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De olho em 2026

O que Bolsonaro e a direita podem aprender com a vitória de Trump nos EUA

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Especialistas reforçam ações de Trump que podem servir a Bolsonaro. (Foto: Alan Santos/Presidência da República/Arquivo)

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A vitória avassaladora de Donald Trump na disputa pela presidência dos Estados Unidos trouxe fôlego ao ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) em uma possível disputa presidencial em 2026, apesar de ele ainda estar inelegível. Mesmo com a volatilidade do cenário e dois anos políticos pela frente, fatores conjunturais que ajudaram Trump podem servir como lição ou orientar Bolsonaro e para a direita como um todo na jornada eleitoral desde já.

A Gazeta do Povo ouviu analistas políticos que elencaram fatores que levaram Trump à vitória e podem ser úteis para a direita brasileira se forem implementados até 2026. Entre eles estão a unidade em torno de um candidato, o uso da máquina partidária para fazer campanha e formar um governo, a atenção com os reais anseios do povo ao invés de buscar uma política identitária e entender a tendência de continuidade dos altos níveis de polarização política.

Veja abaixo os principais pontos que podem influenciar as próximas eleições no Brasil:

Manter a firmeza na escolha do candidato da direita

Um dos fatos que viabilizaram Trump é a opção do Partido Republicano de manter firmeza na escolha do candidato da direita até o fim, evitando dispersão de apoio. Trump foi alvo de impeachment e vários processos judiciais que poderiam ter inviabilizado sua candidatura. Mesmo assim seu nome foi mantido como a aposta do Partido Republicano e a resposta das urnas foi inquestionável. O Partido Democrata substituiu o presidente Joe Biden na reta final da campanha pela vice Kamala Harris ao perceber que ele poderia perder para Trump.

No Brasil, a situação jurídica de Bolsonaro é ainda mais hostil que o cenário enfrentado por Trump. Alas da direita vêm cogitando nomes como os dos governadores Tarcísio de Freiras (Republicanos-SP), Ronaldo Caiado (União-GO) e até mesmo do candidato derrotado à prefetura de São Paulo, Pablo Marçal (PRTB-SP). Já Bolsonaro vem articulando a reversão de sua inelegibilidade por meio de uma eventual decisão do Congresso e diz que a direita sem ele é "utopia".

“Há uma tendência de divisão da direita brasileira, o nome dele [Bolsonaro] é o mais forte, na última eleição ele perdeu por uma margem pequena e, em uma eventual disputa, ele chega muito mais fortalecido pela estrutura partidária, como ocorreu nos EUA, isso ajuda muito”, afirmou o advogado Manuel Furriela, especialista em Direito Internacional.

Se aproveitar de uma máquina partidária robusta sem perder a espontaneidade

Se Bolsonaro realmente conseguir ser a aposta da direita para 2026, pode se beneficiar de outro fator que ajudou Trump: uma estrutura partidária robusta. Tanto Trump, quando se elegeu pela primeira vez em 2016, quanto Bolsonaro, em 2018, tinham em comum o discurso carismático e o discurso antissistema. Mas nenhum dos dois tinha uma máquina partidária forte a seu favor e acabaram formando governos um pouco no "improviso", segundo analistas políticos.

Quando concorreram à reeleição, ambos já tinham estruturas políticas mais sólidas, mas acabaram atrapalhados por fatores excepcionais, sendo o principal deles a pandemia de Covid. Segundo o cientista político Gustavo Alves, Trump e Bolsonaro tiveram a reeleição prejudicada em parte por críticas da opinião pública e de uma imprensa hostil sobre a condução da pandemia.

Ao concorrer novamente neste ano, Trump encontrou uma um cenário mais favorável, com um eleitor americano preocupado com a forma como o Partido Democrata vem conduzindo a economia.

“Trump mudou, profissionalizou a forma de direcionar a disputa e voltou ao poder, Bolsonaro pode analisar de forma crítica [o que pode aprender com o republicano]”, afirma.

Na visão dele, Trump saiu vitorioso ao adotar práticas diferentes neste pleito. “Ele ouviu marqueteiros, foi mais comedido em determinadas regiões do país, mas não perdeu sua essência, o que agradou aos eleitores. Conseguiu tirar proveito até de algo que discordava: as votações antecipadas pelos correios”, afirmou.

Trump chegou a defender que os eleitores deveriam ir todos em um único dia às urnas, mas acabou convencido pelos marqueteiros do partido e neste ano disse aos americanos que não precisavam esperar para fazer diferente para escolher o próximo presidente. “Foi uma mudança de discurso, sem perder quem realmente é. Deu certo e precisa ser analisado por Bolsonaro”, avalia Alves. Ele cita como exemplo as falas sobre as urnas eletrônicas no Brasil.

Para o advogado Furriela, especialista em Direito Internacional, a da máquina partidária fortalecida em prol do norte-americano pode ser exemplo no Brasil. Ele lembra que em 2018 Bolsonaro se candidatou em um partido pequeno, sem estrutura. Sua campanha foi baseada em mídias sociais alimentadas por seu filho, Carlos Bolsonaro. “Desta vez, seria pelo PL que é um dos maiores partidos do país. A estrutura partidária favoreceu ao Trump e vai favorecer Bolsonaro, se for candidato, diante do que o PL representa hoje à política”.

O comentarista político Leandro Gabiati, da consultoria Dominium, avalia que cada eleição presidencial se dá em um momento específico e na disputa de 2016, a fórmula usada por Trump funcionou, levando-o à presidência. “Ele repete a fórmula em 2020 e fracassa. De forma inteligente, ele entendeu que [agora] o cenário era outro e que essa campanha não poderia ser mais improvisada, dando espaço a um processo mais profissionalizado. Bolsonaro deve analisar isso”, avalia.

“Trump chegou mais fortalecido partidariamente e foi muito inteligente em mudar diante das necessidades, até porque em uma eleição equilibrada isso faz diferença, pois precisa conquistar eleitores que estão fora de sua bolha. Foi preciso ajustar ou ponderar a mensagem, isso deve ser considerado por Bolsonaro”, completa.

Ressaltar as falhas do governo atual e se colocar como alternativa

Tanto Trump como Bolsonaro sofreram muitas críticas da esquerda pela forma como conduziram a pandemia de Covid e como se posicionaram em relação aos protestos populares que se seguiram às suas derrotas eleitorais (em 2021 nos EUA e em 2023 no Brasil). Mas agora, ao menos para Trump, parte da estratégia foi criticar como o governo democrata conduziu os desafios atuais.

No governo de Joe Biden, iniciado em 2021, o principal impacto sentido pelos norte-americanos - e que pesou muito nas eleições deste ano - foi o aumento da inflação e a perda do poder de compra acentuado pelos efeitos da pandemia de covid-19.

Manuel Furriela cita o desempenho de Trump na chamada "região da ferrugem", que enfrentou forte desindustrialização nos anos pós-pandemia e votou em massa no republicano na expectativa de mudança. “Outra lição que pode ser aproveitada por Bolsonaro é que pautas locais como essa podem ser usadas aqui, funcionou bem para o Trump”, completa.

Leandro Gabiati afirma que os efeitos da pandemia e o que ela provocou a governos que tentaram e não se reelegeram pelo mundo precisam ser avaliadas de forma crítica, na expectativa de situações similares não se repetirem e que soluções possam ser apresentadas a partir delas. “A pandemia custou em diversos locais do mundo a não reeleição de governantes entre eles Bolsonaro e Trump. Trump reverteu isso agora”.

Assim, há uma oportunidade para que Bolsonaro ou o candidato que representar a direita de explorar desafios do Brasil atual, como o déficit das contas públicas, os aumentos de impostos a sensação da população de perda de poder aquisitivo.

“É preciso analisar como está a expectativa ou como está o ânimo do eleitor brasileiro em relação ao atual governo sobre economia. O poder de compra se mantém ou diminuiu? Nos Estados Unidos foi o que fez Trump, esse tipo de questão logicamente vai pesar em 2026”, diz Leandro Gabiati.

Polarização ainda pesa na cena política, mas é preciso conquistar o centro

Na opinião de Manuel Furriela, a polarização política perdeu força no Brasil, mas ela não se desfaz em pouco tempo e nem deve deixar de existir. “No Brasil, a oposição que se tinha era a da esquerda com a centro-direita do PSDB. Não era uma visão conservadora, tinham divergências sobre privatizações, mas as questões sociais eram parecidas. Nos EUA, sempre houve a polarização entre republicanos e democratas. Quando o Bolsonaro surgiu [à cena política nacional] foi uma grande novidade, revelando um novo tipo de eleitor conservador, agora isso está um pouco mais reduzido”.

Para o especialista, Bolsonaro tem votos para ser um candidato forte, mas só isso não vai garantir a vitória, o que exigiria dele um diálogo com o centro, como fez Trump nos EUA. “Isso passa pela adequação do discurso”.

A vitória de Trump cria um combustível para os líderes da direita pelo mundo diante de uma militância conservadora. Gabiati lembra que o trabalho de uma comunicação mais elaborada teve resultado para Trump e deve ser avaliada por Bolsonaro. Ele lembra que a capilaridade partidária precisa de uma estrutura partidária com recursos de campanha, o que Trump sempre teve e Bolsonaro terá em uma eventual disputa em 2026.

“A gente imagina que o Bolsonaro aprimore o profissionalismo de sua campanha, obviamente sem perder a essência que ele tem, cuidando de alguns detalhes e também ciente de que tem que ponderar mensagens para atingir um eleitorado que hoje talvez esteja fora do seu campo de votação polarizada”. Para o comentarista, isso passa pela dosagem do discurso, a exemplo do que fez Trump.

Aproveitar a inaptidão da esquerda para entender os anseios da população

A candidata americana democrata Kamala Harris enfocou muito sua campanha em pautas identitárias e na questão do aborto. Embora o governo Biden tenha mantido a taxa de desemprego baixa (4% neste ano) e a economia tenha crescido, Kamala não conseguiu emplacar a imagem de boa administradora.

O Partido Democrata permaneceu muito focado em um discurso classista e trabalhista, sem entender os anseios de grande parte da população por menos controle e liberdade para o empreendedorismo. Segundo Gabiati, a esquerda tem um DNA classista tanto nos EUA quanto no Brasil, o que dificulta a compreensão das mudanças de visão de mundo da sociedade. A direita no Brasil pode se aproveitar dessa incapacidade estrutural do governo de incorporar esse tipo de necessidade da população na campanha eleitoral.

Para o advogado Alexandre Pires, especialista em Direito Internacional e comentarista político, Bolsonaro ou o candidato da direita deve ter uma estratégia de campanha clara, um discurso coerente, sem improvisos, mas também sem abrir mão da ideologia e dos costumes. "Precisa ter um discurso com componente ideológico que ofereça diferenciação das alternativas à esquerda e mesmo do centro, mas que tenha uma consistência e concretude com um recado mais claro, como fez e vinha fazendo Trump”, disse.

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