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A decisão do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), de determinar um mutirão de sabatinas colocou o presidente da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) da Casa, Davi Alcolumbre (DEM-AP), sob pressão para destravar a nomeação de André Mendonça ao Supremo Tribunal Federal (STF). Pacheco anunciou que o Senado fará sabatinas com indicados a diferentes cargos entre os dias 30 de novembro e 2 de dezembro e disse, em entrevista coletiva na quinta-feira (4), ter a confiança que a apreciação do nome de Mendonça estará entre as atividades desempenhadas.
Na entrevista, o presidente do Senado descartou enfatizar a sabatina de Mendonça como uma prioridade. Tratou o caso como um entre tantos que aguardam apreciação dos senadores, e disse esperar que “todos os presidentes de comissão” analisem os nomes sob seus cuidados, “inclusive para a Suprema Corte”. E ressaltou que espera ver o processo sendo conduzido pelo presidente da CCJ. Pacheco apontou que Alcolumbre, assim como os demais presidentes de comissão, está ciente da importância do esforço concentrado.
Mendonça foi escolhido por Bolsonaro para o cargo de ministro do STF em junho. Os nomes indicados à Corte precisam ser aprovados pelo Senado. O rito habitual de aprovação prevê, em ordem, as seguintes etapas: realização de uma sabatina com o nomeado na CCJ; votação do nome pela CCJ; por fim, apreciação do nome pelo plenário do Senado, independentemente do resultado registrado na CCJ.
Geralmente, a tramitação no Senado não costuma ser um processo arrastado, ao menos não aos olhos do público geral. Mas o caso atual encontra resistência por parte de Alcolumbre que, na condição de presidente da CCJ, tem a liberdade de agendar para quando quiser a sabatina — ou mesmo para não agendar.
Denúncia de “rachadinha” enfraquece Alcolumbre?
Ao longo dos meses de distância entre a escolha de Mendonça e os dias atuais, Alcolumbre deu diversas justificativas para não realizar a sabatina. Alegou que o indicado não seria aprovado pelo plenário do Senado e, assim, dava a Bolsonaro a chance de apresentar outro nome. Afirmou também que precisava aguardar a conclusão de uma ação movida pelos senadores Alessandro Vieira (Cidadania-SE) e Jorge Kajuru (Podemos-GO), que pediram que o STF interviesse no processo.
Mas recentemente outro elemento entrou em cena e afetou ainda mais o contexto. Alcolumbre passou a ser acusado de liderar um esquema de “rachadinhas” em seu gabinete. A informação veio a público após reportagem da revista Veja, divulgada no último dia 29. Segundo a publicação, mulheres da periferia de Brasília foram contratadas como funcionárias do gabinete do senador do Amapá e não chegaram a trabalhar, efetivamente, em nenhuma ocasião. Além disso, elas tinham a quase totalidade de seus salários “confiscados”.
Alcolumbre negou conhecimento do episódio, disse que contratações eram definidas pelo seu chefe de gabinete, que não está mais em sua equipe, e disse que a acusação fazia parte de uma “uma orquestração por uma questão política e institucional da CCJ e do Senado Federal”.
O episódio intensificou a pressão contra Alcolumbre. O Podemos, partido que tem a terceira maior bancada do Senado, divulgou nota pedindo o afastamento do parlamentar do comando da CCJ. À Gazeta do Povo, o senador Lasier Martins (Podemos-RS) afirmou que Alcolumbre “não tem mais moral” para presidir a CCJ. “Uma Comissão de Constituição e Justiça existe para saber se os projetos podem seguir adiante ou se infringem a norma jurídica. Mas ele próprio [Alcolumbre] infringe as normas jurídicas”, ressaltou.
Na avaliação de Lasier, o caso das “rachadinhas” fez com que a contestação em torno do impasse na nomeação de Mendonça chegasse a senadores que, até então, não haviam se envolvido no assunto. “Aquilo que era uma indignação de quatro ou cinco hoje chegou a muito mais gente”, acrescentou.
Pacheco, na entrevista coletiva desta quinta, evitou abordar as denúncias contra Alcolumbre. Ele foi perguntado se o presidente da CCJ estava enfraquecido e respondeu dizendo que gostaria de expressar confiança no nome do senador do Amapá.
O presidente do Senado disse ainda que não via a possibilidade de a sabatina não ser pautada durante o esforço concentrado e também que não especularia sobre uma eventual votação do nome de Mendonça diretamente pelo plenário da Casa. A ideia foi aventada como uma alternativa para superar a blindagem de Alcolumbre. “Nós temos que trabalhar com a hipótese real de que as comissões vão realizar o seu trabalho”, acrescentou.
Para Lasier Martins, o empenho de Pacheco em torno do processo se explica também pelo fato de que a continuidade do impasse poderá respingar de modo negativo na imagem do presidente do Senado.
Oposição e governo querem fim de impasse sobre sabatina de Mendonça
A falta de continuidade no processo de indicação de Mendonça deixa o STF desfalcado e também aponta uma fraqueza de Bolsonaro no contexto político, já que mostra a incapacidade dos parlamentares governistas de reverterem a decisão individual de um senador. Soma-se a isso o fato de Mendonça ser evangélico, e a inserção de um representante religioso na Suprema Corte foi uma promessa repetida diversas vezes por Bolsonaro a este segmento, que compõe base importante do seu eleitorado.
Mas o desejo em ver a situação se encerrando não se resume à base aliada do governo. Senadores adversários de Bolsonaro se posicionaram, em diferentes ocasiões, em defesa da tramitação da indicação. Alessandro Vieira (Cidadania-SE) e Simone Tebet (MDB-MS), por exemplo, que se notabilizaram como adversários do governo Bolsonaro durante a CPI da Covid, cobraram publicamente o avanço do processo. Ambos enfatizaram que não falavam em defesa do nome de Mendonça, e sim contra o “engavetamento”.
O senador Paulo Paim (PT-RS) também disse esperar a conclusão do processo, e mostrou otimismo em relação ao esforço concentrado agendado por Pacheco. “Acho que é um assunto quase que superado. Chegou o momento em que o presidente do Senado marcou as reuniões das comissões plenárias e a hora de deliberar todos os nomes em espera”, disse. O parlamentar acrescentou que o PT se reuniu com Mendonça — que tem buscado encontro com todos os senadores — e não tomou uma posição em torno da indicação.
O último nome para o STF a ser apreciado pelo Senado foi o de Kássio Nunes Marques, indicado por Bolsonaro em outubro do ano passado e aprovado pelos senadores no mesmo mês. Nunes Marques foi o primeiro integrante da Suprema Corte a ser escolhido por Bolsonaro.