O mais novo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Flávio Dino, lidará até abril com uma questão de grande relevância para o governo de Luís Inácio Lula da Silva (PT): a revisão das restrições legais relacionadas à presença de políticos no comando de empresas públicas. Em dezembro, o Palácio do Planalto conseguiu levar adiante a estratégia para adiar por 90 dias o julgamento da ação do PCdoB no STF, que questiona dispositivos da Lei das Estatais, de modo a aguardar pela chegada de Dino. Isso foi possível graças ao pedido de vista feito por Kassio Nunes Marques.
A expectativa de uma decisão favorável de Dino nessa questão beneficia diretamente Lula ao possibilitar a nomeação de aliados em posições-chave na administração pública, além de acomodar indicações partidárias realizadas em troca de apoio no Congresso. Em março de 2023, o então ministro Ricardo Lewandowski, sucessor de Dino na pasta da Justiça, concedeu uma decisão liminar que revogou a quarentena obrigatória de três anos para dirigentes partidários e pessoas envolvidas no comando de campanhas eleitorais assumirem cargos em estatais.
A decisão, com efeito imediato, possibilitou que o presidente do BNDES, Aloizio Mercadante, assumisse definitivamente o cargo. Além dele, outros políticos indicados por Lula ocuparam posições de destaque, como a presidência do Banco do Nordeste, para a qual foi nomeado o ex-governador de Pernambuco, Paulo Câmara (PSB).
Mudança na Lei das Estatais abre porteira para indicados políticos
O cálculo do governo de que Dino garantiria os seis votos de maioria no caso foi indicado por Weverton Rocha (PDT-MA), relator no Senado da indicação do ministro. Na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), o senador afirmou explicitamente que o futuro magistrado do STF representaria a “reparação” à “criminalização” da política contida na Lei das Estatais. “Dino é político. E se hoje tem muita crise, é porque justamente sempre deixamos políticos em segundo plano”, disse Rocha.
Criada durante o governo Michel Temer (MDB) para blindar a Petrobras de ingerências políticas, recuperar a sua credibilidade perante os mercados de capitais e evitar a repetição de escândalos bilionários de corrupção, a Lei das Estatais foi um dos primeiros alvos dos ataques de Lula em seu terceiro mandato.
Ex-governador, ex-ministro da Justiça e ex-senador, Dino, 55 anos, assumiu na semana passada o papel de juiz STF como novo capítulo em sua biografia, que pode se estender por duas décadas, quando atingir idade da aposentadoria compulsória. Em seu voto de estreia na Corte, nesta segunda-feira (26), ele apoiou a repercussão geral da decisão sobre o Uber no processo que discute se há vínculo trabalhista entre motoristas de aplicativo e as plataformas do serviço.
Com Dino, STF inicia fase de estabilidade na sua composição
O décimo nomeado pelo presidente Lula para a mais alta Corte do país ao longo de três mandatos representa também o começo de uma fase de rara estabilidade na composição do STF, pelos próximos quatro anos, salvo ocorram eventos excepcionais. A próxima vaga no Supremo só deverá ser aberta em abril de 2028, com a aposentadoria de Luiz Fux, quando atingir a idade de 75 anos. Nos últimos anos, Gilmar Mendes e Dias Toffoli foram os principais interlocutores da Corte com o mundo político. Lula passou a ter, a partir deste ano, dois ministros mais próximos: Dino e seu ex-advogado, Cristiano Zanin, que foi dua primeira indicação no atual mandato.
Essa nova fase para Dino e o STF também consolida a maioria de ministros indicados pelo PT, com sete dos atuais 11 ocupantes. Em adição, Gilmar Mendes, conduzido por Fernando Henrique Cardoso (PSDB), e Alexandre de Morais, encaminhado por Temer (MDB), têm decidido favoravelmente ao governo. O perfil dos juízes sinaliza período de calmaria para o governo e alinhamento ideológico na mais alta instância judicial do país.
Em outubro de 2023, antes de formalizar a indicação de Dino, Lula declarou que escolheria para o então ministro da Justiça o destino no qual ele fosse “mais útil”. O escolhido, por sua vez, enfatizou compromisso de não usar a toga para ganhar popularidade em eventual retorno à política. No discurso de sua posse, Dino fez, contudo, uma afirmação polêmica: a de que o Supremo tem “grande papel de controle sobre os outros poderes”. Para o advogado Rafael de Freitas Valle Dresch, professor de Direito da UFRGS, a harmonização na República passa, necessariamente, pelo controle entre os poderes, sem que nenhum deles se sobreponha aos demais.
Com isso, o tom parcial da fala de Dino sugere, segundo o professor, um poder maior e excepcional para os ministros da Corte, quando Legislativo e Executivo deveriam também exercer controle sobre o Judiciário. “Atualmente, quando temos um Supremo superpoderoso, a declaração do ministro reforça a impressão de controle extremo. Não se pode haver harmonização dos poderes quando um se sobreponha aos demais”, disse.
Dino deixa no Senado cinco projetos voltados à segurança
Eleito em 2022 para o Senado pelo PSB do Maranhão, com 2,12 milhões de votos, Flávio Dino apresentou sete projetos de lei no seu breve mandato de 20 dias no Senado, antes de tomar posse como ministro do STF. Ele deverá cobrar apoio de líderes do governo no Congresso para esses projetos e pedir aos aliados que atuem por sua tramitação. O primeiro (PL 14/2024) proíbe a instalação de acampamentos próximos a quartéis ou áreas militares, numa clara reação às manifestações de protesto contra Lula em 2023. Ele é autor da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 3/2024, que tira o direito à aposentadoria compulsória de juízes, promotores e militares condenados por delitos graves. A PEC alcançaria oficiais que estão agora sendo julgados pelo Supremo.
Dino apresentou ainda o projeto de lei 285/2024, que torna obrigatório o uso de câmeras nos uniformes de policiais; outro que define critérios para o juiz decidir sobre a periculosidade de pessoas submetidas à prisão preventiva (PL 226/2024) e ainda um que dispõe sobre formas de reconhecimento e premiação de policiais que realizam um “bom trabalho” (PL 16/2024). Por fim, o ex-ministro da Justiça protocolou um projeto para incentivar as bibliotecas públicas (PL 286/2024) e outro para avaliar a qualidade da assistência à saúde prestada pela Iniciativa Privada (PL 287/2024).
Em seu discurso de despedida do Senado, na última terça-feira (20), Dino prometeu que vai atuar no STF com “imparcialidade, coerência e isenção”. “Esperem de mim fiel cumprimento à Constituição e à lei. Nunca esperem de mim não cumprir meus deveres legais. Um bom juiz fala muito pouco e ouve muito”, prometeu.
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