Ouça este conteúdo
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) tem buscado usar sua influência política para que o Novo Banco de Desenvolvimento (NBD), também conhecido como "banco do Brics", conceda empréstimos para o governo de Alberto Fernández na Argentina. Além do Brasil, a instituição é composta pelos demais países membros do bloco, como Rússia, Índia, China e África do Sul.
Nessa estratégia, Lula tem contado com o apoio da ex-presidente Dilma Rousseff, que desde março passou a presidir a instituição com sede em Xangai, na China. A petista foi indicada por Lula em uma manobra para que Marcos Troyjo, que havia sido indicado pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), deixasse o posto.
"Estamos trabalhando numa linha de financiamento abrangente (para os argentinos). Não faz sentido que o Brasil perca espaço no mercado argentino, porque esses (países) oferecem crédito e nós, não", disse Lula depois do encontro com Fernández no Itamaraty.
Fernández, por sua vez, chamou Lula de "amigo" e disse que o pedido de ajuda era mais do que natural neste momento de crise. "Quando um amigo está em problemas, o que faz aquele que está em problemas: pede ajuda para os amigos. E os amigos sempre estão aí", afirmou o presidente argentino.
Lula articula para que o banco do Brics aceite a entrada da Argentina
Pela regra atual, o NDB realiza operações de crédito apenas nos países membros do banco. Desde a sua criação, a instituição concedeu apenas um empréstimo para um país não membro, que foi para o Lesoto, um enclave dentro do território da África do Sul. Mas a autorização foi dada, entre outros motivos, porque a ação financiada pelo NDB foi considerada fundamental para a segurança hídrica sul-africana.
Os demais países do Brics consideram que uma excepcionalidade para a Argentina criaria um precedente e outros integrantes poderiam passar a buscar a instituição para socorrer vizinhos em dificuldades. Para conseguir conceder empréstimos à Argentina via banco do Brics, Lula tenta agora viabilizar a entrada de novos países na instituição financeira do bloco.
A defesa da entrada de novos membros no banco tem sido uma das bandeiras de Dilma Rousseff desde que assumiu a presidência da instituição. Em seu discurso de posse, a petista afirmou que "a expansão no número de membros do banco iria fortalecer a nossa base de capital".
“Nosso objetivo, ao expandir o número de países, é buscar uma diversidade ainda maior, tanto em termos de geografia quanto de estágio de desenvolvimento. O objetivo estratégico do NBD é se tornar o banco de desenvolvimento líder para mercados emergentes e países em desenvolvimento”, afirmou Dilma.
Em 2021, em meio à intenção da instituição de ampliar seu alcance, a diretoria do NBD aprovou a entrada dos três primeiros participantes de fora da sigla original: Bangladesh, Emirados Árabes e Egito. O Uruguai também já teve sua participação aprovada e deve ser o próximo a ser formalizado na lista de associados.
Lula promete pacote de ações para retomar "aliança estratégica" com a Argentina
Ainda durante o encontro com Alberto Fernández, o presidente Lula afirmou que os dois países vão adotar um plano com "quase 100 ações" para retomar a parceria estratégica. A Argentina é o terceiro maior parceiro comercial do Brasil no mundo, atrás somente de China e Estados Unidos.
"Hoje, adotamos um ambicioso plano de ação para o relançamento da aliança estratégica. São quase 100 ações que dão concretude ao nosso projeto conjunto de desenvolvimento", afirmou o petista. O presidente brasileiro, no entanto, não detalhou quais serão essas ações estratégicas.
Ainda no discurso, Lula se disse "muito satisfeito" com as "perspectivas" de financiamento do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) para a construção do gasoduto Néstor Kirchner. A obra será responsável por ligar o campo de gás Vaca Muerta, em Neuquén, à localidade de Salliqueló, na província de Buenos Aires.
"Fico muito satisfeito com as perspectivas positivas de financiamento do BNDES à exportação de produtos para a construção do gasoduto Néstor Kirchner", afirmou Lula. O petista disse ainda que o governo brasileiro irá financiar a compra de produtos do Brasil pelo país vizinho por meio de uma ''linha abrangente'', sem dar mais detalhes.
No plano de ação, além do estudo sobre o financiamento de exportações de produtos brasileiros e para a construção do gasoduto argentino, aparece ainda a intenção de estruturar e decidir sobre o financiamento para exportação de blindados Guarani à Argentina. Os blindados Guarani, produzidos em Sete Lagoas (MG), pela empresa Iveco, são os carros de combate mais modernos do Brasil, usados, geralmente em missões de paz.
Enfraquecido, Fernández não vai disputar reeleição na Argentina
O encontro de Fernández com Lula ocorre dois dias depois da data limite para registro das pré-candidaturas na Argentina. Enfraquecido politicamente e com o país enfrentando uma de suas piores crises econômicas, Fernández desistiu de disputar uma reeleição.
Além disso, o atual presidente rompeu com a vice-presidente Cristina Kirchner, principal liderança do peronismo, corrente política do atual governo. Após uma reviravolta, a base governista anunciou Sergio Massa, atual ministro da Economia, como pré-candidato. Massa é aliado de Cristina.
Os argentinos enfrentam uma grave crise na economia, com desvalorização da moeda local e altos índices inflacionários. A inflação anualizada está em 114%. Com isso, o presidente argentino vê na ajuda de Lula uma forma de tentar dar musculatura para a candidatura do seu grupo político neste ano.
A agenda de Fernández no Brasil também incluiu compromissos nesta segunda com o presidente do Congresso, senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG), e com a presidente do Supremo Tribunal Federal, ministra Rosa Weber.