O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) André Mendonça defendeu nesta quinta-feira (20) que seus colegas de Corte, Flávio Dino e Alexandre de Moraes, sejam impedidos de julgar a denúncia contra o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) por suposta tentativa de golpe de Estado. Mendonça foi o último a votar e o único a divergir da maioria em dois dos quatro recursos analisados.
No recurso apresentado pelo ex-ministro Walter Braga Netto, Mendonça considerou que Moraes é vítima nos fatos investigados, contudo entendeu que o caso é de impedimento, não de suspeição como defendeu o general. (Veja a diferença entre suspeição e impedimento abaixo)
Segundo as investigações, a suposta trama golpista incluía um plano para assassinar o presidente Lula (PT), o vice-presidente Geraldo Alckmin (PSB) e o ministro Alexandre de Moraes. Em um dos pedidos feitos pela defesa de Bolsonaro, ele apontou que Dino não poderia analisar a denúncia por mover uma ação penal contra o ex-presidente.
Em outros dois recursos, o ex-mandatário pediu o impedimento de Cristiano Zanin e o general da reserva Mario Fernandes solicitou que Dino fosse removido do julgamento. Nestes casos, Mendonça acompanhou a maioria para manter os ministros.
Nas ações em que são parte, Moraes, Zanin e Dino não votaram. O placar final ficou em 9 votos a 1 para manter Moraes e Dino no julgamento, e 10 votos a 0 pela manutenção de Zanin. Com isso, os três vão julgar a denúncia da Procuradoria-Geral da República (PGR) a partir da próxima terça (25).
A análise ocorrerá na Primeira Turma, formada por apenas 5 ministros: Moraes, Dino Zanin, Cármen Lúcia e Luiz Fux. As defesas solictaram que o caso fosse transferido para o plenário, composto por 11 ministros. No entanto, o presidente da Corte, Luís Roberto barroso, negou o pedido.
Nunes Marques diz que Dino e Zanin não têm “interesse” em inquérito do golpe
Indicado ao STF por Bolsonaro, Nunes Marques acompanhou a maioria e votou pela rejeição dos recursos do ex-presidente. O ministro considerou que Dino e Zanin não têm “interesse de natureza extrapenal” em um “eventual desfecho desfavorável do processo”.
Nunes Marques também defendeu a permanência de Moraes no caso, citando o voto de Barroso no recurso de Braga Netto. Para o magistrado, o “cuidadoso exame dos autos revela que o arguente [Braga Netto] já vinha sendo investigado no âmbito de procedimento criminal de relatoria do Min. Alexandre de Moraes e já tinha pleno conhecimento dos fatos criminosos que, mais recentemente, vieram constar formalmente da denúncia contra ele oferecida”.
Já no recurso de Fernandes, Nunes Marques apontou que a atuação de Dino como ministro da Justiça se limitou à “supervisão administrativa da Polícia Federal, conforme previsto no art. 87 da CF, sem interferir na atividade finalística”. Ele lembrou ainda que as declarações do colega não podem ser motivo de exclusão, pois a regra estabelece que o impedimento depende de “circunstâncias objetivas relacionadas a fatos internos ao processo capazes de prejudicar a imparcialidade do magistrado”.
Entenda voto de Mendonça nos recursos
Bolsonaro pediu que Cristiano Zanin fosse declarado impedido de analisar a denúncia por já ter atuado como advogado em ações contra ele. Antes de assumir a vaga no STF, Zanin foi advogado do presidente Lula (PT) e da campanha petista em 2022. Mario Fernandes pediu o impedimento de Dino, argumentando que o ministro deu "declarações públicas a respeito dos fatos investigados". Os dois recursos foram negados por 10 a 0.
O ex-presidente também pediu que Dino fosse excluído do julgado. Diferente de Fernandes, a defesa de Bolsonaro apontou que o ministro moveu uma queixa-crime contra ex-mandatário em 2021, quando era governador do Maranhão. Na ocasião, o então presidente disse, em entrevista à rádio Jovem Pan, que Dino teria negado um pedido do Gabinete de Segurança Institucional (GSI) para que a Polícia Militar garantisse sua segurança durante uma agenda no estado.
Além disso, citou que a ação de Dino ainda está em tramitação no Supremo, representando “prova da efetiva parcialidade do Magistrado”. Neste caso, Mendonça abriu divergência e afirmou que, “se há fator de distinção entre as searas cível e criminal, especificamente no que tange às hipóteses de impedimento e suspeição do magistrado, a distinção deve ensejar a aplicação de tratamento mais protetivo no campo penal; e não o contrário”. O placar ficou em 9 a 1.
Já Braga Netto solicitou que o relator do caso, Alexandre de Moraes, fosse declarado suspeito e excluído do julgamento. Mendonça afirmou que a suspeição de Moraes seria “intempestiva”, mas o argumento da defesa de Braga Netto sobre “a perda de imparcialidade do julgador no caso em que se apura atuação criminosa que envolvia plano para sua prisão e morte” corresponde a situação de impedimento do ministro. O placar deste recurso também ficou em 9 a 1.
Diferença entre suspeição e impedimento
A suspeição estabelece as hipóteses em que o magistrado fica impossibilitado de exercer sua função em determinado processo, por exemplo, devido a um vínculo subjetivo (relacionamento) com algumas das partes, fato que compromete seu dever de imparcialidade, segundo o Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJDF).
Já o impedimento prevê, de forma objetiva, situações em que o magistrado fica impossibilitado de atuar, independe de sua intenção no processo ou de sua relação com as partes. “As causas de impedimento também decorrem do dever de imparcialidade do juiz, mas se referem à sua relação com o processo”, explica o TJDF. Entre as possibilidades para impedimento de juízes estão:
- Caso seu cônjuge ou parente tenha de alguma forma atuado no processo;
- Quando o próprio juiz tiver exercido outra função (advogado, servidor por exemplo) no mesmo processo;
- Tiver atuado como juiz no mesmo processo em instância inferior;
- Quando o próprio magistrado, seu cônjuge ou parentes forem parte no processo, ou tenham interesse direto na causa.
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