O ministro Celso de Mello, do Supremo Tribunal Federal (STF), abriu investigação para apurar as acusações do ex-ministro da Justiça, Sergio Moro, sobre a tentativa de interferência política do presidente Jair Bolsonaro na Polícia Federal. Tanto Moro quanto Bolsonaro aparecem no rol de investigados. Mas essa não é a única batalha no STF que envolve o nome do ex-ministro.
Moro também terá sua conduta como juiz da Lava Jato analisada pelos ministros da Segunda Turma da Suprema Corte. Trata-se do habeas corpus da defesa do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) que pede a suspeição do ex-juiz federal e a anulação do processo do tríplex no Guarujá. A defesa do petista argumenta que Moro não foi imparcial e agiu politicamente contra Lula. O HC está parado desde que o ministro Gilmar Mendes pediu vista, isto é, mais tempo para analisar o processo.
Volta e meia Mendes traz à tona a possibilidade de liberar o recurso de Lula para julgamento na Segunda Turma. Na última sessão antes do recesso de julho do ano passado, o HC quase foi julgado. O caso chegou a entrar na pauta, mas por causa de seu voto extenso, Gilmar Mendes sugeriu que a Turma concedesse uma liminar para libertar Lula até que o mérito do caso terminasse de ser julgado. O placar foi de 3 a 2 contra a concessão do habeas corpus. O ministro, desde então, não devolveu o processo para julgamento.
Argumentos contra Moro
No habeas corpus, os advogados de Lula pedem a anulação do processo do tríplex no Guarujá. Lula foi condenado a 9 anos e meio de prisão por Moro, teve a pena aumentada em segunda instância, e reduzida novamente para 8 anos e 10 meses pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ).
O ex-presidente chegou a cumprir pena pela condenação na Superintendência da Polícia Federal em Curitiba, onde ficou 1 ano e 7 meses preso. Ele foi liberado graças a uma decisão do STF que barrou a prisão em segunda instância. O processo ainda não teve trânsito em julgado e aguarda o julgamento de recursos no STJ. Depois, ainda pode ser questionado no STF.
Entre os argumentos usados pela defesa de Lula para embasar o pedido de habeas corpus estão:
- A condução coercitiva do ex-presidente sem prévia intimação para o petista depor;
- A quebra de sigilo telefônico, inclusive de advogados do ex-presidente;
- A divulgação ilegal dos áudios que foram fruto da interceptação, como o que mostra uma conversa entre Lula e a ex-presidente Dilma Rousseff que, na época, tinha foro privilegiado;
- A condenação imposta a Lula no caso do tríplex; e) a atuação de Moro para impedir que Lula fosse solto quando o TRF-4 concedeu um habeas corpus ao petista, em julho de 2018;
- O fato de um interrogatório de Lula no processo do sítio em Atibaia ter sido adiado por causa das eleições, para impedir o ex-presidente, que era candidato, de aparecer publicamente;
- O levantamento do sigilo de parte da delação do ex-ministro Antônio Palocci por Moro, de ofício, a uma semana das eleições de 2018;
- O fato de Moro ter assumido o Ministério da Justiça no governo de Jair Bolsonaro, principal adversário político do PT nas últimas eleições.
O habeas corpus foi protocolado em 2018 e começou a ser julgado no final do ano, mas foi interrompido por um pedido de vista do ministro Gilmar Mendes.
Já em 2019, a defesa do ex-presidente acrescentou aos argumentos da suspeição de Moro parte das conversas atribuídas a Moro e membros da Lava Jato no Telegram, divulgadas pelo The Intercept Brasil e outros veículos de imprensa.
Resultado pode beneficiar Lula
Até agora Lula só ganhou uma batalha judicial no STF desde o início da Lava Jato. Foi o julgamento de um pedido da defesa para barrar a transferência de Lula para um presídio em São Paulo, que teve resultado quase unânime (10 a 1) contra a transferência. O julgamento da prisão em segunda instância, apesar de ter beneficiado o petista, era uma discussão abstrata que valia para todos os réus do país.
Mesmo assim, as chances de vitória de Lula no HC que pede que seja declarada a suspeição de Moro não é pequena. Uma análise do placar que rejeitou a liberdade provisória do petista no ano passado mostra isso.
Apesar de o placar ter sido 3 a 2 contra Lula, na ocasião, o ministro Celso de Mello, que votou contra a liminar, esclareceu que seu voto no mérito do processo pode ser diferente, dando indicativos de que pode reverter o placar a favor de Lula quando o caso for retomado.
Já votaram no HC os ministros Edson Fachin (relator) e Carmen Lúcia, ambos contra o pedido de suspeição de Moro. Ainda faltam votar Gilmar Mendes, Ricardo Lewandowski e Celso de Mello. Mendes e Lewandowski tradicionalmente votam contra as teses da Lava Jato na Turma e o voto de Celso de Mello deve ser o de minerva.
Celso de Mello votou contra Moro no passado
O decano Celso de Mello já votou pela suspeição de Moro em um processo envolvendo o caso Banestado, em maio de 2013, antes de a Operação Lava Jato ser deflagrada.
A discussão sobre o tema, em 2013, ocorreu no julgamento de um habeas corpus do doleiro Rubens Catenacci, condenado por remessa ilegal de divisas ao exterior no caso que Moro julgou enquanto era titular da 2ª Vara Federal Criminal em Curitiba, em 2003.
O pedido foi rejeitado pela Segunda Turma do STF em 2013 e Celso de Mello foi o único a votar pela suspeição de Moro. A defesa de Catenacci alegava quebra da parcialidade de Moro por uma série de razões, entre as quais monitorar o voo de advogados para garantir o cumprimento de mandados de prisão; e manobras para retardar o cumprimento de uma decisão de soltura pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4), enquanto preparava outra ordem de prisão preventiva.
Foram esses os fatos que mais impressionaram Celso de Mello, que considerou que Moro fugiu “à ortodoxia dos meios que o ordenamento positivo coloca a seu dispor”, transformando-se em investigador.
O caso de Lula ainda depende de liberação de Gilmar Mendes para ser pautado na Turma. Em novembro, o ministro Celso de Mello se aposenta e será substituído por um ministro indicado por Bolsonaro. Se o caso for julgado antes da nomeação, porém, pode terminar empatado, o que favorece Lula.
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