O ministro da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro, enfrentará sete batalhas no Congresso e no Supremo Tribunal Federal (STF) em 2020. O Legislativo e o Judiciário retomam as atividades na segunda-feira (3), e têm uma série de pautas que interessam diretamente ao ministro – que vão desde a prisão em segunda instância ao julgamento de um recurso da defesa do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva que pede que Moro seja considerado parcial nos julgamentos do petista na Lava Jato.
1. Vetos de Bolsonaro ao pacote anticrime
O pacote anticrime ainda não é uma pauta superada no Congresso, e é o primeiro assunto que interessa ao ministro. Bolsonaro sancionou a lei no final do ano passado, com 25 vetos. As novas regras passaram a valer no último dia 23. Mas o Congresso Nacional ainda vai analisar os vetos do presidente podendo derrubar parte deles. Para isso, é necessária maioria absoluta na Câmara e depois no Senado em uma sessão conjunta do Congresso Nacional. Além disso, Moro quer recuperar alguns pontos do pacote anticrime que foram descartados pelos parlamentares.
2. Volta da prisão em segunda instância é um dos objetivos de Moro
Outra pauta que interessa ao ministro é a prisão em segunda instância, que estava prevista no pacote anticrime elaborado por ele, mas acabou de fora do texto final aprovado no Congresso. Agora, deputados e senadores discutem projetos de lei específicos sobre o tema.
No ano passado, o STF derrubou a possibilidade de prisão antes do trânsito em julgado, o que levou uma série de políticos presos em segunda instância à liberdade, como o ex-presidente Lula.
Recentemente, em entrevista ao programa Pânico, da rádio Jovem Pan, Moro lamentou o fato de Lula ter sido solto com base na decisão do STF. “O correto era ele ter saído após cumprir toda a pena”, disse o ex-juiz, que foi responsável por condenar o petista em primeira instância e decretar a prisão dele.
Na entrevista, o ministro voltou a defender a prisão em segunda instância. Na Câmara, há uma proposta de emenda à Constituição (PEC) sobre o tema em discussão em uma comissão especial, e a expectativa é votá-la ainda no primeiro semestre nos plenários da Câmara e do Senado.
Moro afirmou que vai ajudar o Congresso a aprovar a proposta. “Isso transcende muito a questão do Lula. Se você fez algo de errado, cometeu um crime, tem que pagar nessa vida”, disse o ministro.
3. Fim do foro privilegiado
Ainda neste ano, a Câmara pretende mexer na PEC que prevê a restrição da prerrogativa de foro para autoridades no país. A proposta, aprovada no Senado em 2017, acaba com o chamado foro privilegiado para crimes comuns para quase todos os políticos. Mas os deputados querem incluir uma "pegadinha" no texto durante a tramitação na Casa. O objetivo é impedir juízes de primeira instância de determinar medidas cautelares contra políticos.
A PEC só mantém o foro em casos de crimes comuns, como roubo e lavagem de dinheiro, para o presidente e o vice-presidente da República e os presidentes da Câmara, do Senado e do Supremo Tribunal Federal (STF). Mas o texto, que está pronto para ser votado no plenário da Câmara, também prevê que autorização para as medidas cautelares – como uso de tornozeleiras, quebra de sigilos bancário e telefônico e mandados de busca e apreensão – continuem sendo expedidas pelo STF.
Desde quando era juiz, Moro defende o fim do foro privilegiado para autoridades investigadas pela prática de corrupção e outros crimes. Atualmente, ministros, governadores, prefeitos, chefes das Forças Armadas e os integrantes dos Legislativos estaduais, do Ministério Público, do Judiciário e dos tribunais de contas também têm o direito de serem julgados em instâncias superiores em caso de crime comum. A única exceção são os vereadores, que são julgados pela Justiça comum de primeira instância.
Em um julgamento realizado em 2018, o STF reduziu a prerrogativa de foro de políticos. Os ministros restringiram o direito a foro privilegiado apenas à investigação e julgamento de crimes cometidos durante o mandato e em razão do cargo. Diversos processos que tramitavam no Supremo foram redistribuídos para a primeira instância a partir da decisão.
4. Alvo de Moro, juiz de garantias será julgado pelo STF
Do outro lado da Praça dos Três Poderes, o STF também julgará agora em 2020 temas que interessam a Moro.
Uma dessas ações, inclusive, tem relação com o pacote anticrime do ministro. Durante a tramitação no Congresso, os parlamentares incluíram no texto aprovado a criação da figura do juiz de garantias em todo o Brasil. Moro foi contra, mas Bolsonaro sancionou o juiz de garantias – que será responsável por conduzir as investigações, mas não por julgar os réus (outro juiz fará isso).
Três Ações Declaratórias de Inconstitucionalidade (ADIs) foram protocoladas no STF questionando a medida aprovada pelo Congresso e sancionada pelo presidente.
A implementação do juiz de garantias estava prevista para acontecer a partir de 23 de janeiro, mas uma liminar do presidente do STF, Dias Toffoli, suspendeu a entrada em vigor da medida por seis meses. Poucos dias depois, uma nova liminar, desta vez do ministro Luiz Fux, relator do caso, suspendeu indefinidamente a implantação do juiz de garantias, até que o plenário do STF julgue o tema. Moro comemorou a decisão de Fux. O plenário do Supremo ainda não tem data para decidir sobre o assunto.
5. Execução imediata da pena imposta pelo Tribunal do Júri
No dia 12 de fevereiro, o plenário do STF vai julgar um recurso extraordinário que questiona a execução das penas após condenação pelo Tribunal do Júri. O relator do caso é o ministro Luiz Roberto Barroso. O caso é de repercussão geral – ou seja, o que for decidido no julgamento vale para todos os casos parecidos.
No pacote anticrime, Moro previa a execução imediata da pena após condenação pelo Tribunal do Júri – ou seja, ainda em primeira instância nos casos de crime contra a vida. Depois de um acordo feito pelo grupo de trabalho que analisou a proposta na Câmara, os deputados concordaram em manter no texto a previsão de execução antecipada, mas só para penas maiores de 15 anos de prisão. Em caso de condenação a penas inferiores a 15 anos, a execução provisória da pena também pode ser realizada, desde que fundamentada pelo juiz. O texto aprovado no Congresso já está em vigor.
6. Ordem de entrega das alegações finais, que pode anular sentença contra Lula
O Supremo vai finalizar no dia 25 de março o julgamento sobre a ordem de entrega das alegações finais em processos com réus delatores. O Supremo já definiu que nesses casos, delatores devem entregar o documento (em que expõem seus argumentos para não serem condenados) antes dos delatados. Com base nesse argumento, duas sentenças da Lava Jato proferidas por Moro já foram anuladas.
Agora, o STF vai definir critérios para casos parecidos, o que pode gerar um efeito-cascata. Levantamento da Gazeta do Povo mostra que isso pode afetar 32 processos da Lava Jato podem ter revisão de sentença porque delatores e delatados apresentaram as alegações finais da ação ao mesmo tempo. Um dos possíveis beneficiados é o ex-presidente Lula.
7. Recurso de Lula para declarar a suspeição de Moro
Ainda no STF, a 2.ª Turma da Corte tem pendente um julgamento de um recurso de Lula que questiona uma suposta parcialidade de Sergio Moro na condução dos casos da Lava Jato. Os advogados do petista querem que o STF declare a suspeição do ex-juiz federal e a anulação do processo do tríplex do Guarujá.
Entre os argumentos listados pela defesa para alegar que Moro foi parcial e agiu politicamente ao conduzir o caso estão: a) a condução coercitiva do ex-presidente sem prévia intimação para o petista depor; b) a quebra de sigilo telefônico, inclusive de advogados do ex-presidente; c) divulgação ilegal dos áudios que foram fruto de interceptação telefônica, como o que mostra uma conversa entre Lula e a ex-presidente Dilma Rousseff (que na época tinha foro privilegiado); d) a condenação imposta a Lula no caso do tríplex; e) a atuação de Moro para impedir que Lula fosse solto quando o TRF-4 concedeu um habeas corpus ao petista, em julho de 2018; f) o fato de um interrogatório de Lula no processo do sítio em Atibaia ter sido adiado por causa das eleições, para impedir o ex-presidente, que era candidato, de aparecer publicamente; g) o levantamento do sigilo de parte da delação do ex-ministro Antônio Palocci por Moro, de ofício, a uma semana das eleições de 2018; h) o fato de Moro ter assumido o Ministério da Justiça no governo de Jair Bolsonaro, principal adversário político do PT nas últimas eleições.
O pedido de suspeição de Moro foi protocolado em 2018 e começou a ser julgado no final daquele ano, mas foi interrompido por um pedido de vista do ministro Gilmar Mendes. Já em 2019, a defesa do ex-presidente acrescentou aos argumentos da suspeição de Moro parte das conversas atribuídas a Moro e membros da Lava Jato no Telegram, divulgadas pelo site The Intercept Brasil e outros veículos de imprensa.
O caso foi retomado na Segunda Turma do STF na última sessão antes do recesso de julho de 2019. Por causa de seu voto extenso, Gilmar Mendes sugeriu que a Turma concedesse uma liminar para libertar Lula até que o mérito do caso terminasse de ser julgado (à época, o próprio STF não havia decidido pela inconstitucionalidade das prisões em segunda instância, o que levou posteriormente à soltura do petista).
No julgamento do habeas corpus para Lula na ação da imparcialidade de Moro, o placar foi de 3 a 2 contra o ex-presidente. O ministro Celso de Mello, que votou contra a liminar, esclareceu que seu voto no mérito do processo pode ser diferente, dando indicativos de que pode reverter o placar a favor de Lula quando o caso for retomado.
O caso ainda depende de liberação de Gilmar Mendes para ser pautado na Turma. Em novembro, o ministro Celso de Mello se aposenta e será substituído por um ministro indicado por Bolsonaro. Se o caso for julgado antes da nomeação, porém, pode terminar empatado, o que favorece Lula.
Se Moro for declarado suspeito, os processos contra Lula na Lava Jato podem ser anulados e voltar à estaca zero.
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