Formado por cerca de 20 senadores, o grupo Muda Senado tem mostrado preocupação com os recentes ataques à Lava Jato. No dia 6, o grupo assinou um manifesto mostrando preocupação com a “crescente escalada de ações e manifestações” contra a operação. Em entrevista à Gazeta do Povo, o senador Major Olímpio (PSL-SP), integrante do grupo, diz haver um ataque coordenado e premeditado à Lava Jato com o objetivo de “satanização” das investigações e dos integrantes da força-tarefa. O objetivo seria possibilitar a anulação dos processos e das provas colhidas ao longo da operação.
Olímpio também se mostra preocupado com a ofensiva da Procuradoria-Geral da República (PGR) em busca do compartilhamento dos bancos de dados das forças-tarefas. “Nós temos uma preocupação de que esse compartilhamento seja utilizado sim como instrumento de pressão política, de todas as formas. Seja pela Procuradoria, seja pelo Poder Executivo, para manter sob um garrote partidos políticos e parlamentares que hoje poderiam ser resistentes a votar com o governo”, diz o senador.
O parlamentar afirma ainda que, em sua visão, há um conluio de forças para enfraquecer o ex-ministro Sergio Moro, que foi juiz da operação. “Existe esse pragmatismo hoje, com a visão em 2022, com uma união que pareceria impossível um tempo atrás: os bolsonaristas e os petistas, de mãos dadas, fizeram tudo para destruir o Moro.”
Olímpio, que até pouco tempo atrás era aliado de Jair Bolsonaro, acusou o presidente de ter abandonado a pauta de combate à corrupção no Brasil por motivos políticos. “No momento em que o presidente começou a avaliar o Sergio Moro como inimigo e não como possivelmente o mais forte dos aliados, ele começou a execrar até a saída do Moro. E hoje desconstruir o Moro é um dos objetivos do presidente”, disse.
Confira a entrevista completa com o senador Major Olímpio:
O Muda Senado divulgou uma nota em defesa da Lava Jato recentemente. O grupo enxerga um movimento coordenado de ataques à operação?
Major Olimpio: Eu não tenho a menor dúvida de que é coordenado e premeditado. E aí tem um conluio terrível que está envolvendo o Poder Executivo (entenda-se aqui a própria Presidência da República), a Procuradoria-Geral da República, membros do Supremo Tribunal Federal (ou ao menos o presidente do Supremo Tribunal Federal), advogados defensores de criminosos que foram condenados ou estão processados, e empresas envolvidas na Lava Jato. Logicamente há ainda a articulação de partidos políticos [contra a Lava Jato].
Na visão do senhor, qual é o objetivo desses ataques?
Major Olimpio: Em um primeiro plano, há um processo de satanização da Operação Lava Jato e de seus integrantes. A ideia é a seguinte: para absolver acusados, anular julgamentos e processos, principalmente o do Lula, é necessário fazer a satanização do Sergio Moro, dos procuradores da Lava Jato, da Polícia Federal e da Receita Federal – que atuaram na operação.
O senhor acredita que há uma motivação política por trás disso?
Major Olimpio: Em relação ao Sergio Moro, há uma articulação perfeita, uma comunhão de inimigos. Tanto o PT quanto o Bolsonaro, tanto o grupo Lula quando o grupo Bolsonaro, querem a destruição do Sergio Moro. Porque ambos têm medo de o Moro entrar no processo eleitoral para 2022. O PT já tinha escolhido o Bolsonaro como adversário para o segundo turno; e o Bolsonaro já tinha escolhido o PT como adversário no segundo turno. Quando você põe o fator Moro na parada, pode jogar areia na carroça de qualquer um dos lados. Pode ter um segundo turno do PT contra o Moro, ou do Bolsonaro contra o Moro, ficando o PT ou Bolsonaro de fora. Existe esse pragmatismo hoje; uma união que pareceria impossível um tempo atrás: os bolsonaristas e os petistas, de mãos dadas, fizeram de tudo para destruir o Moro.
Na opinião do Muda Senado, quais são os ataques mais preocupantes?
Major Olímpio: Neste momento, é esse julgamento do Deltan no dia 18 [próxima terça-feira] no Conselho Nacional do Ministério Público [Deltan será julgado por supostas infrações a normas do MPF]. Nós entramos com um pedido no Conselho Nacional do Ministério Público, assinado por oito senadores do Muda Senado, em que pedimos que seja avaliado o impedimento do conselheiro [Luiz Fernando] Bandeira, que é o secretário-geral do Senado hoje, como relator do processo do Deltan. Porque um dos processos é justamente por manifestações dele [Deltan] contra o [senador] Renan Calheiros. E o Renan Calheiros é quem fez a indicação do Bandeira para o CNMP como representante do Senado. Depois, o nome dele foi ratificado, recentemente, pela administração do [presidente do Senado, Davi] Alcolumbre por mais um período. Então é tendencioso, da posição dele, tentar promover já no dia 18 um afastamento cautelar do Deltan da coordenação da Operação Lava Jato. Aí é uma paulada. Além disso, no dia 9 de setembro termina o limite de prazo de duração da Operação Lava Jato, que normalmente tem sido renovada [pela PGR]. Mas se vê claramente que o Augusto Aras [procurador-geral da República] dá sinais para criar a Unac, ligada a um órgão da Procuradoria-Geral da República. E isso extinguiria esse modelo de força-tarefa [pois a Unac seria um órgão criado justamente para centralizar em Brasília as grandes investigações de corrupção do país].
Alguns procuradores temem o uso político de informações da Lava Jato contra adversários do governo. Ainda mais depois dessa ofensiva pelo compartilhamento de dados da investigação. O Muda Senado tem essa preocupação?
Major Olímpio: Nós temos. É uma preocupação que nós temos, sim. Porque tem uma insistência muito grande [em conseguir as informações]. O fato de a Lava Jato ter 38 mil pessoas citadas no relatório do Coaf e de ter 350 terabytes [de dados] deveria ser aplaudido pelos órgãos de governo como um todo, as instituições como um todo, principalmente pela Procuradoria-Geral da República. É um sinal de eficiência [mas Augusto Aras recentemente criticou a quantidade de informação sob guarda da Lava Jato]. Na verdade, nós temos uma preocupação que esse compartilhamento seja utilizado sim como instrumento de pressão forma política, de todas as formas. Seja pela Procuradoria, seja pelo Poder Executivo, para manter sob um garrote partidos políticos e parlamentares que hoje poderiam ser resistentes a votar com o governo. Tudo isso é uma preocupação nossa. Nós queremos um Ministério Público absolutamente independente e isento. E, logicamente, qualquer compartilhamento dessa natureza fere a legislação e fere princípios democráticos. O fato de alguém ser procurador-geral da República não significa que a legislação faculte que todas as investigações devam ser de seu pleno conhecimento. O fato de ser presidente da República, menos ainda. Ser ministro da Justiça, menos ainda. Ser representante do Ministério Público, mas que não esteja efetivamente ligado aquela investigação... Evitar tudo isso é justamente para proteger a independência do Ministério Público.
Como o Muda Senado avalia o comportamento do procurador-geral da República em relação à Lava Jato?
Major Olímpio: A gente vê com preocupação. Nós até pedimos uma reunião com ele. Tivemos uma reunião bastante cordial, mas incisiva em relação a questioná-lo a respeito disso. Foi até no dia seguinte a uma live que ele fez com advogados [na qual criticou a Lava Jato]. Eu fui o primeiro a fazer os questionamentos e, talvez na minha forma de ser, possa ter parecido mais incisivo. É o meu jeito de ser mesmo... Ele também deu as explicações dizendo que o que ele quer é justamente defender a isenção do Ministério Público, que não quer a espetacularização de ações. Ele fez as abordagens dele. Foi muito respeitoso com o Muda Senado. Dois dias depois, nós falamos com os procuradores das forças-tarefas, principalmente da Greenfield, e da Lava Jato em São Paulo, Rio e Curitiba. Ouvimos os procuradores, as preocupações deles. E isto é o que nós estamos realizando. O Senado tem obrigação de se posicionar. Mas nós não somos o Senado. Somos um grupo de senadores e não respondemos nem pela administração do Senado. Nós respondemos por nós, pelo grupo de 20 senadores do Muda Senado.
O senhor enxerga iniciativas no Congresso que sejam preocupantes?
Major Olímpio: Sem a menor dúvida. A tentativa de abrir uma CPI contra a Lava Jato, que tem 176 assinaturas, foi mais um movimento dessa orquestração do Legislativo para tentar satanizar e massacrar aqueles que estavam fazendo seu trabalho e que, até bem pouco tempo atrás, eram aplaudidos nas ruas pela população brasileira. Conseguiram mais do que as 171 assinaturas necessárias. Conseguiram 176. E estão tentando fazer um movimento que eu vejo mais como uma tentativa de escrache da operação Lava Jato. Só isso.
Temos um governo eleito com um discurso muito forte de combate à corrupção. O senhor acredita que o governo abandonou essa pauta?
Major Olímpio: Totalmente. Desde o primeiro dia. Desde a retirada do Coaf [ Conselho de Controle de Atividades Financeiras] do Ministério da Justiça. Desde as ações de enxugamento da estrutura da Polícia Federal e da Receita. Desde a tentativa do presidente em intervir na Polícia Federal. Desde ações, sanções ou vetos do presidente no pacote anticrime, na lei de abuso de autoridade. Desde a leniência do Executivo de não colocar a base do governo se mobilizando para ter a prisão após a segunda instância, para ter o fim do foro privilegiado. Acabou. Um dos motivos que o povo colocou Bolsonaro na Presidência... O primeiro foi: "Vamos tirar a esquerda"; isso ele fez. O segundo, resgatar a segurança pública. E o terceiro foi combate intransigente à corrupção. O Sergio Moro e a Operação Lava Jato foram utilizados por todos nós – porque eu fiz a campanha junto com o Bolsonaro – como um exemplo do que queríamos fazer. Começou o governo e, por problemas de ordem pessoal, às vezes familiares, às vezes política, foi tudo abandonado. E, ao contrário, no momento em que o presidente começou a avaliar o Sergio Moro como inimigo e não como possivelmente o mais forte dos aliados, ele começou a execrar o Moro, até a saída dele [do governo]. E hoje desconstruir o Moro é um dos objetivos do presidente.
O que fazer para impedir retrocessos no Brasil em relação ao combate à corrupção?
Major Olímpio: Não dá para garantir. Porque existe esse conluio, esse alinhamento da cúpula do Executivo com uma força viva dentro do Congresso, com a cúpula da Procuradoria-Geral, com integrantes da cúpula do Supremo... Então é muito difícil para a sociedade hoje. Ou mesmo para nós, como esse grupo de 20 senadores, nos contrapormos contra a maioria do Senado ou a maioria do próprio Legislativo. Ainda mais com essa conjunção de astros querendo passar uma borracha no passado e dizer: "Não aconteceu nada, vamos começar de novo". Isso seria o retrocesso do retrocesso. É a vitória esperada para dizer que ser criminoso no país, principalmente nos crimes políticos e de colarinho branco, ainda é um excepcional negócio.
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