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As eleições para as presidências da Câmara e do Senado ocorrerão apenas em fevereiro, mas as articulações pelo comando de ambas as Casas avançam a passos largos desde a vitória nas urnas do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT). E os atuais presidentes da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), já largam como favoritos para se reeleger. Mas, especialmente no Senado, Pacheco pode enfrentar a oposição do PL, partido do presidente Jair Bolsonaro.
A reeleição de Lira e Pacheco é dada como certa pelos aliados mais próximos de ambos. Parlamentares da base de Bolsonaro, de Lula e mesmo aqueles com atuação mais independente também consideram prováveis as vitórias de ambos. Boa parte desse sentimento se deve às articulações que eles vêm fazendo e pela necessidade que Lula tem de obter o apoio de Lira e Pacheco para a aprovação, ainda em 2022, de seus projetos de governo – além de outras propostas no ano que vem.
"Eu vejo que a candidatura dele [Arthur Lira] é muito forte e natural, e isso leva a essa possibilidade de reeleição. O presidente Lira é páreo duro, é bem articulado, tem diálogo com todos os partidos da Casa, seja de esquerda ou direita. Está no poder, e foi o primeiro a reconhecer a vitória de Lula", diz o deputado federal José Nelto (PP-GO), vice-líder do partido na Câmara.
O rápido reconhecimento de Lira ao resultado das eleições, ainda em 30 de outubro, data do segundo turno, foi bem recebido por Lula, alas do PT e partidos aliados da esquerda. Como fruto disso, o presidente da Câmara e o presidente eleito se reuniram na última quarta-feira (9) para discutir a transição. No encontro, o petista também acenou que seu partido não lançará candidatura à presidência da Câmara, deixando o caminho livre para Lira.
Como normalmente iniciam um governo com capital político elevado, os presidentes recém-eleitos costumam se articular para apoiar um nome para as presidências das duas Casas do Congresso. Portanto, o compromisso do PT de não lançar candidatura própria é um gesto importante para Lira.
O cenário não é muito diferente no Senado, onde o PT também sinaliza apoio a Pacheco, com quem Lula também se reuniu na quarta passada.O senador Oriovisto Guimarães (Podemos-PR), líder do partido na Casa, avalia que Pacheco tem chances "muito boas" de ser reeleito e acredita que o cenário independe do apoio do PT. "Acho muito difícil que outra candidatura prospere, independentemente se Lula o apoia ou não, porque é uma coisa que o Senado vai decidir por ele mesmo, não com base na Presidência da República", diz.
Para Lula, a reeleição de Lira e Pacheco seria o melhor cenário para o início de seu mandato. Nas reuniões com o petista, ambos demonstraram boa vontade e disposição em avançar com as pautas do governo eleito e auxiliar na construção da governabilidade com o Congresso.
Como estão as costuras de Lira pela reeleição na Câmara
Lira e seu "núcleo duro" dialogam com lideranças de todos os partidos. Ele jantou com parlamentares da bancada do PP e aliados no último dia 8, quando intensificou as negociações. Após o encontro, líderes da Câmara avaliam que Lira pode obter uma vitória maior que os 302 votos obtidos na eleição de 2021 – a Casa tem 513 deputados.
Na disputa para o comando da Câmara em 2023, Lira manterá o apoio de PL, PP, PSD, Podemos, PSC, Pros, Avante e do recém-criado Mais Brasil – legenda oriunda da fusão entre Patriota e PTB. Todos esses partidos compuseram o bloco que o apoiou em 2021. Juntas, essas legendas somam 221 deputados. Para a reeleição, são necessários pelo menos 257 votos.
O presidente da Câmara ainda busca composições com o União Brasil, cujo presidente nacional, deputado Luciano Bivar (PE), ensaia uma candidatura; e com o Republicanos, cujo presidente nacional, deputado Marcos Pereira (SP), também ensaia uma candidatura. Lideranças de ambos os partidos consideram, contudo, que as sinalizações de seus dirigentes são apenas movimentos para valorizar o capital político das legendas e barganhar cargos.
Na hipótese de obter os votos dos deputados eleitos do União Brasil e do Republicanos, somados aos dos parlamentares das legendas que já acenam apoio a Lira nos bastidores, o presidente da Câmara teria 321 votos.
O placar pode, contudo, ser ainda maior devido às articulações com Lula. Caso o presidente eleito mantenha o compromisso de não lançar candidato e construa uma base com o Centrão, Lira poderia obter ainda mais votos da federação partidária composta por PT, PCdoB e PV, que conta com 80 deputados. Já outros partidos da base petista, como PDT, PSB, Psol e Rede – que se uniram em uma federação partidária – e o Solidariedade somam juntos 49 parlamentares.
Outro motivo pelo qual a reeleição na Câmara pode ser elástica é a possibilidade de o MDB não lançar candidato. O presidente nacional do partido, deputado Baleia Rossi (SP), que obteve 145 votos na eleição de 2021, sinalizou aos mais próximos que não vai disputar o cargo de novo. Outro emedebista que pode ficar de fora é o deputado federal eleito Eunício Oliveira (MDB-CE), ex-presidente do Senado, que teve o nome cotado.
O discurso no MDB, que elegeu 42 deputados, é de que o partido reconhece o fortalecimento e as articulações de Lira. Em aceno, o presidente da Câmara demonstrou a aliados a disposição em negociar com o partido. Sem uma candidatura emedebista, PSDB e Cidadania, que apoiaram Baleia em 2021, também poderiam votar pela reeleição de Lira. Os dois partidos, que se uniram em uma federação partidária, elegeram 18 deputados.
Como estão as articulações de Pacheco pela reeleição no Senado
O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, e seu entorno mais próximo já trabalham para conseguir o maior número de votos na eleição de fevereiro que irá escolher o comando da Casa. Além dos votos dos nove senadores do PT, o objetivo é assegurar todos os 11 votos do PSD, seu partido, e os 10 do União Brasil, do senador Davi Alcolumbre (AP), ex-presidente do Senado.
Ao site Poder 360, Alcolumbre disse que já está pedindo votos por Pacheco. Em jantar no último dia 8 com o presidente do Senado, a bancada do PSD também selou apoio integral à candidatura. Agora, todos concentram as articulações em obter os votos do PT e do MDB, que não descarta lançar candidatura própria.
Os senadores e as bancadas partidárias aliadas de Bolsonaro destacam que Pacheco e o senador Renan Calheiros (MDB-AL) têm uma rusga e acreditam que isso pode ser um fator de fragilidade à candidatura do presidente da Casa. Os governistas ainda analisam, porém, os movimentos de Lula e como ele e o PT atuarão. Renan é aliado de Lula.
Já o PL, partido do presidente Bolsonaro, tem a intenção de lançar candidatura própria para o comando do Senado. E tenta uma composição com senadores do PP, do Republicanos e de outros partidos.
O senador Lasier Martins (Podemos-RS), líder do bloco parlamentar Juntos pelo Brasil, classifica o atual cenário de bastidores no Senado como muito "explosivo" e "delicado". "Cresce o movimento por articulação do próprio Rodrigo Pacheco, que quer continuar. Mas os novos senadores, com lideranças do partido do governo, se articulam para apresentar um candidato forte que se oponha ao Pacheco. Do lado do governo, tem vários interessados. Mas deverá haver movimento no sentido de lançar o que tiver mais chances de fazer oposição ao Pacheco", diz Martins.
Segundo interlocutores do PL, o partido estuda lançar o senador eleito Rogério Marinho (RN), ex-ministro do Desenvolvimento Regional, ou os senadores Carlos Portinho (RJ), líder do governo na Casa, e Eduardo Gomes (TO), líder do governo no Congresso. O senador eleito Magno Malta (ES) é outro que colocou o nome à disposição.
O senador Oriovisto Guimarães entende como legítima a disposição do PL em disputar a presidência do Senado. Mas pondera que o partido teria dificuldade em construir composições para atingir os 41 votos necessários para a sucessão de Pacheco. Ele esclarece, porém, que o Podemos ainda não definiu seu apoio e que isso pode ocorrer apenas em 2023.
"Até onde eu enxergo, há uma situação bastante difícil de alguém passar o Rodrigo Pacheco para trás. Ele foi uma pessoa sempre muito educada, elegante. Sempre atendeu a todos os senadores muito bem e teve sempre uma postura que todos os senadores gostam muito, de ser independente e fazer do Senado um poder independente", diz.
"Pacheco tem essas qualidades; é amigo de 59 senadores, pois dos 27 eleitos, cinco foram reeleitos. E, evidentemente, entre os 22 novos senadores terão alguns que vão ficar do lado dele", complementa.
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Que desafios o PL pode impor às eleições no Senado e na Câmara
O principal obstáculo para a reeleição de Lira e Pacheco pode vir do PL. Por ter elegido a maior bancada na Câmara, com 99 deputados federais, e ter ampliado sua bancada no Senado para 14 senadores, o partido de Bolsonaro almeja o comando de uma das Casas do Congresso e até condicionou apoio a Lira a uma composição com o PP pela presidência do Senado. "Vamos apoiar o Arthur [Lira], mas com a garantia que ele nos ajude e trabalhe para eleger o nosso candidato no Senado", declarou o presidente nacional do PL, Valdemar Costa Neto, em entrevista coletiva a jornalistas na terça-feira (8).
Ele manifestou em mais de uma ocasião o interesse em ter a presidência do Senado. "Nós temos a maior bancada na Câmara e a maior bancada no Senado. Não é possível que a gente não tenha a presidência de alguma das Casas", disse. Valdemar esclareceu, porém, estar disposto a conversar. "Eu acho que é um fato novo. Temos que dialogar para ver com os demais partidos e como no Senado vai caminhar esta questão."
O presidente do PL reconheceu que há desafios para se atingir os 41 votos na disputa do Senado, mas disse que seu "pessoal" já trabalha "bastante" para isso. "Por isso temos que compor na Câmara para ter sucesso no Senado", disse. Valdemar frisou que atuará não apenas pelos votos dos senadores, mas também pelo empenho de Lira e do presidente licenciado do PP, o senador Ciro Nogueira, o atual ministro-chefe da Casa Civil.
Valdemar rechaçou, porém, uma composição com o PP para apoiar uma possível candidatura da senadora eleita Tereza Cristina (PP-MS) à presidência do Senado. "Podemos fazer composição com o Arthur, se ele ceder o cargo dele na Câmara. Não pode o PP ter as duas vagas, não é verdade?", disse.
O presidente em exercício do PP, Cláudio Cajado, classifica como "legítima" a posição de Valdemar, mas defende a importância do diálogo. "Ele tem que tentar, de fato, fortalecer cada vez mais a legenda. Agora, não sei como será isso a nível de conjunto como um todo, porque você tem o partido que foi líder e protagonista de uma oposição direta ao presidente eleito Lula [nas eleições]", declara.
Embora o PP e o Republicanos tenham sido, junto com o PL, outros partidos da coligação que apoiou a reeleição de Bolsonaro, Cajado sustenta que sua legenda "só participou" do processo eleitoral. "O maior partido foi o PL. E eu não sei como as outras forças vão ver isso. Mas acho que ele tem que dialogar. Fora que o próprio PSD vai querer ter, obviamente, a manutenção da presidência [do Senado] com o Rodrigo Pacheco, que já manifestou [o interesse na reeleição] através de vários aliados", diz.
A atual posição do PP é de construir um diálogo pela reeleição de Lira, inclusive com o apoio do PT, o que poderia inserir o partido na base de apoio de Lula. Cajado acredita, porém, que conversas entre o PP e o PL ainda devem ocorrer, e esclarece que os diálogos estão sendo conduzidos por Lira.
"Estamos deixando que as conversas ocorram. Quem está protagonizando isso e sendo interlocutor das conversas é o próprio presidente Arthur Lira, ele mesmo está sendo interlocutor das conversas, mas não pude conversar com ele hoje a respeito de como estão os andamentos destas tratativas", diz.O presidente em exercício do PP acredita que as conversas pela sucessão podem evoluir a partir do fim do mês. "Eu acredito que, a partir da semana do dia 20 (...) possamos ter uma visão muito mais concreta do que teremos em termos de conversas com o governo eleito e também entre os partidos, não só o Progressistas [PP]", diz Cajado.