Pouco a pouco, a elegibilidade do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) dá sinais de que a eleição já está polarizada entre ele e o presidente Jair Bolsonaro (sem partido). Mesmo sem o petista começar a rodar o país e tendo apenas se exposto publicamente e discursado na quarta-feira (10) e neste sábado (13), quando transmitiu ao vivo sua vacinação contra a Covid-19, o peso de seu nome tem feito partidos reavaliarem seus planos para 2022.
Antes de Lula recuperar seus direitos políticos, graças à decisão do ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal (STF), o cenário político era avaliado como "em aberto" por diferentes lideranças políticas no país. Nomes e partidos dos diferentes espectros políticos ensaiavam candidaturas à presidência da República nas eleições do próximo ano. Agora, começam a reavaliar os cálculos.
O deputado federal Rodrigo Maia (DEM-RJ) capitaneia uma frente ampla de centro na tentativa de definir um único nome do campo da centro-direita entre os governadores de São Paulo, João Doria (PSDB), e do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite (PSDB), e entre o apresentador Luciano Huck (sem partido) e Luiz Henrique Mandetta (DEM), ex-ministro da Saúde.
Polarização leva João Doria a reavaliar estratégia eleitoral
Os sinais de que a polarização entre Lula e Bolsonaro enfraquece as demais candidaturas levou Doria a reavaliar sua estratégia eleitoral. Até a decisão de Fachin que tirou os processos de Lula da Lava Jato em Curitiba, o governador de São Paulo se articulava como podia para cacifar seu nome à disputa presidencial.
Com a elegibilidade de Lula, Doria admitiu ao jornal O Estado de S.Paulo que considera a hipótese de concorrer à reeleição ao governo paulista. “Diante deste novo quadro da política brasileira, nada deve ser descartado”, declarou.
Sempre que era questionado sobre a possibilidade de tentar um novo mandato de governador, Doria descartava a reeleição. E ele nunca escondeu de ninguém o desejo de concorrer à Presidência, comenta a reportagem. O tucano, por sinal, tentou "tratorar" dentro do PSDB para ser aclamado candidato.
O governador do maior estado brasileiro nunca conseguiu se viabilizar como um forte candidato, segundo apontaram diferentes pesquisas de intenções de voto. A mais recente, da CNN/Instituto Real Time Big Data, mostra que Doria teria 4% das intenções de votos no primeiro turno. Pelo Instituto Paraná Pesquisas, ele teria 5,3%.
Candidatura de Huck, Eduardo Leite e Mandetta também fica em xeque
Da mesma forma como Doria cogita rever sua estratégia eleitoral, não seria uma surpresa se Huck, Eduardo Leite e Mandetta adotassem a mesma cautela e reposicionamento eleitoral, analisa o deputado federal José Nelto (Podemos-GO). Para ele, nenhum dos nomes atualmente estudados pelo centro político tem chances de romper a polarização.
"A candidatura do Lula polariza e esfria a construção do centro. Pode até tentar reunir o centro para negociar, mas uma candidatura não se sustenta. Esquece Eduardo Leite, Mandetta, Huck, não dão conta", sustenta Nelto à Gazeta do Povo.
Entre os quatro nomes avaliados por Maia para representar a centro-direita, Huck seria o candidato mais forte. Contudo, como diz o deputado do Podemos, nem o apresentador conseguiria furar os polos. Pelo Instituto Paraná Pesquisas, ele aparece com 8,7% num cenário com Fernando Haddad (PT) e sem Doria, seu melhor percentual. Pelo CNN/Instituto Real Time Big Data, com Lula, ele teria 7% das intenções dos votos.
Uma candidatura de Leite ou Mandetta seria ainda mais frágil. O governador do Rio Grande do Sul teria 2,3% das intenções de voto em um cenário sem Lula e sem Doria, aponta o Instituto Paraná Pesquisas. Pela mesma pesquisa, o ex-ministro da Saúde teria 1,4% num cenário sem Huck e com Lula e Doria.
PSOL não descarta abrir mão de candidatura para apoiar Lula
A polarização entre Bolsonaro e Lula é visível pelas duas pesquisas. Pelo CNN/Instituto Real Time Big Data, o presidente da República tem 32% das intenções de voto, enquanto o ex-presidente, o segundo mais bem colocado, tem 18%. Pelo Instituto Paraná Pesquisas, Bolsonaro tem 31% e o o petista tem 21%.
Em meio a essa polarização, o PSOL não descarta apoiar Lula. Na esquerda, a leitura é de que essa aliança a nível nacional entre os partidos poderia assegurar apoio de petistas para uma possível candidatura do psolista Guilherme Boulos ao governo de São Paulo.
“A presença do Lula no debate público reforça a luta da oposição contra o Bolsonaro, mas defendemos que essa discussão [sobre definição de candidaturas] seja travada no momento certo. Queremos criar um espaço formal para discutir a unidade com os partidos”, disse o presidente nacional do PSOL, Juliano Medeiros, ao jornal O Estado de S. Paulo.
Não é à toa que o PSOL cogite apoiar Lula. Nos cenários com o petista, a polarização é predominante e mina candidaturas de centro-direita, centro-esquerda e até as mais à esquerda. Segundo mais votado nas últimas eleições municipais de São Paulo, Boulos teria, pelo Paraná Pesquisas, 3,5% das intenções de voto.
Uma forte candidatura de Boulos é pouco provável no atual momento. Até num cenário sem Lula candidato, com Fernando Haddad em seu lugar, e Ciro Gomes (PDT) na disputa, Boulos teria 3,2%. É bem verdade, contudo, que a maior preocupação do PSOL não é ter a garantia de que elegerá Boulos ou não.
A grande meta do PSOL para 2022 é sobreviver. Para manter recursos do Fundo Partidário e o tempo de rádio e TV para a legislatura seguinte, o partido precisará obter 2% dos votos válidos para deputado federal, ou eleger 11 deputados distribuídos em, pelo menos, nove estados.
Candidatura de Lula puxa além do PSOL: PCdoB e PSB podem aderir
O PSOL não é o único partido que pode aderir à candidatura de Lula. Outro partido que pode sinalizar a adesão ao bloco petista é o PCdoB. Outrora cotado para a disputa do Palácio do Planalto, o governador do Maranhão, Flávio Dino (PCdoB), deixou a pretensão da disputa presidencial de lado e, ainda em dezembro, deu sinais de que a meta para 2022 é a única vaga de seu estado no Senado.
Sem conseguir fazer um candidato na prefeitura de São Luís nas eleições municipais de 2020, Dino se mostra favorável a uma aliança com o PT nos bastidores. Seria uma oportunidade para assegurar sua vaga ao Senado. "Lula consegue puxar PCdoB e PSOL e vamos fazer o possível para ele não levar o PSB também", admite um parlamentar do PDT à Gazeta do Povo.
Uma aliança entre PSB e PT é, hoje, pouco provável. O racha entre os partidos se alastrou após a disputa pela prefeitura de Recife, quando a deputada Marília Arraes (PT) concorreu com seu primo, João Campos (PSB), que se elegeu à capital pernambucana.
O PDT oficializou apoio a Campos em Recife e, em troca, o próprio prefeito admitiu que uma aliança do PSB com Ciro Gomes em 2022 era possível. "O PSB, hoje, não tem vínculos que permitam o PT chantageá-los, como ocorria anos atrás. Não há mais instrumentos de pressão. O problema é se Ciro não conseguir se viabilizar", reconhece o parlamentar pedetista.
Hoje, uma aliança entre PSB e PDT é tida como certo. Ciro, por sinal, já conseguiu o apoio do Rede, de Marina Silva. Mas tudo pode mudar se a candidatura de centro-esquerda não prosperar. "A tendência é que o PSB fique conosco com o Ciro ou em uma frente ampla de centro. Agora, se o Ciro não tiver uma candidatura viável, eles pulam fora. O Carlos Siqueira [presidente peesebista] joga em três times ao mesmo tempo e pula no barco onde vai ganhar", diz a fonte pedetista.
Com Lula fortalecido pela esquerda, Centrão fica com Bolsonaro
Ao passo em que uma candidatura de Lula se fortalece para 2022, o mesmo pode ser dito de Bolsonaro. A aglutinação de forças entre o petista e outros partidos de esquerda fortalece a composição da candidatura à reeleição do presidente da República com os partidos do chamado Centrão: PP, PL, PSD, Republicanos, Avante, Patriota, PTB, PSC e PROS.
O líder do governo na Câmara, Ricardo Barros (PP-PR), acredita que os partidos do Centrão, que já apoiam o governo, continuarão a apoiar Bolsonaro em 2022, e caberá a Lula unir a esquerda em torno de si. "Bolsonaro é favorito. Mesmo com a anulação dos processos, o PT terá muito a explicar durante o processo eleitoral, será objeto do debate da campanha", disse, em entrevista à CNN Brasil.
A aglutinação de forças de Bolsonaro com o Centrão e Lula com a esquerda, naturalmente, só alimenta ainda mais a polarização. E rompê-la não será uma tarefa fácil.
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