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A Câmara dos Deputados não conseguiu chegar a um acordo sobre a proposta de emenda à Constituição nº 3/21, que busca regulamentar a possibilidade de prisão de deputados federais e senadores, e que ficou conhecida como PEC da imunidade, ou "PEC da impunidade" entre seus opositores. Sob pressão dos partidos, o presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL), retirou o texto da pauta e determinou a criação de uma comissão especial para analisar a propostas, conforme defendiam a maioria dos líderes partidários.
A indicação dos nomes dos integrantes deverá ser feita por eles até segunda-feira (1º). Na prática, isso significa que a PEC terá um prazo maior de análise, podendo ser modificada pela comissão especial, antes de voltar ao plenário da Câmara para votação.
Nesta sexta-feira (26), depois de três horas de debates e tentativas de costura política, os parlamentares não chegaram a um entendimento para dar seguimento à votação da PEC da imunidade. Por ser uma proposição para emendar a Constituição, precisaria de no mínimo 308 votos "sim" para avançar na Câmara, em dois turnos de votação, antes de seguir para o Senado.
"Fico muito triste e preocupado quando se adjetivam PEC's e essa não merece ser chamada de PEC da Imunidade, deveria ser chamada de PEC da Democracia. A democracia que impõe limites, a democracia que impões respeito, a democracia que impõe ordenamento e que dá regras ao convívio social. Regras que faltam e que faltaram para que o Supremo [Tribunal Federal] tivesse uma decisão mais cômoda, inclusive para ele mesmo. E esta Casa, de novo hoje, não consegue consensuar a alteração de um artigo", disse Lira.
A proposta teve sua tramitação iniciada no Congresso na quarta-feira (24) e foi alvo de controvérsias desde o início. As críticas se davam tanto em relação ao seu teor, visto como uma blindagem aos deputados federais e senadores, quanto ao rito de apreciação do projeto.
Opositores da iniciativa recordaram que outras propostas que falam sobre temas ligados à Justiça, como o fim do foro privilegiado e a prisão dos condenados em segunda instância, estão há meses parados na Casa. A proposição da PEC da imunidade foi elaborada pelo deputado Celso Sabino (PSDB-PA) e contou com o apoio do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-PI), e com a base do presidente Jair Bolsonaro.
Na sessão desta sexta, Lira ressaltou que muitos partidos não fizeram críticas ao texto, mas ao procedimento de tramitação da PEC. “Eu quero deixar claro, que nós não teríamos a votação de sexta-feira passada [que manteve a prisão do deputado Daniel Silveira] se não houvesse o encaminhamento desta saída constitucional. Nós não teríamos o resultado que esta Casa deu, cortando na própria carne, se nós não tivéssemos esse acordo”, apontou o presidente da Câmara.
O que dizia o texto da proposta
O texto que seria votado nesta sexta-feira foi um substitutivo elaborado pela relatora da iniciativa, a deputada Margarete Coelho (PP-PI). Na redação, a parlamentar excluiu trechos da proposta original que criavam barreiras para a aplicação de punições previstas pela Lei da Ficha Limpa. Mas manteve dispositivos que dificultariam a prisão de deputados federais e senadores, como o entendimento de que um congressista só pode ser detido em flagrante por crime inafiançável.
Também manteve na proposta a chamada "prisão de gabinete" — a determinação de que um parlamentar preso precisaria ser conduzido até a sua casa legislativa de origem e lá permanecer até decisão efetiva do Judiciário.
Outros trechos do texto original que Margarete manteve em sua redação são a proibição de que um deputado seja afastado por decisão individual de um membro do Judiciário e a indicação de que operações de busca e apreensão no Congresso precisam ser acompanhadas pela Polícia Legislativa.
O relatório de Margarete Coelho endossou também a ideia original de Sabino de inserir na Constituição que eventuais punições por opiniões, palavras ou votos a membros do Congresso só poderão ser impostas pelo próprio Congresso, por meio de deliberação do Conselho de Ética da casa do parlamentar.
PEC da imunidade foi apresentada na esteira do caso de Daniel Silveira
O texto foi apresentado na esteira do caso Daniel Silveira (PSL-RJ). O parlamentar foi preso no dia 15 após ter veiculado na internet um vídeo com ameaças a membros do Supremo Tribunal Federal (STF). No dia 19, a Câmara votou para confirmar sua prisão.
O episódio reacendeu discussões sobre os limites da liberdade de expressão e também sobre a possibilidade de ministros do STF decretarem, de forma monocrática, a prisão de um parlamentar — a decisão inicial de deter Silveira foi tomada unilateralmente pelo ministro Alexandre de Moraes.
Outra circunstância também em discussão no Parlamento é a que envolve a deputada Flordelis (PSD-RJ), acusada de mandar matar o marido. O Ministério Público pediu a prisão da parlamentar, e ela não foi detida por conta de suas prerrogativas como deputada.