Encontre matérias e conteúdos da Gazeta do Povo
Jornal Nacional

Suspeito da morte de Marielle pediu para ir na casa de Bolsonaro no dia do crime

Condomínio Vivendas da Barra, onde Jair Bolsonaro tem uma casa.
Condomínio Vivendas da Barra, onde Jair Bolsonaro tem uma casa. (Foto: Reprodução/TV Globo)

O depoimento de um porteiro do condomínio onde morava o policial militar Ronnie Lessa, acusado de ser o autor dos disparos que mataram Marielle Franco e o motorista Anderson Gomes, pode levar a investigação do assassinato da vereadora do PSOL para o Supremo Tribunal Federal (STF). Preso desde março deste ano, Lessa residia no Vivendas da Barra, na zona oeste do Rio de Janeiro, onde também tem casa o presidente Jair Bolsonaro. O Jornal Nacional, da TV Globo, teve acesso com exclusividade aos registros de entrada do condomínio de Bolsonaro e Lessa no dia do crime, em 14 março de 2018.

Segundo o porteiro, às 17h10, horas antes do assassinato, o ex-PM Élcio de Queiroz encostou seu carro, um Logan de placa AGH-8202, e teria anunciado na portaria do condomínio que iria visitar a casa de número 58, de propriedade do então deputado federal Jair Bolsonaro. Queiroz também está preso, acusado de dirigir o veículo de onde Lessa teria efetuado os disparos contra o carro de Marielle e Anderson.

O porteiro disse à Polícia Civil que ligou para a residência do parlamentar para pedir autorização e conversou com, segundo ele, "Seu Jair", que permitiu a entrada.

Queiroz, que na portaria se identificou como Élcio Vieira, acabou indo até a casa de Ronnie Lessa, a de número 66 do condomínio. O porteiro monitorou o carro pelas câmeras de segurança e estranhou a mudança de rota. Ele ligou novamente para a casa 58 e "Jair" disse que estava tudo bem. Segundo a reportagem do JN, as conversas no interfone da portaria são gravadas. A Polícia Civil estaria recuperando os arquivos de áudio para periciá-los. Os investigadores já estão de posse do caderno de visitas do condomínio.

A reportagem do Jornal Nacional apurou que nesse dia Jair Bolsonaro estava em Brasília, conforme os registros de presença da Câmara dos Deputados. A citação a Bolsonaro pode levar a investigação da morte de Marielle ao STF pelo fato de envolver o nome do presidente da República.

Uma comitiva do Ministério Público do Rio esteve em Brasília no último dia 17 para conversar com o presidente da Corte, Dias Toffoli, que ficou de analisar o caso e dar um parecer. Mas isso até agora não aconteceu.

Em nota, o presidente nacional do PSOL, Juliano Rodrigues, exigiu esclarecimentos por parte da Presidência da República. "O PSOL nunca fez qualquer ilação entre o assassinato e Jair Bolsonaro. Mas as informações veiculadas hoje são gravíssimas. O Brasil não pode conviver com qualquer dúvida sobre a relação entre o Presidente da República e um assassinato. Exigimos respostas. Exigimos justiça para Marielle e Anderson", escreveu.

O que diz Bolsonaro

O presidente Jair Bolsonaro está em missão oficial no Oriente Médio e foi informado da exibição da reportagem durante a madrugada, em Riad, capital da Arábia Saudita. Em live nas redes sociais, Bolsonaro disse ser vítima de uma perseguição da imprensa e que a "verdade está do seu lado". Em entrevista ao Jornal da Record, o presidente disse que "estar disposto a colaborar com o processo". "Eles querem jogar uma cortina de fumaça para cima do verdadeiro executor", afirmou.

Ao Jornal Nacional, o advogado do presidente Frederick Wassef contestou o depoimento do porteiro e afirmou que se trata de uma tentativa de atacar a imagem de Jair Bolsonaro. "Isso é uma mentira, isso é uma fraude, isso é uma farsa para atacar a imagem e a reputação do presidente da República", disse.

"Jair Bolsonaro, no dia 14 de março de 2018, encontrava-se em Brasília, na Câmara dos Deputados, inclusive existe o registro de entrada dele lá, com o dedo, e todas as demais provas. Eu afirmo com absoluta certeza e desafio qualquer um no Brasil a provar o contrário. E é o caso de uma investigação por esse falso testemunho em que qualquer pessoa tenha afirmado que essa pessoa foi procurar Jair Bolsonaro", afirmou Wassef.

Crime chocou o país

A vereadora Marielle Franco (PSOL), de 38 anos, foi assassinada a tiros por volta das 21h30 do dia 14 de março de 2018, uma quarta-feira, quando seguia em um carro para sua casa na Tijuca, no Rio de Janeiro. O motorista dela, Anderson Pedro Gomes, também foi morto na ação. Eles estavam acompanhados de uma assessora da vereadora, que foi atingida por estilhaços, mas sobreviveu.

Segundo a investigação, um carro emparelhou com o da vereadora na Rua Joaquim Palhares e abriu fogo, fugindo em seguida. De acordo com a perícia, a janela à direita no banco de trás, onde estava Marielle, ficou completamente destruída. Pelo menos cinco tiros teriam atingido a cabeça da vereadora. Marielle tinha acabado de sair de um evento com eleitores, na Rua dos Inválidos, na Lapa.

Nascida e criada no Complexo da Maré, na zona norte do Rio, Marielle foi a quinta vereadora mais votada da cidade nas eleições de 2016 com 46.502 votos. Socióloga formada pela PUC-Rio e mestra em Administração Pública pela Universidade Federal Fluminense (UFF), teve dissertação de mestrado com o tema “UPP: a redução da favela a três letras”. Os assassinatos de Marielle e Anderson causaram comoção e a demora em solucionar o caso transformou a vereadora em símbolo da esquerda brasileira.

Os acusados

Um anos depois do crime, em 12 de março de 2019, a Polícia Civil do Rio de Janeiro prendeu dois suspeitos de participarem do assassinato de Marielle e Anderson, ambos ligados à Polícia Militar: o PM reformado Ronnie Lessa, 48 anos, e o ex-policial militar Élcio Vieira de Queiroz, 46 anos. Lessa foi preso em sua casa, no condomínio Vivendas da Barra, na Barra da Tijuca, onde o presidente Jair Bolsonaro tem casa.

Segundo as investigações, Lessa disparou os tiros que mataram Marielle e Queiroz dirigiu o carro que interceptou o da vereadora, de onde partiram os disparos. Três dias depois da prisão, os dois se tornaram réus na Justiça e responderão por duplo homicídio triplamente qualificado (motivo torpe, emboscada e recurso que dificultou a defesa da vítima).

Segundo a denúncia apresentada pelo Ministério Público do Rio, Marielle foi morta em razão de sua militância em favor dos direitos humanos. Os investigadores identificaram ainda que Lessa fez pesquisas sobre a rotina de Marielle e sobre eventos de que ela participaria semanas antes do crime.

Ainda não está claro, no entanto, se o crime foi articulado espontaneamente pelo policial militar reformado ou se ele foi pago por um mandante para assassinar Marielle.

Use este espaço apenas para a comunicação de erros

Principais Manchetes

Receba nossas notícias NO CELULAR

WhatsappTelegram

WHATSAPP: As regras de privacidade dos grupos são definidas pelo WhatsApp. Ao entrar, seu número pode ser visto por outros integrantes do grupo.