Prioridade para o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), a diplomacia brasileira é vista como um dos grandes desafios do novo governo, que vê o prestígio internacional do Brasil "abalado" nos últimos anos. Por isso, o Ministério das Relações Exteriores (Itamaraty) planeja adotar duas estratégias num esforço para reconstruir pontes e reabrir canais de diálogo.
A primeira é a volta da chamada diplomacia presidencial. O objetivo é reinserir o Brasil nos grandes debates da política internacional de forma que o país consiga influenciar decisões. Para isso, o novo ministro das Relações Exteriores, Mauro Vieira, organiza uma série de viagens internacionais de Lula que deve ocorrer ainda no primeiro trimestre de 2023. A expectativa, até o momento, é de que o primeiro país a ser visitado seja a Argentina, depois os Estados Unidos e, por fim, a China.
“Essas visitas ocorrerão brevemente, nos primeiros três meses, no máximo, eu imagino. A prioridade é restabelecer mecanismos de contato com vizinhos da América Latina e reconstruir pontes com países como Estados Unidos e China, além da União Europeia e da África", adiantou Vieira.
A segunda estratégia do Itamaraty é colocar o meio ambiente e as mudanças climáticas no centro da política externa brasileira nos próximos quatro anos. Um primeiro passo já foi tomado com o restabelecimento do Fundo Amazônia, que recebe aportes financeiros de nações europeias interessadas em investir na preservação da Amazônia.
No caso das relações com a Argentina, aliados indicam que a volta de Lula ao Palácio do Planalto pode ajudar diante da crise econômica que o país vizinho enfrenta. Em novembro, por exemplo, a inflação anual da Argentina atingiu 92,4% e se aproxima cada vez mais do patamar de 100%. A ideia é de que o presidente argentino Alberto Fernández tentará colar-se ao Brasil de Lula para conseguir apoio político e econômico. Fernández assistiu a cerimônia de posse e teve um encontro reservado com o novo presidente do Brasil na última segunda-feira (2).
Na visita ao país vizinho, Lula pretende debater temas como projetos nas áreas de infraestrutura, energia, comércio e acordos financeiros, inclusive entre os bancos centrais dos dois países. A agenda está prevista para ocorrer no dia 24 de janeiro dentro da chamada Cúpula da Celac, a Comunidade dos Estados Latino-Americanos e Caribenhos, fórum regional que Bolsonaro abandonou quando tomou posse em 2019. "A verdade é que a ausência do Brasil em fóruns internacionais era muito evidente, e é algo que não podemos permitir", disse Fernández após o encontro com Lula.
Paralelamente, os aliados de Lula tentam incluir na agenda uma visita ao Uruguai, presidido pelo centro-direita Luis Lacalle Pou. Os integrantes da transição apontam que o encontro com o uruguaio seria uma sinalização de pluralidade positiva para a região. "O nosso objetivo é retomar o diálogo com todas as nações, independentemente do posicionamento político ou ideológico dos seus governos", defendeu o novo chanceler brasileiro.
Lula restabelece a diplomacia do Brasil com a Venezuela
Ainda na lista de prioridades da diplomacia, o novo presidente determinou que seja restabelecida a relação do Brasil com a Venezuela, que é governado pelo ditador Nicolás Maduro.
Desde 2019, o governo Bolsonaro reconhecia Juan Guaidó como presidente da Venezuela. Ele era à época presidente da Assembleia Nacional e opositor do chavismo e, em 23 de janeiro daquele ano, se autoproclamou presidente venezuelano com o apoio de países como Estados Unidos, Paraguai, Equador e Colômbia, além da Organização dos Estados Americanos (OEA).
Com a volta das relações entre os dois países, Lula vai reabrir a embaixada do Brasil em Caracas, capital venezuelana. "O presidente Lula me instruiu que restabelecêssemos as relações, enviando, num primeiro momento, com um encarregado de negócios para retomar os prédios que temos lá, residências, chancelaria, reabrir a embaixada e, posteriormente, indicar um embaixador junto ao governo venezuelano”, disse Mauro Vieira.
Em outra frente, Lula pretende reinserir o Brasil em órgãos internacionais latino-americanos. "O presidente [Lula] me orientou a retomar participação em alguns fóruns, como Celac e Unasul [União de Nações Sul-Americanas]. Teremos uma volta a esses organismos, mas com um olhar novo, pois o mundo mudou. Teremos um olhar novo, construtivo, sempre baseado na solidariedade com os países latino-americanos e visando a cooperação entre países em desenvolvimento", disse o ministro.
Haiti vai entrar na pauta de encontro de Lula com Joe Biden nos EUA
Ainda no calendário para o primeiro trimestre de 2023, a equipe que discute as estratégias da diplomacia de Lula pretende inserir na pauta do encontro com o presidente dos EUA, Joe Biden, a situação do Haiti. O governo americano tem defendido uma segunda missão internacional ao país caribenho, o que enfrenta resistências por parte dos aliados de Lula. O Brasil liderou uma missão de estabilização no Haiti entre 2004 e 2017.
A defesa por uma segunda missão foi apresentada para Lula durante o encontro dele com o secretário-geral da Organização das Nações Unidas (ONU), António Guterres, durante a COP-27 no Egito, em novembro. De acordo com integrantes do PT, Lula deve defender junto a Biden que o Brasil vê a força multinacional como inoportuna, principalmente por ser fora da ONU. A proposta americana enfrentaria resistência da Rússia, em razão das relações estremecidas entre os dois países por causa da guerra na Ucrânia.
Em contrapartida, Lula pretende sinalizar que o Brasil não irá medir esforços para ajudar o país caribenho. Nos últimos anos, durante os governos do PT, o Brasil chegou a destinar pouco mais de US$ 40 milhões a programas de ajuda aos haitianos, através da Celac.
Além da questão do Haiti, a crise da Venezuela também será tema do encontro de Lula com o presidente norte-americano. Aliados acreditam que Lula pode ser um importante interlocutor para que os EUA restabeleçam relações com o país comandado pelo ditador Nicolás Maduro.
Desde o início da guerra na Ucrânia, os Estados Unidos passaram a depender de outros países para comprar petróleo que até então importava da Rússia. E a Venezuela, que tem uma das maiores reservas mundiais, virou uma fonte estratégica para os americanos.
Diplomacia com a China mira acordo para compensação de carbono
Prevista para ocorrer em março, a visita de Lula a China tem como objetivo estabelecer uma diplomacia diferente da que foi estabelecida pelo governo Bolsonaro, segundo integrantes da transição. Para esse grupo, os ataques de aliados de Bolsonaro ao governo chinês, principalmente durante a pandemia, estremeceram a relação entre os dois países.
No encontro com o presidente chinês Xi Jinping, Lula pretende apresentar propostas do Brasil para a chamada "economia verde". A avaliação do governo é de que a China quer se posicionar na vanguarda da transição para a economia de baixo carbono, o que poderia resultar em retornos financeiros para o Brasil.
Nos cálculos do governo brasileiro, um acordo bilateral climático para comercialização de créditos de carbono, como sugere um estudo do Conselho Empresarial Brasil-China, poderia fazer com que as emissões de carbono da China fossem compensadas em projetos no Brasil. O país chinês é o maior parceiro comercial do Brasil há 13 anos consecutivos, com um volume de comércio entre as nações superior a US$ 100 bilhões nos últimos quatro anos. Em 2021, as exportações de produtos agrícolas brasileiros para a China ultrapassaram US$ 40 bilhões.
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