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Além de provocar um racha na direção do Patriota, a chegada do presidente Jair Bolsonaro na sigla para disputar a reeleição em 2022 deve provocar uma debandada de filiados. Integrantes do Movimento Brasil Livre (MBL), grupo de direita que rompeu com Bolsonaro, já afirmam que pretendem deixar a legenda caso a filiação do chefe do Palácio do Planalto e de seus aliados se confirme.
Com o controle do diretório estadual de São Paulo desde 2019, o MBL vinha se articulando para lançar candidaturas de integrantes pela legenda no ano que vem. Uma das estratégias do grupo era ampliar o número de deputados federais na Câmara e de deputados estaduais pelo país. Nessa articulação, o deputado estadual Arthur do Val, conhecido como “Mamãe Falei”, pretendia se lançar na disputa pelo governo de São Paulo.
Entretanto, a movimentação do presidente do Patriota, Adilson Barroso, para levar o presidente Bolsonaro e seu grupo político para a sigla não agradou a cúpula do MBL. Ao jornal O Globo, Arthur do Val confirmou a intenção dos integrantes do movimento de deixarem a legenda. Filho do presidente, o senador Flávio Bolsonaro (RJ) se filiou ao Patriota e passou a negociar a vinda do seu grupo.
“A gente vê com muita tristeza [a chegada de Flávio]. Em nenhum momento a gente vai conciliar com eles. Isso não existe. Eu prefiro sair da política do que compor com esses caras. Não existe nenhuma possibilidade, zero”, afirmou Arthur do Val.
MBL apoiou Bolsonaro em 2018
Apesar de ser oposição agora, o MBL apoiou formalmente a candidatura de Jair Bolsonaro na eleição de segundo turno em 2018. Mas a relação do grupo com os bolsonaristas acabou derretendo ainda nos primeiros meses do governo.
Integrante do MBL, porém filiado ao DEM, o deputado federal Kim Kataguiri (SP) costuma afirmar que o presidente Bolsonaro cometeu “estelionato eleitoral”. Na mesma linha, Arthur do Val já chegou a afirmar que o governo Bolsonaro é "tão grave" quanto o de Lula.
Em maio, Val acabou expulso de uma manifestação por aliados do presidente Bolsonaro na Avenida Paulista, em São Paulo. No ato em apoio ao governo, o líder do MBL abordou os manifestantes que passavam pelo local e fez críticas à família Bolsonaro.
“Alguém, aqui, tem político de estimação?", gritou Arthur do Val. "Claro que não", respondeu uma mulher não identificada. "Então fora, Flávio 'rachadinha'", rebateu ele, referindo-se à suspeita de rachadinha envolvendo o filho do presidente. "Fora você, seu idiota", retrucou a mulher. Na sequência, o deputado estadual acabou expulso do ato pelos manifestantes sob gritos de "vaza" e "lixo", e com "tapas e empurrões".
Agora, os integrantes do MBL aguardam a confirmação da filiação de Bolsonaro ao Patriota para definirem o futuro. Parte da Executiva do partido entrou na Justiça para questionar o novo estatuto aprovado pelo presidente da sigla em uma convenção a toque de caixa. Liderados pelo vice-presidente do Patriota, Ovasco Resende, os opositores acusam Adilson Barroso de dar um "golpe" para entregar o comando da legenda aos Bolsonaro.
Uma ação chegou a ser protocolada no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), mas o ministro Edson Fachin rejeitou o caso, argumentando que não cabia à Justiça Eleitoral o julgamento e que o pedido deveria ser encaminhado para a Justiça comum.
Movimento Livres deixou o PSL após chegada de Bolsonaro
Caso seja confirmada, a saída de integrantes do Patriota não será a primeira debandada provocada pela filiação de Bolsonaro a uma legenda. Em 2018, integrantes do Movimento Livres deixaram o PSL por ocasião da chegada do então candidato à Presidência e de seus aliados.
Na época, o grupo liberal controlava 12 diretórios estaduais, o conselho de ética, a fundação partidária e preparava um novo modelo de governança, estatuto, entre outras ações. Em artigo publicado no site Congresso em Foco, o então presidente do Livres, Paulo Gontijo, afirmou que o “projeto Bolsonaro” ia contra tudo o que o grupo defendia dentro do PSL, na economia, nos costumes e na gestão partidária.
Atualmente, o Livres possui 23 pessoas com mandatos de senador, deputado federal, deputado estadual e vereador. A maioria dos mandatários do movimento está filiada a legendas como Novo, Cidadania e PSDB.
Segundo Mano Ferreira, cofundador do Livres, a saída do PSL acabou transformando o movimento em suprapartidário. Para ele, a situação que ocorreu com o Livres e que agora tende a se repetir com o MBL se dá pelo fato de as legendas no Brasil serem controladas por “coronéis” que atuam como donos dos partidos.
“Isso inviabiliza qualquer estrutura de governança dentro das legendas. O partido vira um cartório que tem o monopólio de um coronel ou cacique dono do partido. É um sistema que perpetua as pessoas no poder”, argumenta.