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A declaração do presidente Lula (PT) de que os votos dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) deveriam ser sigilosos, sem que a sociedade saiba como votam os magistrados, não repercutiu bem no Congresso Nacional. Parlamentares de direita e centro-direita criticaram a posição do presidente de restringir a transparência na mais alta Corte judicial do país, em um momento em que Lula precisa se aproximar mais dos congressistas para conseguir montar uma base de apoio.
Mesmo a medida sendo inconstitucional, parlamentares de esquerda decidiram ignorar a fala de Lula, que foi replicada pelo ministro Flávio Dino, da Justiça.
O senador Alessandro Vieira (MDB), correligionária da ministra Simone Tebet (Planejamento), disse que a fala do petista “já merece destaque no concurso de frase mais tosca do ano”. “Caro Lula, a democracia exige justamente o contrário, ou seja, máxima publicidade. Vale a lição histórica de que ‘a luz do sol é o melhor desinfetante’”, completou.
Já o deputado federal Nikolas Ferreira (PL-MG) classificou a declaração como “democracia relativa” em referência a outra fala polêmica do presidente, em meados de junho. Na ocasião, ao comentar a situação política da Venezuela, Lula defendeu o ditador Nicolás Maduro, aliado do petista, que é acusado de diversos crimes contra a humanidade.
A declaração do petista também foi criticada pelo deputado federal Gustavo Gayer (PL-GO), que afirmou que o presidente “quer acabar com a transparência dos votos dos ministros do STF, um dos pilares de uma democracia é saber como as nossas autoridades votam”.
Para o deputado Kim Kataguiri (União-SP), "Lula é um autoritário que nem disfarça mais que odeia a democracia e a transparência".
Ao comentar a frase do presidente, o deputado Coronel Meira (PL-PE) relembrou que "não existe paralelo, no mundo democrático, onde um Supremo tem a prerrogativa do voto secreto".
O ex-juiz da Lava Jato e senador Sergio Moro (União-PR) classificou a fala de Lula como "devaneio presidencial" e chamou a repercussão de "falsa polêmica".
"A questão da segurança dos Ministros é relevante, há medidas que podem ser debatidas e adotadas, mas não essa", disse o senador pelas redes sociais.
Reperecussão fora de Brasília
Além de parlamentares, a declaração de Lula também não foi bem recebida pelo ex-ministro Marco Aurélio Mello, aposentado do STF e criador da TV Justiça em 2002. O magistrado diz que o presidente pode ter cometido um "ato falho", mas, ainda assim, um "arroubo de retórica inconcebível".
O ex-procurador da Lava Jato e ex-deputado, Deltan Dallagnol, disse estar "indignado" com a fala de Lula. "Ele acha que o Supremo Tribunal Federal é Mensalão, é Petrolão para fazer as coisas erradas escondidinho. Se o Supremo legaliza as drogas, se o Supremo libera mensalão, destrói a Lava Jato, a sociedade tem direito de saber", disse Dallagnol.
Já a advogada e ex-deputada, Janaina Paschoal destacou a estratégia usada por Lula para propor o sigilo dos votos dos ministros.
"Muito preocupante a manifestação do Presidente, no sentido de que os votos dos ministros do STF sejam sigilosos. Por óbvio, compreendo o cuidado com a segurança dos Srs. Ministros; entretanto, determinados cargos implicam riscos e pressupõem resistência às críticas. Já disse e repito, Lula é muito inteligente. Ele sabe que o julgamento do Mensalão não teria o desfecho que teve, não fosse o escrutínio popular. Não podemos admitir recuos em termos de transparência. Há tempos, a esquerda ensaia fechar os julgamentos do STF, sob os mais diversos argumentos. Lula, estrategicamente, abraça justificativa difícil de contestar, mas é preciso", disse Paschoal.