
O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), fez críticas ao ministro da Economia, Paulo Guedes, em dois momentos diferentes desta quinta-feira (20). Um deles no início da tarde, quando disse que o ministro se equivocou nos ataques que fez ao Senado, por conta da decisão dos senadores de derrubar o veto do presidente Jair Bolsonaro ao reajuste de servidores públicos. E o outro foi instantes antes de a Câmara finalizar a votação que manteve o veto.
Maia fez um pronunciamento na tribuna da Câmara em defesa do veto e disse que os deputados "foram atacados pela equipe econômica ao elaborar o projeto do auxílio emergencial", que está sendo pago atualmente aos trabalhadores informais afetados pela pandemia de coronavírus.
As farpas que Maia direcionou a Guedes, no entanto, não fizeram com que o presidente da Câmara atuasse contra o governo na votação desta quinta. Ao contrário: o democrata foi peça decisiva para que os deputados revertessem a decisão dos senadores de derrubar o veto de Bolsonaro.
Ele convocou reuniões com deputados de diferentes partidos, na sua residência oficial e na própria Câmara, para dialogar sobre a votação. A Câmara acabou mantendo o veto, com 316 votos pela continuidade e apenas 165 pela rejeição. Para que a derrubada ocorresse, seriam necessários 247 votos.
"O presidente Rodrigo Maia foi fundamental. Eu ia para Manaus na manhã de hoje [quinta], e ele pediu para que eu ficasse. Ele se dedicou integralmente a essa pauta. 'Desceu' da presidência da Câmara, usou o tempo de líder do DEM para falar com os deputados, foi essencial no processo", declarou o deputado Marcelo Ramos (PL-AM).
Maia valorizou seu trabalho. Em entrevista à BBC Brasil pouco após a conclusão da votação, negou que o resultado representasse uma vitória do governo: "não. Vitória da Câmara, que é a casa que pensa no Brasil".
Do lado do governo, representantes da gestão Bolsonaro no Legislativo se empenharam para "corrigir" a decisão do dia anterior dos senadores. O líder do governo no Congresso, senador Eduardo Gomes (MDB-TO), passou a maior parte do dia na Câmara, ainda que os senadores não tivessem mais atuação na votação desta quinta e com uma deliberação sobre o Fundeb agendada na mesma hora no Senado. Já Ricardo Barros (PP-PR), empossado nesta semana como líder do governo na Câmara, também se desdobrou entre reuniões e ligações aos deputados de diferentes partidos.
"O novo líder Ricardo trabalhou desde muito cedo para construirmos o entendimento. E Eduardo Gomes também. Estivemos muito unidos desde o início da manhã, e tudo isso nos levou ao resultado que buscávamos", disse o deputado Hiran Gonçalves (PP-RR).
Ramos e Gonçalves estiveram ao lado de Maia, Gomes e Barros na entrevista do início da tarde, quando o presidente da Câmara fez as críticas a Guedes. Junto a eles estavam também os líderes de MDB, Novo, PV e DEM. A aparição conjunta dos parlamentares foi uma sinalização de que a tendência da Câmara era a de manutenção do veto.
Guerra de números
A votação do veto foi precedida de discursos dos deputados sobre a saúde das finanças brasileiras. Apoiadores do governo ou membros de partidos de centro que defendiam a derrubada alegavam que a concessão de aumentos a servidores no cenário de pandemia poderia prejudicar o desempenho do poder público no atendimento aos cidadãos. "Não existe respeito ao servidor com o Estado quebrado", falou o líder da Maioria na Câmara, Aguinaldo Ribeiro (PP-PB).
Já os adversários da gestão Bolsonaro alegavam que a derrubada do veto não representava a concessão automática de aumento aos servidores, e que o governo poderia buscar outras fontes de economia. O deputado André Figueredo (PDT-CE) lembrou que o trecho da lei vetado por Bolsonaro foi aprovado pelo próprio Congresso: "Então quando votamos [no primeiro semestre] fomos irresponsáveis? O Senado foi irresponsável quando vetou?".
Os oposicionistas também questionaram declarações de integrantes da equipe econômica de que a derrubada do veto representaria um prejuízo superior a R$ 100 bilhões aos cofres públicos. Carlos Zarattini (PT-SP) e Glauber Braga (Psol-RJ), entre outros deputados, disseram que a origem da conta não foi esclarecida.
Na mão oposta, a questão da responsabilidade foi mencionada por muitos parlamentares que pediram a manutenção do veto. Para Marcelo Ramos, a votação desta quinta revela que a "bancada da responsabilidade" é majoritária na Câmara. "Existe um núcleo na Câmara, que é maioria, que é muito comprometido, que tem muito cuidado para não comprometer as contas públicas", disse.
A análise de Hiran Gonçalves é semelhante: "as bancadas entenderam que o melhor que poderíamos fazer era passar um sinal de responsabilidade com as contas públicas".
Tudo começou com o auxílio a estados e municípios
O veto mantido pelos deputados nesta quinta foi imposto por Bolsonaro a artigos da Lei Complementar 173, que foi aprovada em maio pelo Congresso e sancionada pelo presidente no mesmo mês.
A Lei regulamenta o auxílio de R$ 120 bilhões que a União concedeu a estados e municípios em virtude da pandemia de coronavírus. O socorro foi efetuado com repasses diretos e também com a suspensão de dívidas das prefeituras e governos estatais com a União e bancos públicos.
Como contrapartida, a proposta original do governo determinava que todos os braços do poder público não poderiam conceder reajustes salariais a servidores públicos até o fim de 2021. Mas a tramitação no Congresso fez com que algumas categorias de servidores fossem excluídas da restrição. O veto de Bolsonaro, mantido nesta quinta pelo Congresso, fez com que a limitação permanecesse.
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