Presidente Lula vai passar por avaliação médica nos próximos dias| Foto: EFE/EPA/JAPAN POOL
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O objetivo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) de conseguir uma cadeira para o Brasil no Conselho de Segurança da ONU vem sendo perseguido por ele desde seu primeiro mandato em 2003. Recentemente, na cúpula do G7 (grupo das sete democracias mais industrializadas do mundo), Lula voltou a criticar a composição do órgão. Mas o presidente está apostando nas estratégias erradas para conseguir esse espaço, segundo analistas de geopolítica ouvidos pela reportagem.

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Desde que assumiu seu terceiro mandato como presidente do Brasil, Lula iniciou uma agenda internacional para estreitar laços com os cinco países-membros do Conselho de Segurança. Pessoalmente, o petista visitou a China, os Estados Unidos e o Reino Unido. Ele ainda se encontrou com o presidente francês durante o G7 neste mês e enviou seu assessor Celso Amorim até a Rússia. A estratégia de se aproximar das nações que comandam o conselho, no entanto, pode não ser a melhor estratégia para conseguir a vaga desejada.

Para ampliar o Conselho de Segurança é preciso ter o aval de seus cinco membros permanentes. Mas Estados Unidos, Rússia, França, China e Reino Unido não têm motivos para espaço para outras nações.

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Uma alternativa para Lula conseguir seu objetivo seria recorrer aos membros da Assembleia Geral da ONU e tentar articulá-los para reformar o Conselho de Segurança.

Uma emenda do capítulo 8 da Carta da ONU (artigo 109) prevê uma hipótese para a reforma do Conselho de Segurança: o assunto tem que ser colocado em pauta em uma Assembléia da ONU e aprovado pela maioria dos 193 países, incluindo um membro do próprio conselho.

Em tese, essa poderia ser uma das estratégias adotadas pelo governo brasileiro para reformar o órgão. Ou seja, na prática uma solução individual para o Brasil não é impossível, mas ainda é uma realidade bastante difícil de ser concretizada.

Guerra na Ucrânia faz Rússia e China buscarem parceiros e prometerem apoio

"O Brasil trabalha nisso [ter um assento permanente no Conselho] há muitos anos, inclusive em governos anteriores. Atuamos em missões de paz da ONU há alguns anos para mostrar que somos uma potência militar e um país estável, mas esse trabalho precisa ser mais persistente", analisa o mestre em direito internacional e professor da Escola Superior de Advocacia da OAB em São Paulo Manuel Furriela.

"Países como a Rússia e a China, devido participação no Brics [bloco econômico que reúne Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul], podem apoiar a entrada do Brasil como membro permanente", disse. Moscou e Pequim estão no momento tentando buscar parcerias para compor um bloco que tenta contestar a hegemonia global americana.

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"Mas os Estados Unidos, por exemplo, devem ser oposição, pois o país entende que não faz sentido dividir tamanho poder com outras nações", analisa Furriela.

Conselho de Segurança da ONU foi formado por países que venceram a Segunda Guerra

Com o fim da Segunda Guerra Mundial, em 1945, a ONU foi criada e formou uma Assembleia Geral para discutir questões mundiais e manter contato entre todas as nações. Junto à sua fundação, também foram criados conselhos, como o da Tutela, o de Direitos Humanos e o de Segurança. "O Conselho de Segurança é muito poderoso, mais até do que a ONU, pois é ele que decide, por exemplo, quando é legítima a intervenção militar num país. É ele quem escolhe juízes de tribunais internacionais e toma outras diversas decisões grandiosas", explica Furriela.

Esse poder, no entanto, não fica na mão de todas as nações do mundo. O Conselho de Segurança é composto por apenas 15 membros. Deles, cinco são permanentes e os mesmos desde sua formação: Rússia (que era União Soviética), Estados Unidos, Grã-Bretanha, França e China. Os demais são "rotativos" e eleitos pela Assembleia Geral para mandatos de dois anos no organismo.

"Na Carta das Nações Unidas – que é um tratado internacional resultante da Conferência de São Francisco, em 1945 – procurou-se mesclar duas correntes das Relações Internacionais: o idealismo, representado pela Assembleia Geral, onde cada país-membro [os 193] tem direito a um voto, e o realismo, presente no Conselho de Segurança, onde os cinco principais vencedores da Segunda Guerra Mundial têm direito de veto", afirma o doutor em políticas públicas e pesquisador de Harvard, Vitélio Brustolin.

"As nações permanentes têm o direito de veto, que permite que um único país com tal posição se oponha a todos os 14 demais e barre resoluções", salienta Brustolin. Ou seja, além de terem um lugar fixo no órgão, esses países podem vetar qualquer decisão que estiver sendo votada durante no conselho. Por isso, o Conselho de Segurança vem sendo visto como ineficiente para tratar de conflitos que envolvam seus membros permanentes.

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"Sem reforma de seu Conselho de Segurança, com a inclusão de novos membros permanentes, a ONU não vai recuperar a eficácia, a autoridade política e moral para lidar com os conflitos e dilemas do século 21", disse Lula há uma semana na cúpula do G7, no Japão.

Reforma do Conselho não é bem-vinda por membros permanentes

Pauta antiga do Brasil e de outros países que também almejam ter um lugar como membro permanente do conselho, um grupo de quatro nações apelidadas de G4 ( Brasil, Alemanha, Índia e Japão), já representaram formalmente a necessidade de uma reforma no órgão. Em 2021 foi publicado um comunicado conjunto dos chanceleres de cada um desses países durante a 76ª sessão da Assembleia Geral da ONU, defendendo a urgência da reforma do Conselho de Segurança.

Para os analistas ouvidos pela reportagem, o desejo de Lula em conseguir uma vaga como membro permanente do Conselho de Segurança dificilmente vai se realizar, mas não é impossível.

"É pouco provável que a sugestão de Lula de incluir o Brasil no Conselho de Segurança seja concretizada neste momento", afirma Brustolin. O pesquisador ainda relembra que o Brasil chegou a ser cogitado para ocupar uma sexta cadeira como membro permanente do Conselho de Segurança da ONU quando o órgão ainda era formado.

"Na Conferência de Dumbarton Oaks, em 1944, onde se discutiu a criação da ONU, o então presidente dos Estados Unidos, Franklin Roosevelt, apresentou a ideia que ele chamou de "tutela dos poderosos", que ficaria a cargo de quatro "estados policiais": Estados Unidos, Reino Unido, União Soviética e China, sendo depois acrescentada a França. O Brasil não estava presente em Dumbarton Oaks, mas foi o único país a ser cogitado para ocupar uma sexta cadeira permanente no Conselho", conta.

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À época, o país havia desempenhado um importante papel na Segunda Guerra Mundial e lutou ao lado dos Aliados contra as tropas nazistas na Itália, o que foi apreciado pelos países que formavam o grupo dos vencedores do conflito.

"O Brasil respeita contratos internacionais e as forças armadas brasileiras já estiveram em muitas missões no exterior. Inclusive, quando o Conselho de Segurança da ONU decidiu que precisava interferir no Haiti para reorganizar a segurança do país, os Estados Unidos deram ao Brasil o comando da operação. Portanto, o Brasil é um país estável, mas mesmo assim é grupo é muito fechado e eles não pretendem compartilhar poder", analisa Furriela.

"O Conselho de Segurança foi criado em um formato que não permite uma representação de todo o planeta", pontua Furriela. O especialista ainda defende que mesmo que o Brasil seja um importante representante da América Latina e possua uma postura irretocável no que diz respeito aos tratados internacionais, não é interessante dividir tamanho poder.

Lula deveria apostar em estratégia "não convencional"

Em 2005, o G4 lançou uma candidatura conjunta para assentos permanentes. “Naquela ocasião, o G4 fez uma campanha mundial e conseguiu bastante apoio, mas acabou optando por não submeter a proposta para votação na Assembleia Geral, pois houve oposição da China e dos Estados Unidos, que também geraram incertezas quanto ao apoio da União Africana – que sofria e sofre forte influência desses países”, rememora Brustolin.

Conforme prevê a carta da ONU, o Conselho de Segurança não pode se opor às decisões aprovadas por dois terços dos 193 países que compõe a assembleia mais um membro do conselho. Essa poderia ser uma das estratégias adotadas pelo governo Brasileiro para fugir da negativa dos países que não querem dividir o poderio do núcleo.

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"O uso abusivo e, por vezes, ilegal do direito de veto, especialmente durante a Guerra Fria, travou o Conselho de Segurança durante muito anos, enfraquecendo-o. A Assembleia Geral passou então a opinar nos assuntos em que o Conselho de Segurança não conseguia chegar a uma solução, mas isso nunca teve qualquer poder direto sobre as decisões do Conselho de Segurança", pontua Brustolin.

"O argumento aqui [em abordar a Assembleia ao invés do Conselho] é o seguinte: embora a ONU seja a organização internacional responsável por manter a paz e embora o Conselho de Segurança tenha exatamente essa atribuição, claramente eles não estão funcionando".

"Em uma perspectiva histórica, o perigo que o mundo atravessa neste momento é que a ONU esteja próxima a um nível de ineficiência de sua principal missão comparável ao da Liga das Nações, em 1939. Naquele momento, o advento da Segunda Guerra Mundial culminou na extinção da Liga das Nações. É importante que não seja necessária uma nova guerra mundial para reformularmos as organizações internacionais que deveriam evitá-la", analisa do professor.

Além do Brasil, outras nações também são cotadas para ocupar um assento permanente no órgão, como a Índia, o Japão, a Austrália e a África do Sul. Furriela ainda comenta que Lula poderia liderar um bloco desses outros países para representá-los no pleito pela reforma do Conselho de Segurança.

Mas, o Brasil não é o primeiro da lista dos países que têm chances de entrar no Conselho de Segurança. Uma opção muito mais viável politicamente seria a Índia, que tem armas nucleares e é um país parceiro importante tanto para os Estados Unidos quanto para a Rússia.

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Reforma do Conselho de Segurança não vai colocar fim na guerra da Ucrânia

"É claro que o mundo mudou bastante desde 1945 [desde a criação da ONU} e muitos países almejam mais poder nas organizações internacionais. Dito disso, a simples ampliação do Conselho de Segurança não resolveria a guerra na Ucrânia", afirma Vitélio Brustolin, que também professor da Universidade Federal Fluminense.

Ele opina que a presença de outras nações com poder de veto poderia ajudar a evitar guerras. "Para contextualizar, no dia 25 de fevereiro de 2022, um dia após a Rússia invadir a Ucrânia, o Conselho de Segurança se reuniu. Dos 15 membros, 11 votaram a favor de uma resolução obrigando a Rússia a se retirar, 3 se abstiveram e só a Rússia votou contra a resolução. O primeiro problema é que a Rússia não poderia ter votado, pois ela descumpriu expressamente a Carta da ONU", disse o pesquisador.

Além disso, Brustolin também explica que países como Estados Unidos e Reino Unido perderam a legitimidade para condenar esse tipo de descumprimento do Direito Internacional. "Esses países também não obtiveram a autorização do Conselho de Segurança para promoverem a invasão ao Iraque em 2003. Guerras de agressão são proibidas pela Carta da ONU, só sendo possíveis com a aprovação do Conselho".

Mas a guerra na Ucrânia é um conflito bem diferente. Ao invés de tentar impor a democracia a um país autoritário, na Ucrânia o Ocidente tenta salvar um país democrático da invasão de uma ditadura.