O vice-presidente Hamilton Mourão afirmou, em entrevista publicada nesta quarta-feira (20) pelo jornal Valor Econômico que o governo cometeu “erros sobejamente conhecidos”, sem citar quais seriam esses equívocos. Ele também defendeu que há uma “responsabilidade compartilhada” entre o presidente Jair Bolsonaro, prefeitos e governadores durante a pandemia da Covid-19. Na entrevista, o vice-presidente fala ainda dos insumos para produção da vacina para Covid-19, se posiciona contra o impeachment de Bolsonaro e defende um novo momento na relação do Brasil com os Estados Unidos e a China.
Disputa pela vacina "tomou proporção que não deveria"
Para Mourão, a disputa em torno da vacina Coronavac, produzida pelo Instituto Butantan numa parceria com a farmacêutica chinesa Sinovac, “tomou uma proporção que não deveria tomar” e foi levada para o "lado político".
“A questão da vacina foi politizada e, consequentemente, tomou uma proporção que não era para tomar. Eu, há três meses, falei que o governo iria comprar a Cononavac; e comprou. Era lógico! Se nós temos algo que está sendo construído aqui no Brasil, que o próprio governo federal está colocando dinheiro para que o Butantan consiga produzir essa vacina… É uma discussão que foi levada única e exclusivamente para o lado político, de parte a parte, tanto do nosso lado quanto do lado do governo de São Paulo. E não teve resultado positivo no final das contas.”
Ao comentar sobre a dificuldade de o Brasil importar insumos para a produção da vacina vindos da China, Mourão diz que o assunto já está sendo tratado e que, se necessário, poderá entrar na negociação como vice-presidente. "Já foi feito contato via MRE [Ministério das Relações Exteriores] e governo chinês e nós estamos aguardando. Dentro de um gerenciamento de crise, você vai escalando conforme as cartas vão se esgotando. A partir do momento em que isso aí não avançar, por meio do mecanismo da Cosban, eu vou contatar o meu contraparte que é o vice-presidente Wang Qishan para que a gente avance nisso.”
Vice diz que Bolsonaro não fez as pessoas saírem às ruas na pandemia
Mourão disse ainda que o presidente Bolsonaro não teve participação em aglomerações na pandemia, e defendeu a responsabilização compartilhada com outros entes da federação pelo fato de o Brasil "ser diferente" no enfrentamento da pandemia.
"Ele [Bolsonaro] não foi o responsável pelas pessoas saírem para a rua. Aí tem uma responsabilidade compartilhada entre todas as esferas de governo. Nenhum dos nossos governadores e prefeitos conseguiu implementar um lockdown para valer. Até porque no Brasil esse troço não dá. O Brasil é um país muito grande, muito desigual. Não é a França ou a Espanha, que você dá um grito em Madri e todo mundo ouve. Na China, o cara bota a força armada na rua, cerca, derruba a internet… É diferente daqui."
População pode fazer "impeachment" de Bolsonaro na eleição
Mourão questionou os pedidos de impeachment do presidente Jair Bolsonaro. E disse que o governo passará por avaliação nas eleições em 2022. Ou seja, que se a população quiser, tira Bolsonaro da Presidência. “Se você botar numa coluna do nosso governo, você vai ver que teve mais acertos do que erros. Teve erros, que são sobejamente conhecidos. Mas vamos olhar, por que vamos fazer o impeachment? Vai chegar daqui ao ano que vem. E, se o governo dele não for bom, ele não será reeleito, caso seja candidato à reeleição. Porque ele pode chegar à conclusão: ‘não vai dar para mim’.”
No entanto, o vice-presidente ponderou: “Agora, é óbvio que se um presidente colocar em risco a integridade do território, a integridade do patrimônio, o sistema democrático e a paz social do país, ele tem que ser parado pelo sistema de freios existente”.
Mourão diz que é hora de ter relação pragmática com EUA
Ao comentar sobre a relação do governo brasileiro com o democrata Joe Biden, que toma posse como presidente dos Estados Unidos nesta quarta-feira (20), Mourão disse ser necessário recuperar as "ligações institucionais" históricas entre os dois países.
“Temos que ajustar a nossa ligação, que até o presente momento foi muito feita em termos pessoais [de Bolsonaro com Donald Trump]. Óbvio, a ligação pessoal é boa. Mas não substitui de forma alguma as ligações institucionais que sempre houve entre os dois países. Nós temos que fazer com que essas ligações institucionais sejam dos entes públicos, do Itamaraty, do Ministério da Economia, mas também das instituições privadas, que têm os seus contatos com os americanos, de modo que a gente volte a ter um posicionamento bem pragmático e bem flexível em relação às políticas que vierem dos EUA.”
O vice-presidente defendeu ainda que o Brasil adote medidas para "reabrir o canal diplomático, de maneira que um posicionamento político de determinado momento não significa um posicionamento ad eternum". E pregou um novo momento com o atual governo norte-americano: "O que ficou para trás ficou para trás. Vamos zerar e buscar avançar a partir daqui."
Para Mourão, retomada da economia depende de vacina e Congresso
Na entrevista, Mourão defendeu métodos para o controle de gastos do governo federal, mas condicionou a retomada da economia à vacinação em massa no país e à eleição na Câmara dos Deputados e do Senado, marcada para fevereiro.
“Já vi soluções razoavelmente criativas para expurgar alguns números do teto de gastos, como os benefícios previdenciários ficarem fora do teto para abrir espaço para outros tipos de gasto. Mas isso tem que ser muito bem negociado com o Congresso e com a sociedade. Tem que ficar muito claro. [Destinação mais adequada] seriam os investimentos do setor público. Porque os investimentos do setor público atraem e alavancam os investimentos do setor privado.”
Além disso, Mourão disse que, com a resolução do impasse sobre os insumos para a produção da vacina Coronavac, o país pode ampliar a vacinação em abril. “Está tudo ligado à questão de a gente avançar com a vacinação. Se ficar bem definido agora, nos próximos 30 dias, que os insumos vão chegar, que nós vamos produzir a vacina e que a partir de abril a gente consegue entrar em um processo de vacinação em massa, vacinando 10 milhões, 12 milhões de pessoas por mês, a minha visão é que a gente chegaria ao final do ano com 150 milhões, 160 milhões de pessoas vacinadas. E, com isso, a gente resolveria o nosso problema."
"Ao mesmo tempo, resolvida a questão da eleição das duas Casas do Legislativo, eu acho que a gente tem condições de fazer avançar as nossas propostas, dar uma injeção de ânimo na economia e começar a diminuir o desemprego", disse Mourão.
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