A recente onda de ataques à Lava Jato deu a Sergio Moro uma bandeira para se manter em evidência até as eleições de 2022. Defender o legado e a manutenção da maior operação de combate à corrupção que o Brasil já assistiu deixou de ser opção para o ex-juiz — virou quase uma obrigação, diante das tentativas de desqualificação do trabalho jurídico-investigativo que levou para a cadeia figurões da política nacional e grandes empresários.
Sem a famosa toga de juiz e a cadeira de ministro, Moro passou os últimos meses fora dos holofotes de Brasília. Entrevistas a jornais e transmissões ao vivo na internet passaram a ser mais frequentes. Mas o discurso já não tinha o mesmo peso de quando estava no poder. A capacidade de influenciar estava se esvaindo e o risco de cair no esquecimento até o próximo pleito, daqui a dois anos, era grande.
Agora, com a ofensiva montada contra a Lava Jato, o ex-juiz tem a possibilidade de manter sua popularidade ao personificar a reação contra o desmonte dos avanços contra a corrupção no país. “Quanto mais ataques a Lava Jato sofrer, mais mídia e projeção Sergio Moro vai ganhar, o que é muito melhor para ele e muito pior para o Bolsonaro", diz o cientista político André Rosa.
O ex-juiz é rotineiramente apontado como candidato a enfrentar o presidente Jair Bolsonaro nas urnas. Sempre que é indagado sobre o assunto, Moro desconversa. Afirma e reafirma que não tem desejo e nem disposição de concorrer ao Planalto. Mas o cerco à Lava Jato faz dele, mesmo que a contragosto, uma peça importante no xadrez eleitoral de 2022.
Nas redes sociais, Moro já assumiu o papel de escudo da operação. No dia 27 de julho, ele tuítou: "Registro meu apoio e solidariedade ao Procurador da República Deltan [Dallagnol] e ao trabalho realizado na Lava Jato. Tempos estranhos". A força-tarefa do Ministério Público Federal em Curitiba vem sofrendo pressões do procurador-geral da República, Augusto Aras, que acusa a Lava Jato de ser uma "caixa de segredos" e de investigar pessoas com prerrogativa de foro.
Dois dias depois, o ex-juiz voltou à carga. "Desconheço segredos ilícitos no âmbito da Lava Jato. Ao contrário, a Operação sempre foi transparente e teve suas decisões confirmadas pelos tribunais de segunda instância e também pelas Cortes superiores, como STJ e STF", escreveu.
E completou: "PGR vai à imprensa sugerir desvios da Força Tarefa do MPF da Lava Jato, mas confrontado nada tem de concreto. 'A base de dados é muito extensa' [disse Aras]. Sim, é a Lava Jato, maior investigação sobre corrupção do mundo."
Moro abandonou a carreira de juiz no final de 2018 ao aceitar convite de Bolsonaro para assumir o Ministério da Justiça e Segurança Pública. Mas a promessa de ter "carta branca" não se concretizou — ele sempre foi visto com desconfiança pelo presidente da República, que demonstrava incômodo com a alta popularidade do ex-juiz da Lava Jato.
Em abril deste ano, Moro deixou o governo acusando Bolsonaro de tentar interferir politicamente na Polícia Federal. Um inquérito para apurar as acusações do ex-ministro foi aberto e tramita no Supremo Tribunal Federal (STF).
Potencial eleitoral de Moro não pode ser desprezado
Pesquisa divulgada na sexta-feira (7) pelo portal Poder360 mostra o potencial de uma eventual candidatura do ex-ministro Sergio Moro. O levantamento mostra que, se as eleições fossem hoje, Bolsonaro teria 38% das intenções de voto no primeiro turno. Atrás dele, o ex-prefeito de São Paulo, Fernando Haddad (PT), aparece com 14% e Moro fica em terceiro lugar, com 10%.
No segundo turno, Bolsonaro venceria qualquer candidato, exceto Moro. Os dois ficariam empatados, com 41% das intenções de voto cada um. Outros 18% dos eleitores disseram não saber em quem votariam ou afirmaram que votariam branco ou nulo.
A pesquisa foi realizada pelo PoderData, divisão de estudos estatísticos do Poder360. Os dados foram coletados de 3 a 5 de agosto, por meio de ligações para celulares e telefones fixos. Foram 2.500 entrevistas em 512 municípios, nas 27 unidades da federação. A margem de erro é de 2 pontos percentuais.
Para o cientista político André Rosa, porém, as chances de Moro e Bolsonaro se enfrentarem em um segundo turno são muito remotas. “Não acredito em um segundo turno entre Moro e Bolsonaro. Temos uma direita que se fragmenta e isso faz com que Moro perca votos para ir ao segundo turno. Não consigo visualizar um segundo turno sem um representante da esquerda”, avalia.
Rosa enxerga a possibilidade do confronto do ex-ministro com o presidente apenas em um caso extremo de inviabilização de uma candidatura da esquerda. “Se em uma eventualidade o Ciro [Gomes - PDT] ou o [petista Fernando] Haddad retirem a candidatura, ou caso aconteça algum escândalo muito forte, tem a possibilidade de Moro ir ao segundo turno”, diz.
Julgamento no STF ameaça derreter capital político do ex-juiz
Mesmo empunhando a bandeira de defesa da Lava Jato, Moro corre o risco de ver o seu capital político e eleitoral derreter ainda neste ano. O Supremo Tribunal Federal (STF) deve julgar em breve um pedido de suspeição do ex-juiz movido pela defesa do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O petista foi condenado por Moro em 2017, por corrupção e lavagem de dinheiro, no processo do tríplex no Guarujá (SP).
A defesa argumenta que Moro agiu politicamente contra Lula e pede que os ministros considerem o ex-juiz parcial, anulando a condenação. Se isso acontecer, diz André Rosa, Moro pode sofrer um abalo em sua imagem pública, que já sofre desgaste desde a divulgação de conversas atribuídas a ele e membros da força-tarefa da Lava Jato pelo site The Intercept.
Como disputa com Bolsonaro o mesmo eleitor antipetista, Moro pode sair perdendo com uma decisão favorável a Lula. Para o cientista político, uma eventual anulação do processo contra o ex-presidente reacenderia a militância do presidente Jair Bolsonaro, que já é contrária a várias decisões do Supremo. “Se isso acontecer de fato, aumenta o capital político de Bolsonaro”, projeta Rosa. “Por um lado aquece o bolsonarismo, por outro reforça a ideia de que ele [Moro] foi parcial”, explica.
Lava Jato vê atuação política para atacar Moro
Procuradores de Curitiba enxergam os atritos com a Procuradoria-Geral da República (PGR) como um dano colateral à tentativa de enfraquecer Moro e favorecer Bolsonaro politicamente. Nas palavras de um procurador, há um grupo político que “não quer que o nome da Lava Jato seja carregado para as próximas eleições”.
Nesse contexto, segundo membros da força-tarefa, estariam as declarações do procurador-geral Augusto Aras contra a operação e a tentativa de asfixiar as investigações. Até a tentativa de criar uma Unidade Nacional de Combate à Corrupção e ao Crime Organizado (Unac) para centralizar as investigações em Brasília e substituir as forças-tarefas é vista com desconfiança por procuradores do Ministério Público.
Um dos procuradores disse à Gazeta do Povo que a intenção é “desmontar” a Lava Jato porque ela “dá força para o Moro”, já que o nome do ex-ministro está fortemente ligado à operação contra a corrupção. Segundo esse procurador, o grupo político próximo ao presidente da República “não quer que o nome da Lava Jato seja carregado para as próximas eleições”. Nesse sentido, os procuradores acreditam que a força-tarefa em Curitiba pode ser dissolvida. “Vão tentar asfixiar aos poucos”, disse o procurador.
A Lava Jato também enxerga nesse contexto de atuação política da PGR a retomada das negociações para um acordo de delação premiada com o advogado Rodrigo Tacla Duran, que atuou como advogado da Odebrecht, foi alvo da operação e está foragido. Tacla Duran acusa o advogado Carlos Zucolotto, amigo de Moro, de pagar propina para fechar acordos de delação premiada na Lava Jato.
Para os procuradores, a retomada da negociação do acordo pode ser uma tentativa de forçar uma operação de busca e apreensão contra o ex-juiz “para efeito desmoralizador, com vistas a 2022”.
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