A ministra Rosa Weber, do Supremo Tribunal Federal (STF), determinou a suspensão "integral e imediata" da execução das chamadas emendas parlamentares de relator, que criam o que foi batizado de orçamento "secreto" ou "paralelo". Ela ainda mandou que o governo federal e o Congresso publiquem documentos detalhando a destinação e os responsáveis pela indicação dos recursos já liberados.
A decisão, de caráter liminar, atende a pedidos protocolados pelos partidos Psol, Cidadania e PSB, que apontam a falta de publicidade no direcionamento dessas verbas. Não se sabe ao certo o quanto é liberado por indicação de cada parlamentar e com quais critérios, mas apenas os programas de governo e os ministérios responsáveis por eles. Isso porque os pedidos de liberação das verbas junto aos ministérios são feitos de forma informal e sem publicação oficial, o que dificulta o acompanhamento e a fiscalização.
No Orçamento deste ano, foram reservados R$ 18,5 bilhões para as emendas de relator, do total de R$ 35,5 bi para emendas parlamentares. Ao contrário destas, no entanto, onde está indicado qual deputado ou senador pediu a verba, nas emendas de relator todas aparecem em nome do relator-geral do Orçamento. Trata-se, na verdade, de um artifício para ocultar o parlamentar que indicou a destinação do recurso.
Desde o ano passado, essas emendas são liberadas pelo governo de acordo com a adesão de deputados e senadores à aprovação de propostas do interesse do Planalto ou do Centrão. O controle da liberação, neste ano, está concentrada nas mãos do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e do ministro da Casa Civil, Ciro Nogueira. Para Rosa Weber, falta transparência.
"Mostra-se em tudo incompatível com a forma republicana e o regime democrático de governo a validação de práticas institucionais por órgãos e entidades públicas que, estabelecidas à margem do direito e da lei, promovam o segredo injustificado sobre os atos pertinentes à arrecadação de receitas, efetuação de despesas e destinação de recursos financeiros, com evidente prejuízo do acesso da população em geral e das entidades de controle social aos meios e instrumentos necessários ao acompanhamento e à fiscalização da gestão financeira do Estado", escreveu na decisão.
A liminar ainda deverá ser submetida ao plenário, que vai decidir se mantém ou não a suspensão dos pagamentos. O presidente do STF, Luiz Fux, decidiu colocar o tema em julgamento virtual, que ocorre de maneira remota, nos próximos dias 9 e 10 de novembro.
Impacto no teto de gastos
Como mostrou a Gazeta do Povo nesta semana, a suspensão do pagamento afeta não somente a relação do Executivo com o Legislativo, mas pode impactar também o teto de gastos, a âncora fiscal do país que está ameaçada pela PEC dos Precatórios, que muda a forma de cálculo do limite de despesas anuais da União.
O teto de gastos corrige o valor com base na inflação verificada de julho a junho; a proposta em discussão considera o período de janeiro a dezembro, o que aumenta o índice e poderá abrir um espaço fiscal de ao menos R$ 90 bilhões extras no Orçamento de 2022. Daria para pagar o novo benefício social prometido pelo presidente Jair Bolsonaro, mas também aumentar o valor das emendas de relator, o fundo eleitoral e outras benesses de interesse dos políticos num ano eleitoral.
Se o STF considerar as emendas de relator inconstitucionais, cria-se a possibilidade de reduzir o montante que furaria as regras do teto atual.
"A ministra Rosa Weber impediu a continuidade do 'jabá orçamentário bilionário'. O STF confirmou o que todos sabiam. As emendas de relator são inconstitucionais. O pior e mais promíscuo instrumento de barganha entre o Executivo e o Legislativo nas últimas décadas foi interrompido pelo STF", disse à reportagem o presidente da ONG Contas Abertas, Gil Castello Branco, que monitora as contas públicas.
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