A articulação do Planalto para eleger aliados nas presidências da Câmara e do Senado tem uma característica inédita após a redemocratização nos anos 1980. Pela primeira vez em décadas, militares estão à frente de todo esse processo no Planalto. E quem comanda as conversas é o general da reserva Luiz Eduardo Ramos, ministro-chefe da Secretaria de Governo.
O diálogo que definirá os rumos da governabilidade do Executivo com o Legislativo, no entanto, não se limita a um único militar. Sob a ordem de Ramos, outros atores oriundos das Forças Armadas, de forma discreta, participam do processo diário de articulação com o Congresso na Secretaria de Governo – que trabalha de acordo com as orientações de Jair Bolsonaro. E, nesse aspecto, os militares palacianos estão alinhados ao presidente
Na Câmara, Bolsonaro tem preferência pelo líder do Centrão, deputado Arthur Lira (PP-AL), para presidir a mesa diretora da Casa. E assim também se posicionam os militares do Planalto nos bastidores. No Senado, após a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que barrou a tentativa de Davi Alcolumbre (DEM-AP) de se reeleger, o Planalto vai apoiar a candidatura do senador Eduardo Gomes (MDB-TO), líder do governo no Congresso. Alcolumbre era tido como o candidato de Bolsonaro até a decisão do STF.
Como os militares veem a escolha de Artur Lira
Os oficiais palacianos das Forças Armadas demonstram lealdade a Bolsonaro e quase se limitam a dizer que cumprirão a “missão” dada pelo presidente. “O Arthur Lira é o nome do presidente [na Câmara]. Então, é ele que será apoiado”, diz um interlocutor militar do governo.
“Não há preferência [entre os militares]. O que se tem é que o governo precisa entrar com um nome forte capaz de conquistar a presidência da Câmara. Evidentemente que é uma decisão dos deputados. Mas o Planalto vai ter sua preferência natural, alguém mais alinhado com as pautas do governo”, sustenta um assessor militar palaciano.
Tida como um possível plano B do Planalto para o caso de a candidatura de Lira perder força, a deputada licenciada e ministra da Agricultura, Tereza Cristina (DEM), é vista com muito pragmatismo entre os militares. “É um nome forte. Um dos melhores, analisando aos olhos do Planalto – o que não quer dizer que outros não sejam [bons]. Vai ter que se viabilizar, assim como o próprio Arthur Lira. Ele vai ter que construir consenso para que entre com as melhores chances de ganhar”, diz o assessor.
Mas, por ora, o nome do Planalto (e dos militares) é mesmo o de Lira. E esse apoio entre os integrantes das Forças Armadas do governo vai além da Secretaria de Governo, embora seja ela o único braço que, institucionalmente, vai mover esforços políticos para que ele vença a eleição interna da Câmara, marcada para fevereiro. Também comandada por militares, a Casa Civil e o Gabinete de Segurança Institucional (GSI) atuam – e assim continuarão – como meros espectadores da eleição no Congresso.
Como os militares veem os outros pré-candidatos na Câmara
Outros pré-candidatos na disputa pela presidência da Câmara são vistos de forma diferente pelo núcleo militar do Planalto. O deputado Marcos Pereira (Republicanos-SP), vice-presidente da Câmara, tem o apoio da bancada evangélica, mas alguns militares acreditam que, na “hora H", ele nem sequer lançará candidatura.
Já o deputado Baleia Rossi (SP), presidente nacional do MDB, é apontado como o real candidato do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e, por isso, não deve receber o apoio de Bolsonaro.
Outros pré-candidatos – como os deputados Marcelo Ramos (PL-AM), Aguinaldo Ribeiro (PP-PB) e Elmar Nascimento (DEM-BA) – também são vistos como postulantes como candidatos de Maia, mas com baixíssimas possibilidades.
Quem é o candidato do Planalto no Senado
Embora o presidente do Senado, Davi Alcolumbre, fosse o candidato de Bolsonaro no Senado, a decisão do STF de barrar a reeleição dele provocou um certo alívio no governo, segundo fontes militares e civis do Planalto. O receio era que o STF também permitisse a reeleição de Rodrigo Maia. E o presidente da Câmara é visto no governo como oposição a Bolsonaro.
Agora, o Planalto vai apoiar a candidatura do senador Eduardo Gomes (MDB-TO), líder do governo no Congresso. Embora Gomes seja do MDB, o nome do partido seria o do senador Eduardo Braga (MDB-AM), líder da sigla na Casa. O Planalto, porém, admite abrir negociações com a legenda.
Fontes do Planalto dizem que o governo já sugeriu que Gomes procure, desde já, viabilizar sua candidatura. Quanto mais apoios ele tiver, menor será o custo de apoio ao líder do governo. Ainda na segunda-feira (7), integrantes da articulação do governo no Senado começaram a discutir as estratégias para apoiar o parlamentar, com anuência da Secretaria de Governo.
Do último articulador militar da ditadura ao general Ramos
Antes do general Ramos, o último militar a exercer o papel de interlocução do Planalto com o Congresso havia sido o general Golbery do Couto e Silva, ex-ministro da Casa Civil, que exerceu o posto ao fim da gestão de Ernesto Geisel e no início do governo de João Figueiredo, entre março de 1974 e agosto de 1981, ainda durante a ditadura militar.
O general Golbery exerceu papel na área de inteligência, sendo um dos criadores do Serviço Nacional de Informações (SNI), criado com o objetivo de supervisionar e coordenar as atividades de informações e contrainformações no Brasil. Mas também foi o responsável por funções de articulação, a ponto de ter conduzido o processo de abertura política.
Golbery participou ativamente do processo político que culminou na presidência de Marco Maciel na Câmara. Posteriormente, Maciel viria a ser um dos articuladores políticos, como ministro da Casa Civil, do primeiro presidente civil após a ditadura, José Sarney (1985-1990).
Décadas se passaram para um militar voltar a ter esse papel. E, ao menos no início do governo Bolsonaro, a função ainda era exercida por um civil. Antes de colocar Ramos na Secretaria de Governo, quem tinha esse papel é o atual ministro da Cidadania, Onyx Lorenzoni (DEM), que ocupou a Casa Civil no início da administração de Bolsonaro.
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