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O ex-ministro da Saúde Nelson Teich, em depoimento à CPI da Covid do Senado, afirmou que deixou o governo de Jair Bolsonaro por conta do desejo do presidente de massificar o uso de cloroquina como tratamento para a Covid-19. Teich declarou que optou por pedir demissão quando percebeu que não teria autonomia para conduzir o Ministério da Saúde de acordo com suas convicções. Ele foi o titular da pasta por 29 dias, entre abril e maio do ano passado, e falou que o momento decisivo para pedir a exoneração foi uma sequência de falas de Bolsonaro sobre uma necessidade de sintonia entre ministro e presidente e o reforço da cloroquina na rede de saúde.
O ministro iniciou seu depoimento na manhã desta quarta-feira (5) e permanece falando aos senadores. Teich é o segundo ex-ministro de Bolsonaro a falar à CPI da Covid: na terça (4), quem depôs foi Luiz Henrique Mandetta. Eduardo Pazuello tinha seu depoimento agendado para esta quarta, mas ele pediu para modificar a data da fala por alegar ter estado em contato com pessoas que testaram positivo para Covid-19. Pazuello deve falar à comissão no dia 19.
A reunião da CPI da Covid com Teich foi marcada por uma discussão entre os senadores que levou à interrupção dos trabalhos por cerca de 10 minutos. O embate teve início após o presidente do colegiado, Omar Aziz (PSD-AM), conceder a palavra à senadora Eliziane Gama (Cidadania-MA). O senador Ciro Nogueira (PP-PI), aliado do governo Bolsonaro, protestou, sob a alegação de que Gama não é titular da comissão e, portanto, não poderia falar antes dos membros titulares.
Gama, Aziz e outros senadores afirmaram que havia sido estabelecido um acordo entre os parlamentares para garantir a palavra a senadoras, pelo fato de nenhuma mulher ser titular e nem suplente da comissão. Nogueira e outro senador governista, Marcos Rogério (DEM-RO), disseram não ter sido consultados sobre o acordo e afirmaram que a medida visava dar mais espaço a opositores ao governo Bolsonaro. Após a discussão, a sessão foi retomada e a palavra foi cedida a Eliziane Gama.
Pressão por cloroquina, mas sem "assessoria paralela"
Teich destacou que a questão da cloroquina foi um tema constante durante sua passagem pelo Ministério da Saúde. Ele disse que não autorizou a produção e nem a distribuição do medicamento no âmbito da pasta que coordenava, mas que não tem como dizer se isso ocorria em outras instâncias de governo. "Se tivesse sabido, eu não deixaria fazer", declarou.
O ex-ministro não endossou a ideia de "assessoria paralela", exposta no dia anterior pelo também ex-ministro Luiz Henrique Mandetta - o primeiro titular da Saúde do governo Bolsonaro citou que o presidente era municiado de informações por pessoas que não integravam a estrutura formal do governo, mas que acabavam influenciando nas tomadas de decisão. Teich também disse não se lembrar da presença de filhos do presidente em reuniões ministeriais. Mandetta declarou ter encontrado com o vereador Carlos e o deputado Eduardo em reuniões no Palácio do Planalto.
Teich disse também que a presença de Eduardo Pazuello como secretário-executivo do Ministério durante sua gestão não foi uma imposição de Bolsonaro. "Se fosse, eu teria saído com uma semana", afirmou. Pazuello foi o número dois da Saúde durante a breve gestão de Teich e depois assumiu o comando da pasta. Teich colocou, entretanto, que Pazuello carecia de mais informações sobre gestão de saúde para desempenhar um melhor trabalho.
"Saúde e economia são uma coisa só"
O ex-ministro disse também ser favorável a medidas como o distanciamento social e o uso de máscaras. Segundo ele, o impedimento da transmissão é uma postura essencial no caso de pandemias virais, como a de coronavírus. "O sistema de saúde não foi feito para trabalhar com ociosidade", declarou, em referência ao que chamou de "ferramenta de redução de danos" e necessidade de diminuição de internações. Tanto uso de máscaras quanto o distanciamento são propostas contestadas pelo presidente Bolsonaro.
Teich falou ainda sobre a economia. Segundo ele, a postura que adotou sobre o assunto durante sua passagem pelo Ministério foi a de trabalhar saúde e economia como uma coisa só, não como elementos conflitantes.
Já em relação a vacinas, o ex-ministro disse que durante sua gestão não havia discussões sobre efeitos adversos, como foi colocado pelo presidente Bolsonaro como empecilho para travar a compra dos imunizantes.