No próximo dia 20, ao relançar a segunda edição do livro “Nação e Exército” escrito pelo sociólogo e historiador Gilberto Freyre (1900-1987) o Exército Brasileiro dará, desde a posse do presidente Jair Bolsonaro, o mais claro recado à sociedade no sentido de mostrar que não é nem faz parte do governo. Pelo contrário, é e continuará sendo uma instituição de Estado.
O Exército não se via tão exposto desde o fim do regime militar. Se a chegada do capitão reformado ao poder por um lado reforçou o interesse pelos militares, por outro jogou no mesmo balaio generais, coronéis, políticos e o próprio presidente da República, cujo comportamento nem sempre é avalizado pelos oficiais.
Em “Nação e Exército”, publicado em 1949, Freyre publica uma conferência que proferira no ano anterior na Escola do Estado Maior do Exército. Nessa palestra, Freyre destacara que o principal sintoma de um “povo socialmente enfermo” aparecia quando uma sociedade se eximia das atividades administrativas, corporativas, morais, ideológicas, etc, e as delegava às Forças Armadas, como se tudo que garantisse a ordem social fosse papel exclusivo dos militares.
Preocupados com as confusões diárias causadas pelo bolsonarismo, militares graduados da ativa e da reserva têm reiterado que é preciso se distanciar do governo e esclarecer qual é o papel das Forças Armadas. Dessa forma, esses militares têm aproveitado palestras e entrevistas, ainda que raras, para colocar o tema na ordem do dia.
Se bem é verdade que, na falta de quadros em quem confie ou considere preparados para as funções públicas, Bolsonaro tenha recorrido aos militares para preencher funções de todo tipo na administração pública, o Exército quer desfazer a ideia de que isso signifique concordar e apoiar tudo que o governo faz.
Nas últimas semanas, esse conceito vem sendo replicado, ainda que com outras palavras, por oficiais da ativa e da reserva. "O nosso papel é pela defesa da pátria e a garantia da lei. Nós não somos servidores do governo, somos servidores do povo brasileiro", afirmou o general da reserva Alberto Cardoso, ao abrir o ciclo de diálogos no Instituto Histórico e Geográfico do Distrito Federal. Cardoso foi ministro chefe da Casa Militar do governo Fernando Henrique Cardoso, quando idealizou o Gabinete de Segurança Institucional (GSI) e a Agência Brasileira de Inteligência (Abin), hoje comandados pelo general da reserva Augusto Heleno Pereira.
Há menos de 15 dias, no Seminário Internacional: Desafios à Defesa Nacional e o papel das Forças Armadas, promovido pela Comissão de Relações Exteriores e de Defesa Nacional da Câmara dos Deputados, o ministro da Defesa, Fernando Azevedo, general da reserva, foi breve: “Nossas Forças Armadas sempre tiveram um papel fundamental. A história delas se confunde com a do Brasil. Somos instituições de Estado, não de governo”.
Embora não explicitamente, reafirmar esse conceito tem sido a palavra de ordem nos quartéis. O Exército, segundo graduados oficiais, não pode e não deve se subordinar à política nem deste nem de nenhum outro governo, sob pena de corromper os padrões militares, como a disciplina e a hierarquia, sob os quais foi construída a instituição.
Com o esforço, esses oficiais acreditam que o Exército poderá, mesmo que com alguns arranhões, evitar o desgaste na imagem que seria provocado pelas confusões criadas dia sim, outro também, por Jair Bolsonaro. Até agora, a instituição permanece nas pesquisas de opinião como a mais confiável para os brasileiros.
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