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Os movimentos de renovação política estiveram entre os fatores que explicam os resultados das eleições de 2018. Grupos como RenovaBR, Acredito, Agora! e outros lançaram candidatos que até então não participavam da política. Com isso, contribuíram para que o Congresso tivesse, na última eleição, a maior taxa de renovação de sua história recente.
Para 2022, apesar de o sentimento da "nova política" estar menos forte do que em 2018, a expectativa desses movimentos é continuar falando em renovação. Mas agora esses grupos começam a ser acusados de serem "partidos disfarçados". Parte deles tem se manifestado abertamente pelo afastamento do presidente Jair Bolsonaro. E outros passarão a ser mais cobrados por sua proximidade com um potencial candidato ao Planalto: o apresentador de TV Luciano Huck.
RenovaBR abre turma de formação; e recebe críticas de Ciro
O RenovaBR, movimento de renovação política que opera como uma espécie de escola para novatos interessados em disputar eleições, deu sua largada para 2022 ao abrir, no mês passado, inscrições para sua nova turma de formação.
Para Rodrigo Cobra, diretor de operações do RenovaBR, o objetivo do grupo é atrair "pessoas comuns" para a política. O processo seletivo da escola em 2021 ampliará metas de diversidade e regionalização, para buscar a presença de participantes de diferentes regiões do país. "Nós queremos diminuir as barreiras e evitar que as pessoas mais favorecidas tenham mais condição [de disputar as eleições]", diz ele.
O grupo – responsável pela formação de nomes hoje no Congresso como os deputados Vinícius Poit (Novo-SP) e Tabata Amaral (PDT-SP) – tem o apresentador de TV Luciano Huck como um de seus apoiadores.
Huck inclusive participou de um evento virtual do RenovaBR no último dia 4, no qual fez críticas indiretas ao PT e ao presidente Jair Bolsonaro (sem partido) e trocou elogios com o governador gaúcho Eduardo Leite (PSDB) – outro presidenciável.
O RenovaBR foi alvo de críticas recentes do ex-ministro Ciro Gomes (PDT), que chamou o movimento e grupos similares de "partidos políticos clandestinos". Para Ciro, os movimentos existem como forma de permitir que pessoas jurídicas influenciem no jogo político – a legislação brasileira proíbe, desde 2015, a doação de recursos de empresas a partidos.
Ciro direcionou suas críticas especialmente a Tabata Amaral, deputada do PDT. Segundo o ex-ministro, a deputada "se filiou ao partido errado". A parlamentar passou a ser alvo de Ciro e de outros integrantes da esquerda ainda em 2019, quando apoiou a reforma da Previdência.
Rodrigo Cobra diz que "o RenovaBR já se preocupou mais com esse tipo de comentário". "As nossas doações são todas feitas por pessoas físicas, e são auditadas. Temos a preocupação de formar líderes. Hoje temos alunos de 30 partidos. Existem 33 partidos no Brasil, e 30 têm representantes no RenovaBR. Como nós seríamos um 'partido disfarçado' com alunos de 30 partidos?", questiona.
Agora! e Acredito defendem afastamento de Bolsonaro
Diferentemente do modelo do RenovaBR, que tem turmas formalizadas, outros grupos promovem ações continuadas de formação de lideranças. Mas também buscam se preparar para as eleições de 2022.
É o caso do Agora! e do Acredito. O primeiro também tem Huck entre seus integrantes, e o segundo é outra "casa" de Tabata Amaral, do deputado Felipe Rigoni (PSB-ES) e do senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE).
O economista Humberto Laudares, integrante do Agora!, diz que o grupo tem "trabalhado ainda mais duro" em um ano não eleitoral como o atual, em debates sobre a formulação de políticas públicas.
Na eleição de 2018, o Agora! lançou candidatos por diferentes partidos, estratégia que pode repetir em 2022. "A gente falava em renovação qualitativa, seja por movimentos da sociedade ou seja pela criação de uma agenda, e isso não se faz de um dia para o outro. A renovação na política não é apenas a troca de nomes, é um 'novo software'. E tem exemplos muito bons de gente fazendo um bom trabalho", diz.
E mesmo que as eleições municipais de 2020 tenham indicado uma tendência de vitória de políticos tradicionais, a expectativa de renovação permanece, na avaliação de Pedro Montes, do Acredito. "Nós acreditamos que as pessoas ainda querem isso. Esse sentimento de renovação começou em 2013. De lá para cá muita coisa mudou. Mas há a expectativa [de renovação]", disse.
Tanto o Agora! quanto o Acredito defendem, oficialmente, o afastamento do presidente Jair Bolsonaro. Os dois grupos publicaram em seus sites oficiais textos em que se posicionam a favor do impeachment do chefe do Executivo, mencionando falhas no combate à pandemia de coronavírus e outros fatores.
"Isso está muito consensual entre nós. Cada um se expressa de uma forma, mas estamos bem confortáveis em relação a esse tema", diz Humberto Laudares, do Agora!.
Pedro Montes, do Acredito, participou recentemente de carreatas de protesto contra o presidente. Mas disse ser precipitado dizer que o "fora Bolsonaro" será um discurso padrão entre os membros do movimento em 2022. "Mas é bem pouco provável que a gente atraia apoiadores do presidente", diz ele.
Agora! diz que será natural apoiar Huck se ele for candidato
A participação do apresentador Luciano Huck nos movimentos de renovação e a citação de seu nome como possível candidato a presidente em 2022 cria o questionamento sobre se ele seria um candidato "oficial" desses grupos, caso efetivamente lance seu nome. Atualmente, os grupos de renovação evitam a vinculação a algum candidato ou partido.
"Huck é um membro do Agora! e seria natural, se ele realmente se candidatar, que a gente participe, que a gente tente ajudar. A tendência seria de apoiá-lo. Mas essa é uma questão que ainda depende de muitos fatores", diz Humberto Laudares.