O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) pretende usar sua viagem à China para tentar se aproximar de setores empresariais e de integrantes do Congresso Nacional resistentes ao seu governo. A comitiva do petista será composta por 240 empresários, sendo 90 representantes do agronegócio, 27 deputados e 12 senadores, além de governadores e ministros. A agenda oficial está prevista para ocorrer entre os dias 27 e 31 de março, incluindo um seminário empresarial e uma visita a Xangai. A viagem estava marcada para sábado (25), mas foi adiada para domingo (26) em razão do quadro de pneumonia leve do presidente.
Nos cálculos do Palácio do Planalto, além de estreitar os laços com o governo chinês, a viagem deve abrir caminho para atrair investimentos para o Brasil para diversos setores do agronegócio e de infraestrutura. A avaliação dos aliados de Lula é de que a agenda deve, inclusive, se sobrepor a viagem que o petista fez neste ano aos Estados Unidos, onde o governo norte-americano apenas indicou a intenção de oferecer um aporte ao Fundo Amazônia.
De acordo com líderes do PT, os chineses ampliaram nos últimos anos os investimentos na América do Sul. Para essa ala, o tamanho da comitiva de Lula na China deve repercutir dentro do governo norte-americano e, com isso, atrair mais investimentos de ambos os países. Além disso, a avaliação interna é de que o Brasil só tem a ganhar com a disputa entre as duas potências mundiais.
Às vésperas do embarque de Lula para a China, a comissão de relações exteriores do Senado dos EUA convidou autoridades do governo Joe Biden para uma discussão sobre o "futuro das relações entre EUA e Brasil".
"A China é hoje o maior parceiro comercial do Brasil e o maior mercado para muitas das commodities brasileiras. Também é o maior investidor em projetos de infraestrutura. A China investiu em construir fortes relações com legisladores e com outros líderes brasileiros. Há uma forte base pró-China no país", disse Duke, assistente de John Kerry, ex-secretário de Estado que esteve no Brasil recentemente.
As exportações brasileiras para a China atingiram US$ 91 bilhões (R$ 478 bilhões) em 2022. As importações foram de US$ 61 bilhões (R$ 320 bilhões). O saldo de US$ 30 bilhões (R$ 157 bilhões) foi responsável por cerca de metade do superávit da balança comercial brasileira no ano passado.
A Europa é a segunda maior parceria comercial do Brasil e, em seguida, os Estados Unidos.
O governo norte-americano tem mostrado preocupação com a expansão da influência chinesa na América Latina. Segundo o Serviço de Pesquisa do Congresso dos EUA, o comércio entre China e América Latina aumentou de US$ 18 bilhões em 2002 para US$ 315 bilhões em 2019.
Parte desse aumento coincidiu com a Iniciativa da Rota da Seda, um agressivo programa de financiamento de obras de infraestrutura em países em desenvolvimento iniciado pela China em 2013.
O programa atingiu seu ápice em 2016 e está declinando nos últimos anos, pois passou a desestabilizar a macroeconomia chinesa. Um levantamento de 2021 mostrou que pelo menos 35% dos projetos da Rota da Seda enfrentaram problemas de corrupção, exploração abusiva de mão de obra e infrações ambientais.
O Brasil não chegou a participar formalmente da iniciativa, mas recebeu capital de Pequim por meio de empresas chinesas instaladas por aqui. A China agora começa a substituir sua Rota da Seda por um programa chamado Iniciativa de Desenvolvimento Global.
Lula faz aceno aos empresários do agronegócio na China
Ainda sem divulgação, o governo brasileiro indicou que pretende assinar pelo menos 20 acordos nas áreas de agronegócio, ciência e tecnologia, comércio, educação e cultura durante sua passagem por Pequim. A China é, desde 2009, o maior parceiro comercial do Brasil e um dos principais destinos de investimentos chineses. Em 2022, a corrente de comércio atingiu recorde de US$ 150,5 bilhões.
A lista de empresários convidados inclui 43 representantes de exportadores de carne bovina, 21 de suínos e aves, cinco de algodão, cinco de insumos, quatro de celulose, um de óleos vegetais (soja), um de arroz e um de reciclagem animal (transformação de sobras de abatedouros em produtos como ração e óleo), além de 21 de entidades multissetoriais, como a Confederação Nacional da Agricultura (CNA) e a Organização das Cooperativas Brasileiras (OCB).
Aliados de Lula avaliam que a viagem será determinante para reduzir as resistências do setor empresarial, que na disputa presidencial do ano passado apoiou o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).
"O grupo de empresários do agro na viagem à China demonstra o prestígio do presidente Lula e marca a aproximação do governo, já nos primeiros meses de mandato, desse setor tão importante para a economia brasileira", defendeu o ministro da Agricultura, Carlos Fávaro. O chefe da pasta embarcou para Pequim ainda nesta segunda-feira (20).
Segundo o Ministério da Agricultura, os custos de viagem e hospedagem serão pagos pelos empresários. O papel da pasta e do governo, de acordo com assessores, é o de facilitar encontros e negócios que os executivos vão ter com chineses.
Entre os convidados estão os irmãos Joesley Batista e Wesley Batista, da J&F. A dupla ficou nacionalmente conhecida em 2017, quando fizeram uma delação premiada contra o então presidente Michel Temer (MDB). À época, Joesley gravou clandestinamente no Palácio do Jaburu, além de governadores, deputados e senadores, de diversos partidos. O grupo denunciou ter repassado, de forma ilícita, quase R$ 600 milhões a campanhas eleitorais de 1.829 candidatos e 28 partidos.
A agenda inclui reuniões com associações de fabricantes de pesticidas e fertilizantes, entre elas a Croplife Asia e a Sinofert, além da Associação Chinesa da Soja. O grupo também pretende se reunir com os representantes chineses da Associação Chinesa para a Promoção da Cooperação Agrícola Internacional, e também de um banco que financia o setor, o Agricultural Bank of China.
Viagem também será usada para Lula se aproximar de integrantes do Congresso Nacional
Além de um aceno ao setor empresarial, Lula pretende usar sua viagem à China para se aproximar de integrantes do Congresso Nacional. O Palácio do Planalto convidou integrantes de diversas bancadas, inclusive da oposição.
Foram convidados os integrantes da frente parlamentar Brasil-China e lideranças do governo na Câmara e no Senado. Do PP foram chamados Fausto Pinato (PP-SP), que é presidente da frente Brasil/China, e Eduardo da Fonte (PP-PE). Do PSDB o convidado é Paulo Alexandre Barbosa (PSDB-SP). O Planalto chegou a convidar alguns nomes do PL, partido do ex-presidente Bolsonaro. Mas, por orientação de líderes da sigla, esses parlamentares acabaram recuando do convite.
Na esteira dessa aproximação, líderes do Palácio do Planalto estiveram presentes no evento de lançamento da frente parlamentar Brasil e China, em Brasília no último dia 15. O evento, que ocorreu em um Centro de Convenções da capital, contou com buffet livre de comida e bebida para os mais de 1 mil convidados.
"O Poder Executivo constrói essa comitiva de relacionamento, mas em conjunto com o Poder Legislativo, que vai debater a legislação e os acordos internacionais", defendeu o deputado Acácio Favacho (MDB-AP), secretário-geral das frente parlamentar.
Presidente do Instituto Sociocultural Brasil-China, Thomas Law, defendeu a adoção de mecanismos para promover discussões mais amplas com o Parlamento chinês. "Além de ter relação comercial muito boa entre os dois países, tem uma relação de diplomacia, uma relação de respeito, uma relação de amizade, que vai completar 50 anos no ano que vem", disse
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