congresso, Pacheco teria o poder de devolver a MP, o que implicaria na anulação da medida.

Também nesta segunda, Lula se reuniu com Pacheco para discutir a “MP do Fim do Mundo”. O presidente do Senado teria demonstrado insatisfação ao petista pelo fato de a compensação ter sido tratada via MP. O presidente do Senado pediu ao governo que apresente uma alternativa à medida provisória até terça (11), segundo apuração do Poder360. Haddad também participou do encontro.

Judicialização limita as negociações entre Congresso e Planalto

O líder da oposição no Senado, Rogério Marinho (PL-RN), criticou a MP do Fim do Mundo por contradizer os objetivos da reforma tributária, com a cumulatividade de impostos.

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“Vamos lutar para impedir a cobrança de imposto sobre imposto, que prejudica a competitividade do setor produtivo e das exportações, como as do agronegócio”, avisou.

Para Pacheco, a situação seria uma oportunidade para ganhar apoio de setores conservadores e do agronegócio, caso devolvesse a MP, como pedem muitos. Mas a decisão do STF de condicionar a desoneração à aprovação de medida compensatória complicou a questão.

Ao editar a MP sem consultar ninguém, o governo acabou aumentando a tensão no debate entre Executivo e Legislativo, acompanhada pelo Judiciário. Sem base parlamentar sólida, o governo já enfrenta dificuldades para aprovar o seu projeto de regulamentação da reforma tributária, deixando a decisão final nas mãos dos parlamentares. Agora, analistas questionam se o governo calculou mal a reação política ou se está tentando criar conflitos entre setores econômicos.

No fim de semana, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT), encarou a onda de reclamações de vários setores econômicos e parlamentares sobre a MP 1227/2024. Em entrevista coletiva no sábado (8), Haddad pediu calma e afirmou que indústria e exportadores não serão afetados.

Empresários temem, contudo, que a perda de fluxo de caixa e o risco de acúmulo de créditos de difícil compensação prejudicar novos investimentos e aumentar o custo dos produtos.

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Haddad insistiu que agiu apenas para cumprir a decisão do STF, que deu prazo de 60 dias para que Executivo e Legislativo encontrassem uma solução de compensação para as desonerações. Segundo ele, em três anos, os gastos tributários com PIS/Cofins aumentaram de R$ 5 bilhões para R$ 22 bilhões. O texto da MP também exige que empresas com benefícios tributários informem a Receita Federal sobre esses benefícios.

O ministro tentou justificar a ausência de diálogo prévio com os parlamentares com o prazo curto fixado pelo STF e que o tempo para discussões começa agora.

Na mesma linha, o secretário-executivo do Ministério da Fazenda, Dario Durigan, destacou a importância da MP para ajustar as contas públicas. Ele afirmou que o governo está aberto ao diálogo com o setor produtivo e os parlamentares e criticou a falta de sugestões que garantam a compensação dos mais de R$ 25 bilhões necessários.

Erros do governo provocam irritação de indústrias e do agronegócio

Para Marcus Deois, diretor da consultoria Ética Inteligência Política, o governo errou no momento da apresentação da medida.

“Haddad estava fora do Brasil pedindo benção ao papa para taxar grandes fortunas e a Fazenda chamando uma coletiva de imprensa esvaziada para apresentar uma proposta supercomplexa e que irá demandar muita transpiração dos líderes do governo para fazê-la ir para frente dentro do Congresso”, resumiu.

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Ele não acredita que Pacheco irá devolver a MP, pois seria um gesto forte contra o governo, mas prevê grandes dificuldades para convencer os congressistas da comissão especial que irá analisar a proposta a mantê-la.

Em paralelo, forças relevantes da sociedade civil começaram a se manifestar contra a proposta, em especial, ao artigo 5º, que trata sobre o fim do uso de crédito cumulativo de imposto.

Além dos setores de serviços, agronegócio e petróleo e gás, duas Frentes Parlamentares – Agricultura (FPA) e Empreendedorismo (FPE) – estão se organizando para trabalhar contra a proposta.

“Além de criar uma nova complexa crise no seu relacionamento com o Legislativo, o governo conseguiu agora comprar uma briga com a sociedade civil organizada. Isso não vai acabar bem”, analisou João Henrique Hummel Vieira, diretor da consultoria Action.

Rubens Ometto, presidente do conselho do Grupo Cosan, criticou duramente o arcabouço fiscal e a postura do governo Lula, acusando-o de modificar normas para aumentar a arrecadação.

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Em um evento no Guarujá (SP), Ometto afirmou que o governo está “mordendo pelas bordas” e que o arcabouço fiscal incentiva o aumento das despesas à medida que a receita aumenta. Ele argumentou que essa abordagem leva à alta da taxa básica de juros e desincentiva a iniciativa privada.

Ometto também criticou mudanças recentes, como a retomada do voto de qualidade no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) e as limitações no uso de créditos do PIS/Cofins, que geraram queixas do setor produtivo e de parlamentares. Ele acusou o governo de não interpretar a intenção do legislador, mas de buscar elevar a arrecadação a qualquer custo.

Eduardo Galvão, diretor de relações institucionais da consultoria de relações públicas BCW, explica que o alvoroço gerado com a inesperada e severa restrição da compensação de créditos tributários trazida pela MP se explica pelo seu impacto na estrutura de custos e preços das empresas, obrigando-as a repensar estratégias.

Antes, as empresas podiam usar créditos de PIS/Pasep e Cofins para abater uma ampla gama de tributos, facilitando a gestão do fluxo de caixa e a liquidez. Agora, esses créditos só podem ser usados para compensar os próprios tributos, elevando a carga tributária e, por tabela, os custos operacionais.

Segundo o especialista, para empresas de diversos setores, sobretudo as que dependem de insumos variados e frequentemente caros, a medida provisória significa aumento expressivo nos custos de produção.

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Além disso, a revogação do ressarcimento em dinheiro dos créditos presumidos de PIS e Cofins força as empresas a buscarem alternativas de financiamento, que podem incluir da renegociação de prazos com fornecedores até novas linhas de crédito.

“A preocupação é que essas mudanças possam levar a um aumento nos preços dos produtos e serviços, impactando negativamente a demanda”, disse. “A MP 1.227/2024 não só desafia a resiliência das empresas, mas também acende um debate mais amplo sobre a política tributária e a necessidade de um ambiente regulatório estável e previsível para fomentar o crescimento econômico”, observou.  

Infográficos Gazeta do Povo[Clique para ampliar]