O ministro da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro lançou nesta quarta-feira (29) um canal direto de comunicação com o setor empresarial para receber denúncias de corrupção. O objetivo é aumentar a participação popular na fiscalização do poder público e recuperar a credibilidade das empresas brasileiras no país e no exterior.
Através da ferramenta, disponível no site da International Chamber Of Commerce Brasil (ICC), pessoas físicas e jurídicas poderão fazer denúncias de corrupção, lavagem de dinheiro, pirataria e crimes cibernéticos praticados contra a administração pública.
As denúncias recebidas serão analisadas pela ouvidoria-geral do ministério, que vai fazer uma filtragem analisando indícios de relevância, autoria e materialidade. Em seguida, a pasta vai encaminhar as denúncias para autoridades competentes de investigação, como Controladoria Geral da União (CGU), Polícia Federal, Ministério Público, entre outros órgãos.
Ao falar sobre a nova ferramenta, Sergio Moro mencionou o Índice da Percepção da Corrupção, divulgado na semana passada pela Transparência Internacional. O Brasil manteve sua pior nota (35) desde 2012 e caiu uma posição no ranking mundial de combate à corrupção, atingindo sua pior colocação desde 2012. A Transparência Internacional citou em seu relatório uma série de retrocessos no combate à corrupção em 2019.
“Acho que a reação em relação a esse tipo de pesquisa não deve ser de resignação, deve ser, ao contrário, de percebermos que temos que fazer muito mais”, disse Moro. “Temos um histórico de grande corrupção afetando o setor público e o setor privado, não existe corrupção sem o setor público e o setor privado juntos. Nós temos que tirar desse episódio a lição correta, temos que fazer mais”, completou o ministro.
Segundo Moro, o lançamento do novo canal de denúncias é importante por contar com a credibilidade do ICC e do governo federal. “Nós sabemos que a corrupção jamais funciona como óleo para engrenagem da economia, a corrupção é aquilo que nos deixa para trás, aquilo que distorce o funcionamento regular da economia e traz vantagens muitas vezes anticompetitivas dentro do setor privado”, disse o ministro.
Ferramenta visa recuperar credibilidade do Brasil
A ferramenta lançada nesta quarta-feira foi desenvolvida pela Controladoria Geral da União (CGU). Segundo o ouvidor-geral do Ministério da Justiça, Ronaldo Bento, entre os objetivos do novo canal de denúncias estão ampliar credibilidade do Brasil em nível internacional, aperfeiçoar boas práticas na prevenção e permitir o controle e participação da sociedade civil.
“O Brasil tem a ganhar com iniciativas como essa”, disse Bento. “Disponibilizar esse canal exclusivo de comunicação de denúncias fortalecerá a conformidade, a participação e o controle social, que são fundamentais para uma democracia forte”, completou.
“Nosso objetivo é recuperar a credibilidade brasileira, no Brasil e no exterior, e criar um ambiente de negócios sustentável”, disse Tânia Consentino, presidente da Comissão de Responsabilidade Corporativa e Anticorrupção da ICC Brasil.
Iniciativa de Moro é importante, mas canal precisa ser independente
Para o consultor nas áreas de compliance, governança, riscos financeiros, gerenciamento de riscos e proteção de dados, Aphonso Rocha, a iniciativa de Moro é positiva para coibir casos de corrupção. “Nossa legislação para tratamento de casos de corrupção e suborno é derivada da legislação americana e inglesa. Elas contemplam um canal de denúncias como um dos pilares fundamentais para que você coíba a prática de corrupção, de propina nas empresas”, diz.
Segundo o consultor, porém, alguns pré requisitos devem ser observados na criação do canal para recebimento de denúncias. “O canal de denúncia é fundamental que exista, só que ele precisa ter algumas características para ser considerado eficiente e eficaz”, diz.
A primeira característica é a independência. “As decisões relativas à investigação da denúncia têm que ser independente dos interesses dos associados. Qualquer tipo de filtro de denúncia tem que ser dentro de uma metodologia e ser independente”, explica Rocha.
A segunda característica essencial, segundo o consultor, é o sigilo. “O sigilo do denunciante tem que ser garantido a qualquer custo em todas as fases do processo”, defende.
Por fim, o processo de investigação precisa ser auditável. “Tenho que ter uma maneira de confirmar que sejam tomadas todas as ações adequadas para tratar aquela denúncia e implantar controles preventivos para que o caso não reincida. O processo tem que ser auditável de maneira independente. Tenho que guardar registros para que possam ser auditáveis. Isso é muito importante”, ressalta.
Segundo o consultor, porém, o Ministério da Justiça pode não ser o canal mais adequado para receber e filtrar as denúncias recebidas através do ICC. “Para a grande maioria dos casos sim [pode ser um canal adequado para receber as denúncias de corrupção]. Mas se você for imaginar que pode existir denúncia contra o próprio Ministério da Justiça, não”, destaca Rocha. “Existe um potencial conflito de interesses. Boa parte dessas empresas, posso estar falando de empresas que podem estar vendendo para o próprio Ministério da Justiça”, completa o consultor.
Moro elogiou o próprio trabalho na Lava Jato e o presidente
Ao comentar o relatório da Transparência Internacional divulgado na semana passada, Moro elogiou o próprio trabalho na Lava Jato, operação na qual ele foi juiz em primeira instância, em Curitiba.
“Eu vi com certo pesar, semana passada, os resultados dos indicadores da Transparência Internacional que revelam algo que já vinha de outros anos, que apesar de todos os esforços que o Brasil tem realizado contra a corrupção nos últimos anos, que foram esforços significativos. Eu destacaria aqui, por exemplo, os trabalhos que foram feitos anticorrupção no âmbito da operação Lava Jato, prisões, condenações de pessoas envolvidas em alta corrupção. Poucos países no mundo fizeram o que o Brasil fez”, disse o ministro. Como juiz, Moro era o responsável por decretar prisões e sentenciar os denunciados na operação.
Menos de uma semana após a polêmica envolvendo uma possível divisão do Ministério da Justiça e Segurança pública em dois, Moro também aproveitou para elogiar o presidente Jair Bolsonaro (sem partido).
“Nesse ano de 2019 o presidente Jair Bolsonaro rompeu com uma prática, que se deturpou a meu ver com o tempo, de loteamento político partidário nas altas posições da administração pública”, afirmou. “Não que indicações políticas sejam um mal em si, mas elas foram utilizadas no passado para fim de enriquecimento ilícito e financiamento ilegal de partidos políticos. O presidente teve esse grande mérito de romper com isso. Aliás, isso explica minha presença no ministério e igualmente de outros ministros com perfil absolutamente técnico”, elogiou Moro.
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