O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) vai precisar arbitrar a queda de braço travada entre a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, e o ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, sobre a exploração de petróleo na Foz do Rio Amazonas. A disputa já tem gerado desgastes dentro do governo e pressão por parte da ala ambiental com os setores ligados à Petrobras, responsável pela exploração.
Lula deve bater o martelo sobre sua decisão nos próximos dias, logo após a sua volta do Japão, onde participou do encontro do G7. Publicamente, o petista tem defendido com ênfase a agenda de proteção ao meio ambiente e aborda o tema em todas as viagens internacionais. Porém, ele já indicou que não descarta liberar a exploração de petróleo na região amazônica - posicionamento que é defendido por Silveira.
"Se extrair petróleo da Foz do Amazonas, que é a 530 quilômetros do Amazonas, é em alto mar, se oferece problema para o Amazonas, certamente não será explorado. Mas eu acho difícil, porque é a 530 quilômetros da Amazônia. Eu vou conversar para saber", disse Lula durante sua passagem pelo Japão neste domingo (21).
Na última quinta-feira (18), o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) negou o pedido de licença para a Petrobras perfurar o poço na região do litoral do Amapá. A estatal aguardava apenas essa autorização para iniciar perfuração de teste na bacia da Foz do Amazonas, a cerca de 175 quilômetros da costa amapaense.
O Ibama está sob o guarda-chuva da pasta comandada por Marina Silva, que vem se movimentando contra a proposta da Petrobras, ligada ao ministério de Silveira. Para a chefe da pasta ambiental, a exploração da região pode ter fortes impactos ambientais, enquanto a pasta de Silveira alega que, para suprir a demanda futura do Brasil por petróleo, o país terá de procurar novas fontes, além do pré-sal.
“Não estamos aqui para tornar as coisas difíceis ou fáceis”, disse ela. “Estamos aqui para cumprir a lei”, disse Marina Silva em entrevista à GloboNews.
Na contramão, o ministro de Minas e Energia vê "pseudorrisco" nas críticas à atuação da Petrobras na região. "O que não é de bom senso é que nós não tenhamos conhecimento das nossas riquezas sob o pretexto de um pseudorrisco, que não é em potencial ambiental", afirmou.
Apesar da decisão do Ibama, a expectativa é de que o presidente Lula dê a palavra final sobre o pedido de licença da Petrobras. Além disso, os governadores do Amapá, Clécio Luís (SD), e do Pará, Helder Barbalho (MDB), também participam das negociações.
"Lula disse que ‘haverá de mediar o assunto’ com os ministérios de Minas e Energia e Meio Ambiente. Os governadores do Pará e do Amapá estão abordando esse assunto com presidente da República", afirmou Barbalho.
Diante da disputa dentro do governo, o vice-presidente Geraldo Alckmin (PSB) tentou mediar a questão na semana passada. Ele se reuniu separadamente com Marina e Silveira no Palácio do Planalto. Alckmin, no entanto, preferiu deixar a mediação para Lula, que deve desembarcar no Brasil ainda nesta segunda-feira (22).
A discussão atual gira em torno da exploração de petróleo na foz do Rio Amazonas, que é inédita. O empreendimento, porém, não seria o primeiro em uma área de preocupação ambiental na Amazônia. Há 37 anos a Petrobras tem unidades de produção de petróleo e gás em campos terrestres em plena Floresta Amazônica, a 650 quilômetros de Manaus (AM). O Polo Urucu, que compreende sete concessões de produção em uma área de 350 km² no Amazonas, chegou a ser colocado à venda no governo de Jair Bolsonaro (PL), mas a estatal voltou atrás no ano passado.
Derrota na pauta ambiental resultou em rompimento de Lula e Marina em 2008
A disputa recente entre os ministros do Meio Ambiente e de Minas e Energia segue a mesma linha do embate que Marina Silva travou em 2008 no governo Lula. À época, Marina rompeu com o petista depois que ele decidiu pela construção da Usina de Belo Monte, no Pará, que era defendida pela então ministra de Minas e Energia, Dilma Rousseff.
Quando se demitiu do ministério, Marina dizia sentir não ter mais respaldo de Lula e seu governo para a política ambiental empreendida. Naquele momento, ela era vista por integrantes do PT como entrave para licenças ambientais a grandes obras de infraestrutura. Fora do governo, ela seguiu se colocando como força antagônica à Dilma.
A reaproximação de Marina com Lula só ocorreu durante o período eleitoral do ano passado, depois que lideranças da Rede Sustentabilidade costuraram uma aliança com o PT na disputa presidencial. Aliados de Marina, no entanto, descartam neste momento um novo rompimento com o governo petista.
Dessa vez, além da pressão de Marina Silva contra Alexandre Silveira, ao menos 80 organizações ambientais, entre elas a WWF-Brasil e o Observatório do Clima, entregaram uma nota conjunta aos ministérios de Minas e Energia, dos Povos Originários, de Pesca e Aquicultura, das Relações Exteriores e também ao Ibama, pedindo o arquivamento do processo de licenciamento do bloco.
A principal reivindicação das entidades é de que seja feita uma avaliação ambiental de área sedimentar, uma espécie de estudo estratégico para aprofundar o conhecimento sobre a região.
Líder do governo rompe com Marina e deixa Rede após veto do Ibama
Na esteira de decisão do Ibama de vetar a exploração na foz do rio Amazonas, o líder do governo no Congresso Nacional, Randolfe Rodrigues (AP), anunciou a sua desfiliação do partido Rede Sustentabilidade, fundado por Marina Silva. O líder governista é a favor da exploração de petróleo em seu reduto eleitoral.
"Tenho a certeza de que continuaremos juntos, nas lutas por democracia, justiça e na construção de uma sociedade livre da fome e da opressão. Dito isso, peço, em caráter irrevogável, a minha desfiliação da Rede Sustentabilidade", disse Rodrigues em nota. Agora, o senador negocia sua filiação ao PT.
Além disso, Rodrigues prometeu lutar contra a decisão do Ibama. “A decisão do Ibama contraria pesquisas na costa do Amapá, não ouviu o governo local e nenhum cidadão do meu estado. O povo amapaense quer ter o direito de ser escutado sobre a possível existência e eventual destino de nossas riquezas”, disse Randolfe.
Assim como o senador amapaense, os defensores de que a Petrobras perfure o poço na bacia do rio Amazonas afirmam que uma eventual exploração de petróleo pode ampliar o desenvolvimento na região. O Ministério de Minas e Energia alega que somente após a perfuração é que poderão ser confirmados os indícios de acumulação de petróleo na região.
“Defendo que o Ibama permita que a Petrobras possa pesquisar e, a partir daí, nos critérios ambientalmente corretos, definir qual a metodologia e mecanismo para exploração com menor impacto possível. A partir daí, permitir que essa oportunidade possa surgir”, declarou o governador do Pará, Helder Barbalho.
Ao todo, a Petrobras já reservou US$ 3 bilhões, o equivalente a R$ 15 bilhões para investir em pesquisas na região pelos próximos dois anos. Em nota, a Petrobras informou que pretende recorrer da decisão do Ibama.
O presidente da estatal, Jean Paul Prates, lamentou a decisão do Ibama e indicou que a Petrobras avalia investir na exploração de petróleo de áreas da chamada Margem Equatorial que pertencem à Guiana e ao Suriname.
“Nós temos a possibilidade de voltar a nos internacionalizar um pouco em relação à Guiana, em relação a outros lugares. Talvez, diante da impossibilidade de furar na foz (do Rio Amazonas), a gente possa testar alguma coisa na Guiana e Suriname. A pena é que lá a gente vai ser mais um, aqui a gente é a estatal do pedaço, é a host company, a anfitriã. Por enquanto é só uma ideia, uma conversa interna”, afirmou Prates em entrevista ao jornal O Estado de S.Paulo, publicada neste fim de semana.
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