Ouça este conteúdo
Após o presidente Jair Bolsonaro ter dito que “Forças Armadas decidem se povo vai viver em uma democracia ou ditadura” e após o procurador-geral da República, Augusto Aras, ter defendido um “estado de defesa” visando preservar a estabilidade institucional, o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Luiz Fux, tem sido pressionado por uma ala de ministros a dar respostas mais incisivas ao presidente da República contra o que eles chamam de “arroubos antidemocráticos” advindos do Palácio do Planalto.
Durante a semana, ministros como Gilmar Mendes e Alexandre de Moraes têm deixado claro nos bastidores que o STF precisa intensificar seu papel institucional de garantir a boa convivência entre os três poderes e conter eventuais excessos do presidente da República.
A ideia dos ministros é que o Supremo dê recados mais claros ao Poder Executivo, quer seja por meio de notas ou ações efetivas da Suprema Corte, como a intensificação de investigações que afetam diretamente ou indiretamente o presidente, entre as quais, o inquérito das fake news ou dos atos antidemocráticos.
Outra possibilidade de resposta ao Poder Executivo é a concessão de liminares relacionadas ao combate à pandemia da Covid-19 que vão de encontro à algumas teses que já foram defendidas pelo governo federal, como, por exemplo, a do tratamento precoce contra o coronavírus com medicamentos como a cloroquina.
Um exemplo desse tipo de reação mais incisiva de defesa do STF esperada pelos ministros ocorreu esta semana. Na segunda-feira (18), o STF se manifestou pelas suas redes sociais negando que tenha proibido o presidente de tomar ações no combate à pandemia da Covid-19.
Na sexta-feira da semana passada, Bolsonaro afirmou em uma entrevista ao apresentador José Luiz Datena que por decisão do STF “eu tinha que estar na praia uma hora dessas, tomando uma cerveja. O Supremo falou isso para mim”.
A afirmação de Bolsonaro foi uma referência a decisão o STF que deu autonomia a estados e municípios adotar medidas de combate à Covid-19, em abril do ano passado, como restrições ao funcionamento do comércio e de outras atividades não essenciais. A decisão, contudo, não eximiu a União de sua responsabilidade de gestora das políticas públicas de enfrentamento da pandemia.
Fux não quer atritos contra Bolsonaro, mas promete defender STF
Esse tipo de insatisfação dos ministros já chegou ao presidente da Corte. Luiz Fux, por sua vez, já deixou claro aos colegas que não quer confronto com o governo ou com o presidente da República.
Apesar disso, Fux já sinalizou que vai fazer o que precisa para defender os interesses do tribunal. Por isso, a tendência é que o presidente do Supremo adote medidas de caráter conciliatório com o Poder Executivo. Na prática, Fux almeja manter um clima ameno entre o STF e a União por entender que um conflito entre os dois poderes tende a ser danoso para ambos.
Outro ponto que tem sido alvo de crítica dos ministros do STF é a postura do procurador-geral da República, Augusto Aras. Durante essa semana, o procurador-geral da República divulgou uma nota na qual sugere que o presidente da República poderia instaurar um “estado de defesa” e eximiu-se da responsabilidade de investigar eventuais crimes de responsabilidade durante a pandemia da Covid-19.
“O estado de calamidade pública é a antessala do estado de defesa. A Constituição Federal, para preservar o Estado Democrático de Direito e a ordem jurídica que o sustenta, obsta alterações em seu texto em momentos de grave instabilidade social”, diz trecho do comunicado público emitido essa semana por Aras.
A manifestação causou perplexidade entre os ministros do Supremo e foi vista nos bastidores como uma sinalização de Aras em favor de Bolsonaro, visando uma indicação ao STF no meio do ano, no lugar do ministro Marco Aurélio Mello.
Subprocuradores-gerais da República, membros do Conselho Superior do Ministério Público Federal — órgão presidido pela Procuradoria-Geral da República (PGR) — reagiram a Aras e alegaram que o Ministério Público Federal não pode se furtar de uma de suas principais atribuições: fiscalizar atos de outros poderes.
Estado de defesa é apoiado por base do presidente
Ao longo dessa quinta-feira (21), apoiadores do presidente Jair Bolsonaro endossaram a manifestação de Aras a partir da hashtag #EstadoDeDefesaja. O termo havia sido propagado quase 90 mil vezes até o final desta tarde.
Conforme o art. 136 da Constituição Federal, o presidente da República pode “decretar estado de defesa para preservar ou prontamente restabelecer, em locais restritos e determinados, a ordem pública ou a paz social ameaçadas por grave e iminente instabilidade institucional ou atingidas por calamidades de grandes proporções na natureza”.