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Reforma ministerial

Lula acena ao STF com Lewandowski no Ministério da Justiça e ainda estuda trocar mais ministros

Ex-ministro Ricardo Lewandowski
Lula acena ao STF com Lewandowski no Ministério da Justiça e considera trocar mais ministros (Foto: José Cruz/Agência Brasil)

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Dada como certa em Brasília, a opção do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) de colocar Ricardo Lewandowski, ministro aposentado do Supremo Tribunal Federal (STF), no Ministério da Justiça e Segurança Pública, é mais um passo de aproximação do governo com a Corte. Nome de confiança do petista, Lewandowski deixou o tribunal em abril com amplo prestígio entre os colegas. Na época, já era considerado um nome forte para integrar o primeiro escalão do Executivo ou alguma embaixada no exterior.

De lá para cá, passou a defender, como advogado, a J&F, assumiu a presidência do Tribunal do Mercosul e foi chamado para chefiar o Observatório da Democracia, departamento criado na Advocacia-Geral da União (AGU) para produzir estudos sobre o “fortalecimento das instituições”, tema apropriado por Lula como peça de propaganda de seu governo.

A expectativa é que Lewandowski seja anunciado até sexta (12). Até lá, ele deve se desvincular de suas atividades na advocacia e costurar a montagem de sua equipe. A questão é delicada porque vários nomes colocados em postos-chave da pasta pelo atual titular, Flávio Dino, e ligados ao seu partido, o PSB, devem ser dispensados. Lewandowski já sinalizou que pretende chamar nomes de sua confiança para dirigir o ministério. A Secretaria Executiva, posto mais importante, tende a ficar com Manoel Carlos de Almeida Neto, que foi secretário-geral do STF entre 2014 e 2016, quando Lewandowski era presidente da Corte. Hoje advogado da Companhia Siderúrgica Nacional (CSN), era o nome preferido do ministro aposentado para sua cadeira no Supremo, que acabou ocupada por Cristiano Zanin, ex-advogado de Lula.

Para o cientista político e advogado Valdir Pucci, a indicação de Lewandowski para a Justiça representa um estreitamento do diálogo com o  STF. “Por ser um ex-ministro do Supremo, o Lewandowski teria um diálogo mais direto com a Corte”, avalia Pucci.

Uma questão ainda não resolvida é onde alocar o atual secretário-executivo, Ricardo Cappelli, apadrinhado por Dino. Lula quer mantê-lo no governo e é possível que passe a ocupar algum cargo na Casa Civil, comandada por Rui Costa. Já alguns políticos do PSB, também próximos de Dino, devem sair. É o caso do advogado Augusto de Arruda Botelho, hoje na Secretaria Nacional de Justiça; de Elias Vaz, da Secretaria de Assuntos Legislativos; e de Tadeu Alencar, da Secretaria de Segurança Pública. Todos concorreram a deputado federal em 2022, não conseguiram se eleger e foram abrigados no Ministério da Justiça.

Com o provável desfalque do PSB no governo, Lula fica ainda mais pressionado a mexer no Executivo para manter apoio no Congresso. O partido já tem dois ministérios na Esplanada: da Microempresa e da Empresa de Pequeno Porte, ocupada por Márcio França; e do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviço, sob a condução do vice-presidente Geraldo Alckmin. Mas como tem peso menor na Câmara, com 14 deputados em exercício, dificilmente conseguiria uma pasta a mais.

A tendência de Lula é trocar o comando de três pastas: Ministério de Desenvolvimento Social, a Secretaria-Geral da Presidência e Ministério das Comunicações. A presidência da Petrobras também pode entrar nos planos. Essas mudanças, contudo, não têm prazo e nem confirmação para acontecer (saiba mais na segunda parte dessa reportagem).

A nomeação de Lewandowski para o Ministério da Justiça atende a Lula e a alguns integrantes da Corte mais influentes na política. Tradicionalmente, o titular do cargo é um dos principais interlocutores do governo com o tribunal, e costuma ter influência sobre o presidente na escolha de nomes para o Judiciário, assunto de interesse dos ministros. Além disso, o Ministério da Justiça abriga a Polícia Federal, que toca as investigações contra políticos e outras autoridades com foro privilegiado que tramitam no STF.

Nesse momento, um alinhamento entre o STF, o Ministério da Justiça e órgãos que estão no seu guarda-chuva, como PF, a Polícia Rodoviária Federal e o Departamento de Recuperação de Ativos e Cooperação Jurídica Internacional (DRCI), pode favorecer a continuidade das investigações que miram o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). Hoje, existe uma forte vontade dos ministros de puni-lo, seja pela forma com que lidou com a pandemia, ou pela suposta instigação dos ataques à sede do tribunal no 8 de janeiro de 2023 – suspeita ainda sob investigação e sem provas evidentes. Como ministro do STF, Lewandowski relatou várias ações ajuizadas pela oposição a Bolsonaro para forçar o governo a comprar vacinas contra a Covid.

Por ter ascendência sobre a PF, Dino, que está de saída, contribuiu para o aprofundamento das investigações contra Bolsonaro relacionadas ao 8 de janeiro, sobre os casos dos falsos cartões de vacina e das joias que recebeu de presente de príncipes sauditas. A direção-geral da corporação deve continuar com o delegado Andrei Rodrigues, que também tem a confiança de Lula, por ter integrado sua equipe de segurança durante a campanha de 2022.

“Acredito que por ser um ex-ministro do STF, os atuais ministros da Corte têm respeito e até confiança de que Lewandowski possa saber pautar os interesses do STF junto ao Ministério da Justiça. Ao mesmo tempo, é claro, Lewandowski é um nome de confiança do Lula, tanto que foi Lula quem o indicou para ser ministro do Supremo em 2006”, diz o cientista político Adriano Cerqueira, professor do Ibmec e da Universidade Federal de Ouro Preto (Ufop).

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Reforma ministerial deve sofrer adiamento

A possibilidade de uma reforma ministerial tem sido especulada desde os últimos meses de 2023, mas sumiu da agenda de Lula nos últimos dias. Apesar do presidente não ter confirmado outras trocas, fontes do Palácio do Planalto e especialistas encaram a reforma como algo plausível dentro do atual cenário político. "Em anos eleitorais [como é o caso de 2024] é comum haver mudanças no Executivo por conta do empenho dado a essas eleições. Portanto, pode, sim, ter alguma alteração ministerial no governo, isso não seria nenhuma surpresa", avalia Adriano Cerqueira.

As mudanças, segundo os especialistas ouvidos pela Gazeta do Povo, teriam como motivação obter mais apoio político e afastar nomes que não atingiram seus objetivos ou colocaram o governo em situações delicadas em 2023. Um dos principais objetivos das mudanças seriam tentar reverter o desastroso resultado do PT no pleito regional de 2020 Naquelas eleições, o PT não conseguiu eleger nenhum prefeito pela legenda em capitais do país. O resultado revelou um enfraquecimento do partido que Lula quer reverter.

A ideia seria tirar nomes com pouca relevância e baixo "desempenho" para indicar figuras que podem ter influência na disputa pelos governos municipais e estaduais.

O principal aspecto ponderado pelo mandatário, de acordo com os analistas Cerqueira e Pucci, é a possibilidade de aumentar sua influência parlamentar com as novas nomeações. O governo não tem maioria no Congresso para aprovar suas principais pautas. A constante pressão do centrão por cargos e verbas de emendas também não agrada a base governista de Lula.

"A possibilidade de uma reforma ministerial é uma forma do Lula cobrar mais empenho daqueles ministros que estão ocupando pastas tendo em vista o aumento da base de apoio do governo no Congresso, principalmente na Câmara. Então isso é uma forma de pressionar esses ministros por mais empenho e efetividade no apoio às propostas do governo. Mas isso é uma situação difícil, a base de Lula na Câmara é frágil e só ocupar um ministério não é garantia de que ele vai sempre conseguir boas votações no seu interesse", pontua Adriano Cerqueira.

Uma hipótese é que as mudanças ocorram só depois de março, pois também há ministros que podem deixar o governo para concorrer em eleições municipais. Um exemplo é a ministra Anielle Franco, Ministra da Igualdade Racial, que pode concorrer junto com Eduardo Paes (PSD) à prefeiutura do Rio de Janeiro.

Gleisi Hoffmann pode ser indicada por Lula e ganhar ministério

Com a chegada do ano eleitoral e sem ter assumido o Ministério da Justiça, Gleisi Hoffmann, a presidente do PT, tem sido cotada para assumir uma entre duas pastas que já têm ministros do partido. Ela pode ser realocada para o Ministério do Desenvolvimento Social no lugar de Wellington Dias ou para a Secretaria-Geral da Presidência, no lugar de Márcio Macêdo.

Wellington Dias não tem agradado a base governista. Há quem defenda que ele não tem conseguido emplacar o combate à fome à frente do ministério da maneira que o PT imaginou. O tema foi a principal aposta política de Lula durante a campanha eleitoral em 2022 e não tem tido o destaque que membros do PT gostariam que tivesse. Mas a pasta de Dias está no alvo do Centrão desde meados do último ano e é uma das prováveis a passar por alterações.

À frente da Secretaria-Geral da Presidência, Márcio Macêdo é apontado como um dos ministros mais próximos de Lula. Mas é outro que pode deixar o cargo para tentar concorrer às eleições municipais deste ano. Membros do PT avaliam que Macêdo possa ser eleito para prefeito em Aracaju (SE). Ex-deputado federal, ele é filiado ao PT em Sergipe e foi candidato a prefeito nas eleições na capital sergipense em 2020, porém ficou em quarto lugar na disputa. Na eventual mudança em alguma dessas pastas, Gleisi lidera a fila de candidatos para ocupar a vaga deixada por Dias ou Macêdo.

Para Cerqueira, a indicação de Gleisi para alguma dessas duas pastas pode ser o suficiente para a “cota do PT” na Esplanada. "Acho que ela é uma espécie de coringa do governo, do Lula e do PT. Tendo em vista alguma oportunidade de vagas, acredito que ela pertence à chamada 'cota do PT' e esses ministérios em que ela poderia entrar já são assumidos por pessoas do PT. Não não consigo ver ela entrando de outra forma", analisa o cientista político.

Alvo de escândalos, Juscelino Filho pode deixar Esplanada dos Ministérios

O ministro das Comunicações, Juscelino Filho (União Brasil), também tem sido cotado para deixar o cargo. O descontentamento com o parlamentar é antigo e Filho está envolvido em alguns escândalos de corrupção. Investigações do jornal Estadão revelaram mau uso de verba pública pelo político, que utilizou recursos para pavimentar uma estrada que dava acesso à fazenda de sua família no Maranhão, além de ter usado aviões da Força Aérea Brasileira (FAB) para participar de leilões de cavalo.

Apesar do desgaste nos últimos meses, Juscelino ainda permanece no comando da pasta e isso não tem sido bem-visto pela base governista de Lula. Por outro lado, sua permanência pode ser justificada pelo fato do parlamentar ser o representante do União Brasil na Esplanada. Sua eventual saída das Comunicações dependeria de uma negociação com o União Brasil, com o presidente da Comissão de Constituição e Justiça do Senado, Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), e até com Arthur Lira (PP-AL), de quem Filho tem apoio.

Outra mudança que tem sido cogitada é a de Jean Paul Prates, o presidente da Petrobras. Para os especialistas ouvidos pela reportagem, uma mudança na petroleira é extremamente delicada, principalmente pelo trágico histórico de corrupção do PT com a empresa. Prates tem desagradado alas do governo e acumulado desentendimentos com o ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira.

"Por mais que o governo esteja tentando dar um tom mais técnico e menos político ao cargo, a Petrobras foi bastante prejudicada pela gestão petista, em especial durante o governo Dilma. É uma empresa com ações lançadas no mercado internacional, tem uma série de obrigações. A Petrobras sofreu processos de indenização por conta da má gestão de governos petistas, então teria que ser um cargo com um perfil mais técnico", avalia Adriano Cerqueira.

"Não sei de nomes que estão sendo cotados para a vaga de Prates, mas se o governo quiser voltar atrás e quiser dar um nome mais político, acredito que poderia ser alguém do PT ou até mesmo um partido de extrema esquerda, como PCdoB, como já foi no passado. Porém, se o governo quiser manter a ideia de que a gestão técnica na Petrobras, aí seria algum nome provavelmente da própria empresa. Alguém dos quadros internos da empresa poderia, de algum modo, defender a ideia de que a Petrobras ainda segue uma governança empresarial", diz o especialista.

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